No Ver-o-Peso, Círio representa boas vendas e devoção
Devotos ou não de Nossa Senhora de Nazaré, feirantes dizem como acompanham a quadra nazarena no mais importante ponto turístico de Belém
O Círio de Nossa Senhora de Nazaré é uma das maiores manifestações religiosas do Brasil e do mundo. Todos os anos, no segundo domingo de outubro, a cidade de Belém do Pará reúne cerca de dois milhões de pessoas, entre paraenses e turistas que invadem as ruas em uma procissão de fé e devoção à Padroeira da Amazônia.
O domingo do Círio começa com a missa na Igreja da Sé, pela manhã. Terminada a celebração, a procissão percorre as ruas de Belém até à Praça Santuário de Nazaré, em um percurso de 3,6 quilômetros. No trajeto, passa por um dos pontos mais importantes para cidade de Belém: o Complexo do Ver-o-Peso, que representa fortemente a cultura paraense.
Mais que um ponto turístico, o Ver-o-Peso representa o ponto central da economia belenense. Além da sua relação com o trajeto da imagem peregrina, o mercado começa a respirar o Círio nas duas semanas que antecedem a procissão, quando os paraenses o visitam para comprar os ingredientes do almoço de domingo. Os feirantes veem a época como uma oportunidade de aumentar a renda e afirmam que nem no Natal o mercado fica tão movimentado quanto no mês de outubro.
No Ver-o-Peso, cada feirante tem sua relação pessoal com a festividade. A vendedora de camisas Geni Raiol trabalha desde criança no setor de confecção de roupas do mercado com a família e já viu várias procissões passarem por ali. Para Geni, o Círio não significa somente o sustento da sua família, mas também a sua fé na santinha. “Eu vivo o Círio. Pra mim o Círio é sagrado, então eu não trabalho nesse dia. A minha relação com o Círio não é só comercial, eu vivo o Círio em toda amplitude que ele tem, eu e toda a minha família. O Círio é muito cheio de significados e sentimentos. Eu vivo todos os Círios que você pode imaginar. É nessa época que eu pago todas as minhas contas e ainda guardo dinheiro. Eu também vivo a parte religiosa”, diz a vendedora.
Geni ainda conta que o mercado funciona de uma forma diferente perto da festividade. “Perto do Círio é um outro tipo de Ver-o-Peso que funciona, o comércio funciona de forma diferente. Tem mais variedades de produtos, tem novidades, a quantidade de pessoas pelo mercado é maior, até os consumidores já vêm com o espírito diferente, quando eles perguntam sobre uma mercadoria de fato eles levam. Quando começa a quadra nazarena, começa a se viver um comércio diferente. O restante do país vive a alta no comércio de vendas no Natal e aqui o nosso Natal é o Círio, ele que movimenta. Eu cresci nessa feira e o Círio sempre vendeu mais que o Natal, pelo menos aqui na parte que eu trabalho”, explica.
Assim como na cidade de Belém, o mercado do Ver-o-Peso concentra uma grande diversidade cultural e religiosa. Diva da Silva, vendedora de artesanato do mercado há 20 anos, é evangélica e diz que respeita a manifestação da fé católica, mas conta que já ouviu comentários sobre a religião que pratica e a relação com o Círio. “Às vezes eu escuto uma piada: ‘tem gente que não gosta da santa, mas gosta do dinheiro da santa’. A santa não me deu dinheiro, quem me deu dinheiro foi o suor do meu trabalho. Agora se eu trabalho aqui e a movimentação maior é nessa época, eu não vou deixar de vender por causa do Círio”, disse a vendedora.
Na semana da festa o setor da culinária também fica muito movimentado. As vendas sobem quando os paraenses e turistas correm para comprar a maniva e para encomendar o tucupi. Maria de Jesus, de 52 anos, tem uma barraquinha de tucupi e trabalha há 40 anos no mercado. Para ela, essa é a melhor época do ano. “Quando chega próximo ao mês do Círio é muito bom porque as vendas melhoram. O mercado muda quando chega esse período, aqui fica muito movimentado, vêm pessoas de fora, de outros Estados. No dia do Círio aqui é tão movimentado que essa parte da feira fica aberta até cinco horas da tarde no domingo do Círio. É uma santa que eu sou muito grata a ela, tem algumas coisas que eu conquistei pedindo a ela que me abençoasse e me ajudasse, então pra mim é muito boa essa época” , conta Maria de Jesus.
Por Belisa Amaral, Irlaine Nóbrega e Jamyla Magno.