Negociações no Sudão são canceladas
O Sudão está mergulhado em uma crise desde dezembro
As negociações agendadas para esta terça-feira (30) no Sudão com os generais no poder foram canceladas, com os negociadores do movimento de protesto na cidade onde cinco estudantes do ensino médio foram mortos no dia anterior durante uma manifestação, "um crime inaceitável" segundo o chefe do Conselho militar.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) pediu às autoridades que "investiguem e entreguem à justiça todos os autores da violência contra crianças", dizendo que os manifestantes mortos tinham entre 15 e 17 anos de idade.
Os manifestantes acusam as temidas Forças de Suporte Rápido (RSF), lideradas pelo número dois do Conselho militar à frente do país, Mohammed Hamdan Daglo, por atirar contra a multidão que protestava contra a escassez de pão e combustível na cidade de Al-Obeid (centro).
O Sudão está mergulhado em uma crise desde dezembro. Desencadeados após a triplicação do preço do pão, os protestos se transformaram em oposição ao presidente Omar al-Bashir, destituído e preso pelo Exército em 11 de abril, depois de 30 anos no poder.
Os manifestantes passaram então a exigir que os militares que tomaram o poder o transferissem para os civis.
"Matar civis pacíficos é um crime inaceitável que não deve ficar impune", disse o chefe do Conselho militar de transição, o general Abdel Fattah al-Burhane.
O Unicef lembrou, por sua vez, que "nenhuma criança deve ser enterrada em seu uniforme escolar".
As autoridades impuseram um toque de recolher noturno em Al-Obeid e em três outros locais em Kordofan do Norte na segunda-feira. Todas as escolas do estado foram ordenadas pelas autoridades a suspender as aulas.
A Associação dos Profissionais Sudaneses (SPA), que lidera os protestos, convocou na segunda-feira novas manifestações em todo o país para denunciar este "massacre".
"As forças Janjawid e atiradores dispararam munição real contra crianças em idade escolar", disse o SPA, referindo-se às RSF, cujos membros foram recrutados das Janjawid, milícias acusadas de atrocidades na província ocidental de Darfur.
Segundo a SPA, mais de 60 pessoas também ficaram feridas.
"Os mortos são crianças e isso aumenta a brutalidade", denunciou um líder dos protestos, Ismail al-Taj, durante uma manifestação em Cartum.
Desde dezembro, a repressão ao movimento de contestação matou mais de 250 pessoas, incluindo 127 em 3 de junho na brutal dispersão de uma manifestação organizada em Cartum para reivindicar um governo civil.
Após a morte dos estudantes, as chamadas para suspender as negociações com o poder militar se multiplicaram.
"Não podemos nos sentar à mesa com aqueles que permitem a morte dos revolucionários", disse Siddig Youssef, um dos líderes dos protestos.
"Não haverá negociações hoje porque ainda estamos em Al-Obeid", disse à AFP Taha Osman, um dos negociadores. Satea al-Haj, outro líder da oposição também presente em Al-Obeid, confirmou.
As negociações devem resolver algumas questões pendentes depois que um acordo de compartilhamento de poder foi alcançado em 17 de julho. Obtido após difíceis negociações, prevê um Conselho Soberano de cinco militares e seis civis para liderar a transição por um pouco mais de três anos.