As personagens da TV representam a realidade feminina?
Telespectadores analisam como as mulheres são exibidas nos programas de entretenimento
Representação da inocência, beleza, rodeada de fantasias sobre amor, sem perder a delicadeza. Assim as mulheres eram retratadas na maioria das produções da TV aberta até a década de 70. Com o passar do tempo, a reflexão em torno do universo feminino ganha nova cara. As mulheres do século 21 conquistam papeis imponentes, esbanjam determinação e exalam sensualidade na programação de entretenimento.
Na teledramaturgia é possível encontrar a mulher como dona de casa, profissional renomada, símbolo sexual, periguete. São muitas as faces femininas abordadas, mas a representação ainda não satisfaz o olhar crítico do telespectador.
“A exposição das mulheres na TV não é equivalente à diversidade feminina que existe na sociedade. Poucas vezes você encontra a mulher na condição de protagonista, formadora de opinião, sendo sujeito da sua própria história. Elas são apresentadas de maneira patriarcal, machista, geralmente como coadjuvante e objeto de desejo”, afirma o jornalista Ivan Moraes Filho, ressaltando que a atual apresentação do ser feminino na TV não condiz com a forma como a mulher gostaria de ser representada.
Alguns autores acreditam que a ascensão feminina está na quebra de paradigmas relacionados ao corpo. Na tentativa de construir a imagem da mulher que mais se aproxima da realidade atual, as produções acabam trazendo à tona alguns tabus. A minissérie Felizes para Sempre, por exemplo, veiculada pela TV Globo, apresentou a atriz Paola Oliveira em um papel polêmico. Interpretando Danny Bond, ela surge como uma estudante universitária, garota de programa e lésbica. Mas tal representação da mulher moderna na ficção não agradou a todos. A estudante Gleice Lira enxergou no papel da atriz a exemplificação do machismo, que vende a mulher como objeto sexual.
“Me senti ofendida. Para ser mulher não é preciso se prostituir, se vender. Precisamos ter dignidade para conseguir conquistar nosso espaço na sociedade”, opina Gleice.
Seguindo o mesmo viés, a cineasta Kátia Mesel afirma que a programação televisiva do Brasil não consegue transmitir as conquistas das mulheres ao longo dos anos, pois insiste na abordagem pejorativa. “A mulher é tratada como subcategoria. Apesar de ter galgado avanços nos meios de comunicação, ainda se negativiza muito a imagem feminina. Eu, por exemplo, me sinto distanciada dessa imagem transmitida na TV aberta”, pontua.
Com um ponto de vista distinto, a atriz Ingra Lyberato defende que a representação feminina na TV é reflexo da realidade. A artista ressalta que a mulher objeto não é fruto da imaginação do autor.
“A TV retrata muito bem o que existe na sociedade, pois a mulher objeto sempre existiu. A novidade está na abordagem da mulher independente, pois conquistamos essa liberdade há pouco tempo e ainda estamos aprendendo a lidar com elas. A mulher objeto vai continuar existindo, mas cabe a nós escolher se queremos assumir esse papel”, conclui a atriz.
Programas humorísticos são ainda mais polêmicos a respeito da abordagem feminina, pois além da exploração da sensualidade, as mulheres são tachadas como ‘burras’. O programa Pânico na TV é um dos humorísticos que utiliza esse tipo de conotação. As assistentes de palco esbanjam sensualidade em trajes minúsculos. Sobra beleza, mas a escassez de inteligência é grande. A estratégia é atrair o olhar masculino, unindo o humor ao estereótipo de que mulher bonita e ‘gostosa’ não pode ser inteligente. Machismo, homofobia, exploração da mulher como objeto são recorrentes nesse tipo de programa.
“Numa época em que o culto ao corpo tem sido valorizado, não faz sentido mostrar que só as mulheres bonitas são burras. Inteligência nunca esteve relacionada à beleza. Acho uma idiotice a banalização desses programas que exibem a mulher e o pobre como indivíduo de baixa qualidade”, crava a estudante de direito Manuela Arruda.
Em contrapartida, no jornalismo tem sido cada vez mais recorrente a presença feminina nas bancadas. Na grade da Rede Globo, elas comandam ou dividem a apresentação de todos os programas do gênero. No SBT, a paraibana Raquel Sheherazade ganhou notoriedade pela ancoragem polêmica. E na Record, a bancada do jornal matinal é exclusivamente feminina.
No entanto, Ivan Moraes ressalta que apesar das mudanças realizadas nos telejornais ao longo dos últimos anos, o espaço ocupado pelas mulheres na coordenação dos programas ainda é pequeno. “Hoje, a mulher começa a aparecer à frente das bancadas. Mas isso não quer dizer que elas tenham protagonismo na fala destes programas, pois as emissoras ainda são controladas por homens e as posições de chefias ainda são prioritariamente masculinas”.
No ponto de vista da integrante do movimento Marcha Mundial das Mulheres, Bruna Leite, o sistema capitalista é o maior influenciador da representação da imagem negativa do sexo feminino na televisão. Segundo a jovem, apenas um sistema distinto poderia ler a imagem da mulher de forma correta. “O sistema capitalista não pauta a luta das mulheres e ainda reflete a imagem delas como mercadoria. Se as bandeiras democráticas fossem refletidas na televisão aí sim estaríamos bem representadas”, pontua.
O dia Internacional da Mulher é tempo de celebrar, mas principalmente refletir a cerca do papel delas perante a sociedade. A representação do universo feminino na tela da TV aberta é passível de questionamentos. Por esse motivo, algumas mulheres soltaram o verbo a respeito do que pensam sobre a representação da mulher na TV brasileira.
Confira os depoimentos: