Canudos plásticos e o debate sobre consumo consciente
O tema tem sido um caminho para abrir discussões sobre a necessidade de a população criar consciência ambiental e deixar de utilizar outros materiais de uso rápido, como sacolas e garrafas plásticas
Ele parece inofensivo. De vários tamanhos, prático e facilmente descartado, o canudo de plástico tem a vida útil de, em média, 4 minutos. O período é indiretamente proporcional ao tempo de decomposição do objeto, que é de cerca de 200 anos. Feitos normalmente de polipropileno ou poliestireno, materiais que não são biodegradáveis, eles se desintegram em pequenas partículas e acabam chegando ao oceano e sendo engolidos por animais. Como se não bastasse, os canudos são leves demais e não podem ser reciclados.
O hábito de utilizá-los como item (in)dispensável no dia a dia transformou o canudo em um dos grandes inimigos do meio ambiente. Apenas nos Estados Unidos, 500 milhões de unidades são descartadas diariamente. Além disso, dados da ONG Ocean Conservancy apontam que o objeto foi o 7º produto mais coletado nos oceanos em todo o mundo em 2017.
Apesar de não ser o único nem o principal problema da poluição, o movimento de abolição dos canudos plásticos, mesmo assim, tem sido um caminho para abrir discussões sobre a necessidade de a população criar consciência ambiental e deixar de utilizar outros materiais de uso rápido, como sacolas e garrafas plásticas. Sintonizados a esse movimento, diversos bares, restaurantes e cafés têm banido o item. Em alguns lugares, como o Rio de Janeiro - primeira capital brasileira a proibir os canudos plásticos - a proibição já virou lei. Redes famosas como Starbucks e McDonald's também já anunciaram que pretendem deixar de usar o objeto.
Em meio ao fluxo de eliminação dos canudos de plástico, começaram a surgir alternativas como canudos de metal, de vidro, bambu e até de macarrão. O de metal foi a escolha do Orgânico 22, no bairro das Graças, Zona Norte do Recife. Com três anos de existência, desde 2015 trazia um aviso no cardápio pedindo que os clientes evitassem o uso do item de plástico. Este ano, o restaurante resolveu abolir o produto. "Tínhamos tentado canudos de papel, mas o resultado não foi interessante, pois alterava o sabor da bebida. Começamos a pesquisar outras opções e encontramos o de metal por um preço acessível", explica a sócia proprietária da Orgânico 22, Elizabete Cardeal de Lira.
Além utilizar o canudo de metal, o local também está vendendo o objeto. "Queremos estimular os clientes a levarem seus canudos consigo. Nossa preocupação maior é, de fato, com a quantidade de lixo gerada e o resultado disso para o meio ambiente", detalha Elizabete. No mesmo caminho está o restaurante Ca-Já. Inaugurado há pouco menos de um ano no bairro do Espinheiro, também na Zona Norte, o local passou a servir bebidas sem canudos. “Quando acabou nosso estoque inicial de canudos de plástico, batemos o pé e decidimos que a partir desse momento não iríamos repor e que essa seria a política da casa”, explica Marina Moneta, sócia do restaurante.
Como alternativa, o Ca-Já oferece uma colher para que quem toma as caipiroscas consiga saborear as frutas. Para aqueles mais resistentes, o espaço dá como opção comprar canudos de inox. Apenas o canudo sai por R$ 35,00 na lojinha do restaurante. Já o kit com o produto e escovinha de limpeza fica por R$ 50. "Foi uma evolução de pensamento. Fizemos o pedido ao fornecedor, mas, infelizmente, o pedido demorou muito para chegar. Então, resolvemos retirar qualquer tipo de canudo do restaurante e acabamos achando que seria mais viável, pela mudança de comportamento dos consumidores, disponibilizá-los na lojinha, para os que preferem ter seus próprios canudos", detalha.
E as mudanças no local vão além da substituição do item. "Estamos repensando o uso de plásticos da nossa embalagem pra viagem, por exemplo. Novas já estão em produção, inclusive", explica Marina. Dados do Fórum Econômico Mundial mostram que, de fato, a consciência ambiental precisa ir além de abolir os canudos: existem pelo menos 150 milhões de toneladas métricas de plásticos nos oceanos. Se continuarmos nesse mesmo ritmo de consumo, apontam os pesquisadores, haverá mais plástico do que peixes no oceano até 2050. Para a bióloga e mestranda em ciências florestais, Yana Lopes, o descarte inadequado dos produtos é um dos principais problemas da poluição.
"O plástico geralmente vai para o oceano e os microplásticos, que é um dos principais poluentes do oceano, acabam alterando a constituição do ecossistema. Os animais acabam ingerindo esse produto que, depois, vai estar na mesa de quem consome peixes, por exemplo. É todo um ciclo que ocorre por conta do consumo exagerado de plástico e, principalmente, por conta do descarte inadequado", explica.
Um vídeo que viralizou em 2015 e já tem mais de 30 milhões de visualizações mostra a realidade do dano do plástico à vida animal. Nas imagens, um biólogo retira um canudo preso na cabeça de uma tartaruga marinha, que sofre e sangra com a "operação". Além dos danos físicos, os plásticos quando estão nos oceanos podem liberar elementos químicos cancerígenos que podem causar distúrbios hormonais.
Foi a partir de exemplos como esse que a a jornalista e ativista em sustentabilidade e consumo consciente, Luiza Sarmento, mudou seu modo de consumo. "Eu comecei rejeitando os canudos depois de uma visita ao lixão de Gramacho e à uma cooperativa de reciclagem. Ali entendi a dimensão do problema. Depois me deparei com muitos videos na internet de animais mortos após terem ingerido plástico", explica.
Luiza criou um kit ecológico próprio para levar aos lugares que frequenta. Canudo de bambu, guardanapo de pano, copo, garrafa, talheres e hashi estão entre os itens, que também evita todo tipo de produto descartável. "Não compro nada que seja embalado, e isso vai desde comida até absorvente, por exemplo. Além disso, procuro ressignificar todo o "lixo" que posso produzindo objetos como brincos, colares e bolsas", conta.