Cidadania se aprende na escola

Projeto em escolas municipais do Recife vem mudando hábitos de crianças e pré-adolescentes

dom, 04/09/2011 - 12:20
Chico Peixoto/LeiaJá Imagens Proposta vem dando tão certo que a mudança de comportamento dos filhos já é percebida dentro de casa Chico Peixoto/LeiaJá Imagens

“Oi, bom dia!”, diz uma garota de aproximadamente seis anos de idade após a equipe de reportagem do LeiaJá visitar, no último final de semana, a escola Municipal Cecília Meireles, no bairro da Macaxeira, Zona Norte do Recife. A cada passo andando pelas instalações da escola, o gesto fraternal é bem comum e sai em meio a um sorriso estampado na face de algumas daquelas mais de duas mil crianças existentes naquele espaço de ensino. Mas, afinal, o que tem de anormal naquele gesto incomum para crianças com tão pouca idade, oriundas de escola pública?

Talvez a explicação para o comportamento educado esteja na filosofia construtivista e interacionista que a escola vem desenvolvendo há mais de quatro anos, dentro do Projeto Ação Saudável. Pelas duas propostas, atos como o de desejar um simples “bom dia” se juntam a outros de consciência ambiental e de sustentabilidade que a escola propaga para a criança, chamando, com isso, a atenção não só dos pais, mas também de outras unidades de ensino que pretendem propagar a mesma filosofia pelos próximos anos em seus estabelecimentos.

Pelos métodos construtivista e interacionista, os alunos aprendem não só as disciplinas obrigatórias – português, matemática, história, geografia –, como também a cuidar do meio ambiente, através dos vários projetos de sustentabilidade desenvolvidos na escola. Lá, os trabalhos de conscientização começam logo na porta de entrada, do lado direito. Nesse espaço, as crianças descobrem como reaproveitar “lixo” (reciclar), além de serem convidadas ao debate sobre literatura infantil em rodas de diálogos. Já mais para dentro do estabelecimento, na horta, as crianças aprendem a plantar, regar, colher. O momento mágico da “brincadeira” é bem depois, quando a cozinha da escola se transforma numa sala de aula com divertidas musiquinhas de aprendizagem sobre a importância dos frutos e legumes para a saúde.

“Eu gosto muito, pois estou aprendendo muitas coisas”, disse, enquanto levava os legumes para a cozinha após colher, o garoto Daniel da Silva, 10 anos, estudante do projeto Se liga, que reúne crianças fora de faixa etária no ensino. “Eu gosto muito de cuidar para comer depois, e ficar forte”, acrescentou o pequeno Emerson Kauan da Silva, de apenas seis anos, enquanto ouvia atentamente os ensinamentos do tio, ou melhor, do técnico em agropecuária Diego Oliveira, que explicava sobre os bichinhos que incomodam as plantações. O técnico ainda enfatizava que lá, na horta da escola, não se utilizava agrotóxico para preservar a plantação.

Segundo a diretora da instituição de ensino, Cláudia Oliveira, toda essa proposta hoje desenvolvida, de escola sustentável, surgiu após algumas reflexões, há cinco anos. “Pensamos nessa ideia após analisar que a escola não tinha o verde”, destacou. Para os professores, após a implantação do novo método de aprendizagem, ficou mais fácil ensinar. “Esse tipo de trabalho facilita muito, pois podemos fazer a ponte entre as crianças e o meio. Com isso, podemos trabalhar a multidisciplinaridade”, apontou a professora Roberta Melo Bispo, há 14 anos na rede municipal de ensino. Ainda de acordo com ela, o método é mais motivador, uma vez que possibilita um retorno mais rápido do aprendizado.

Já para os pais, o trabalho inovador, desenvolvido na escola, vem dando tão certo que a mudança de comportamento dos filhos já é percebida dentro de casa. “Quando estou descascando fruta e jogo no lixo, meu filho diz ‘mãe, não jogue não, que se reaproveita’. A mesma coisa acontece com as garrafas de refrigerante que a gente usa lá em casa. Ele sempre traz para escola para utilizar nas aulas”, falou Rosangela Francisco, mãe de três crianças da unidade de ensino. “Meu filho tem um pouco de retardo mental. Antes ele não falava com ninguém. Só apontava. Agora, ele fala”, acrescentou, bastante feliz, Joana d’Arc da Luz, enquanto observava o filho, Pedro Henrique da Luz, 8 anos, regar as hortaliças da hortinha da escola.

Atualmente, além da Cecília Meirelles, outras três hortas já estão prontas e dando os primeiros frutos no Recife. São os plantios das escolas municipais Novo Pina e Alto da Guabiraba. Fora essas, mais sete unidades educacionais são contempladas com o Projeto Ação Saudável: as escolas municipais Dom Bosco, Diná de Oliveira, Casarão do Barbalho, André de Melo, Jardim Mauriceia, Balbina Menelau e Divino Espírito Santo. A meta da Prefeitura do Recife é implantar 30 hortas até o final de 2011, e 197 até agosto de 2012.

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MÉTODOS

Pelo interacionismo se entende que quanto mais ricas as interações das crianças com o meio, maior e mais sofisticado será o desenvolvimento. Quanto mais ela interage e intervêm no meio – ambiente escolar –, mais ela tende a desenvolver. (Pensamento do psicólogo russo Lev Vygotsky).

O método construtivista, por sua vez, faz com que a criança construa e desenvolva um pensamento científico a partir da própria perspectiva. Ou seja, ela passa a observar o meio e questioná-lo, desenvolvendo o espírito crítico do cientista em busca de respostas para o desconhecido. (Pesnsamento do epistemólogo suíço Jean Piaget).

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