Tecido acrobático e a expressão do corpo no espaço urbano
Acrobacias nos ônibus, tecidos suspensos nas pontes do Recife e interações com aparelhos urbanos potencializam as diferentes formas de ocupar as cidades com arte e exercício físico
Quem passa pelas imediações da ponte do Vintém, na altura do Carrefour, Zona Norte do Recife, acha a cena inusitada e incomum. Tarde de sábado e mulheres se penduram e fazem acrobacias em tecidos coloridos, firmes e bem amarrados em uma estrutura de ferro do viaduto que liga o bairro da Torre ao de Parnamirim. Os movimentos exploram todas as partes do corpo, são livres e mudam de acordo com a performance de quem subir no tecido.
Ao lado do tecido suspenso na ponte, a uma altura de mais de cinco metros, crianças de uma comunidade próxima ao local interagem com as professoras de tecido acrobático Amanda Baptista e Jéssica Santos. Elas assistem as aulas, observam as mulheres se pendurando e também desejam subir, se enroscar e praticar a atividade física. Por ser na rua, o treino é interativo e todos são bem vindos. “Sempre que a gente coloca os tecidos na cidade ou decide se pendurar utilizando só o corpo, é natural que as pessoas ao redor tenham uma reação. Aproveitamos essa proximidade para trazer os curiosos e desmistificar possíveis dificuldades na prática”, explicou Jéssica Santos, advogada e professora de tecido acrobático.
Jéssica Santos se divide entra o trabalho como advogada e a paixão pelo tecido. Chico Peixoto/LeiaJáImagens
Ao longo dos anos, o tecido acrobático, que nasceu com a arte circense, deixou os picadeiros e ganhou salas de ensino menos convencionais para que todas as pessoas pudessem praticar a modalidade, independentemente do corpo, com dinamismo e mais liberdade nos movimentos. Amanda Baptista começou a praticar a modalidade há quatro anos e em 2017 decidiu fundar a ‘Companhia Lírica no Ar’, espaço destinado ao ensino de tecido acrobático e lira aérea.
“Os alunos são pessoas que não gostam de academia e procuram uma atividade física, outras que procuram algo lúdico e artístico para desenvolver um contato com o corpo. O tecido surge com a arte circense, mas lá tudo é muito técnico, são movimentos ensaiados e a gente faz o inverso, é uma procura pelo bem-estar, de se sentir bem com o próprio corpo. Não há um padrão, o fato de não ter elasticidade, ser mais gorda ou muito magra, não é uma barreira para fazer o tecido”, detalhou Amanda.
Mas, há três anos, Amanda e Jéssica decidiram embarcar em um novo desafio. Levar a arte do tecido acrobático para o espaço urbano e incentivar os alunos a ocuparem a cidade utilizando as instalações que ela oferece. De acordo com a professora, o espaço privado das salas e os horários são muito limitados e o contato com o diferente possibilita novos movimentos. “É uma tendência crescente interagir com os aparelhos urbanos e por isso surgiu a ideia de adaptar o nosso corpo às estruturas da cidade, além de ocupar os espaços públicos, principalmente o Centro do Recife, que apesar de abandonado é muito lindo e místico”.
Fotografias do I workshop de acrobacia urbana. (Reprodução/Instagram)
A adaptação dos tecidos às ruas de início pode assustar, seja pela falta de um colchão de apoio para amenizar a queda, a insegurança de estar na cidade, o medo de assaltos e da violência. Para as mulheres, representa principalmente a quebra de paradigmas de que não podem ocupar o espaço urbano.
Amanda, pioneira da técnica urbana em Pernambuco, conta que começou a praticar acrobacia urbana no Parque de Santana, na Zona Norte do Recife, e logo depois nas pontes da cidade, nos ônibus e quando percebeu já se pendurava em vários locais inusitados. Desejo antigo da professora, a ponte da Boa Vista, mais conhecida como Ponte de Ferro, que liga o bairro da Boa Vista ao de Santo Antônio, foi ocupada com mulheres e tecidos em um workshop realizado pela Companhia Lírica no Ar.
Amanda Baptista fundou a Companhia Lírica no Ar e aposta em um modelo menos convencional do tecido acrobático. Chico Peixoto/LeiaJáImagens
“Não existe um local exato e certo. Tem muita gente que nos chama de malucas pelas nossas intervenções artísticas ou porque já andamos com o tecido nas mochilas. Ouvimos muitas piadas, assédio, mas também elogios. Eu me sinto muito protegida pela arte porque ela é tão exuberante que nos salva pelo incomum”, ressaltou a professora Amanda.
Os interessados em participar dos workshop no espaço urbano ou praticar o tecido acrobático em locais fechados podem procurar a Companhia Lírica no Ar. As aulas são realizadas no Casarão das Artes, na Travessa Tiradentes, área central do Recife, de segunda a quinta e aos domingos. Mais informações pelo telefone (81) 9 8164-5655.
Nos próximos dias 2 e 3 de junho será relizado o II workshop de acrobacias urbana. As inscrições custam R$ 55, se forem realizadas até o dia 22 de maio e R$ 70 após esse prazo. A programação completa será divulgada no Instagram da Companhia em breve.