Artista desenha o cotidiano no metrô do Recife

Pollyanna Queiroz ganhou uma exposição no Museu do Metrô com os desenhos que faz ao longo do trajeto de ida e volta do trabalho

por Jorge Cosme qua, 12/01/2022 - 17:15
Reprodução/Instagram Reprodução/Instagram

Durante os trajetos diários entre Camaragibe e Recife pelo metrô, Pollyanna Queiroz, de 31 anos, percebia o sucateamento do sistema. Trens velhos, estações sujas e composições lotadas. "Está abandonado", ela diz. Ela critica também a falta de acessibilidade e a insegurança, mas emenda: "é um lugar que aprendi a amar."

O amor de Pollyana é colocado nas páginas de seus cadernos, os quais ela sempre carrega ao sair de casa. Neles estão desenhos de pessoas que ela encontra no cotidiano dentro do vagão.

Os sketches, como são chamadas as artes com traço de esboço, estão em exposição no Museu do Trem do Recife - Estação Central Capiba, no bairro de São José, área central da capital. Intitulada "Desenhos de Bordo - METROREC SKETCHES", a mostra ocupa uma sala dedicada a exposições temporárias no Museu do Trem, com uma instalação que remete a uma composição de metrô e uma estação, com faixa amarela e avisos de alerta.

Os desenhos são feitos desde de 2016, mas foi durante a pandemia em 2020, quando o trabalho de Pollyanna voltou ao formato presencial, que ela se dedicou ao projeto. "Veio aquele medo de pegar Covid e passar para os familiares. E a arte me acalmava", explica ela.

 

Nos desenhos estão passageiros, vendedores ambulantes, artistas. Estão Leonardo, Edson, Viviane, Ramon, Felipe, Maisa - pessoas que Pollyanna vai conhecendo e fazendo amizade ao usar o metrô todos os dias no mesmo horário.

"Eu gosto de desenhar o que vejo. O desenho de observação me atrai", diz. "Me saltam aos olhos as pessoas mais idosas, aquela imagem do senhorzinho, caboclo, de chapéu, isso vai lembrar a figura do meu avô, que não conheci pessoalmente. E eu gosto de retratar as pessoas, todas têm sua beleza, algo que chama a atenção. Pode ser uma criança, um vendedor, uma pessoa que pede, um artista." 

Pollyanna confessa que odiava usar o metrô. "Era calor, barulho da bexiga, pessoas gritando, ambulantes falando, cantor que não é tão afinado, mas fui ressignificar tudo isso para um olhar mais empático, cuidadoso, de atenção", afirma. “Quem estou retratando é quem sofre, o operário, o trabalhador do metrô também, o maquinista que trabalha em um ambiente quebrado. Ali todo mundo sofre.”

Divulgação/Fundarpe

A artista conta que evita pegar o metrô em horários de pico e, por isso, são poucos os desenhos que mostram os característicos trens lotados do Recife. Quando está desenhando, volta e meia é abordada por alguém curioso, que pergunta se ela tem uma página nas redes sociais onde publica os trabalhos. E tem: @oxepolly no Instagram. Desenhar no metrô também exige certo jogo de cintura. Já teve quem pedisse que o desenho fosse enviado pelo WhatsApp, mas depois fez investidas e acabou bloqueado; e quem já reclamou muito, mas agradeceu e pediu desculpa ao ver a arte pronta.

"Ficou um vício gostoso. Já teve situação que eu esqueci o caderno e aí eu via cada coisa linda. E é como uma fotografia. Mesmo que eu vá desenhar depois não vai ficar a mesma coisa", comenta. 

Até o convite para expor os trabalhos ocorreu dentro de um vagão, quando a artista desenhava e um coordenador do museu fez a proposta.  Pollyanna tem classificado a experiência de expor em um museu como uma honra inenarrável. "O ambiente museu não só consagra o artista do ponto de vista do mercado da arte, mas eleva, traz a arte à discussão pública. Todo dia as pessoas estão sabendo da exposição, conhecendo o Museu do Trem, descobrindo e redescobrindo o museu e isso é maravilhoso." A exposição seguirá até o dia 5 de fevereiro no Museu do Trem, localizado na Rua Floriano Peixoto, sem número, no bairro de São José. A visitação é realizada de terça a sexta-feira, das 10h às 16h; sábados e domingos, das 10h às 14h. O acesso é gratuito.

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