Gravidez requer cuidados redobrados contra a Covid

Rotinadas das gestantes também precisa contar com o esforço coletivo para preservar a saúde da mãe e do feto

sex, 16/04/2021 - 20:28
Pixabay Gestantes já são consideradas grupo de risco para a Covid Pixabay

A atenção à gestante voltou a ser foco nas discussões recentes do Ministério da Saúde, que investiga inserir o público nos grupos prioritários do Plano Nacional de Imunização contra a Covid-19. Já consideradas grupo de risco, gestantes estão mais suscetíveis às infecções sistêmicas e graves, podendo assim comprometer a própria vida e também a vida do feto. Nesta sexta-feira (16), o secretário de Atenção Primária da pasta, Raphael Câmara Medeiros Parente, já anunciou que a nova recomendação da pasta, alinhada com as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS), é de incluir as futuras mães ou pais. Também nos próximos dias, os municípios devem receber R$ 247 milhões para prevenir a disseminação da Covid-19 entre gestantes.

Enquanto a vacina não chega para todos, o cuidado segue fazendo parte da rotina daqueles que precisam atenção redobrada à saúde, seja porque realizam atividades fora de casa ou porque convivem com quem vai e volta diariamente da rua. Para o obstetra pernambucano André Buarque Lemos, entrevistado nesta reportagem, o sentimento não é somente forte entre gestantes, como tem se intensificado de forma geral, por um efeito da segunda onda de casos, “pois há mais informações do que há um ano, mas há também mais óbitos e poucas vacinas”.

Em Pernambuco, os casos de Covid-19 entre gestantes seguem na casa inferior a 1%, diferente de outros estados como o Rio Grande do Sul e Minas Gerais, onde as infecções entre grávidas passaram por uma crescente de casos e os destacam que cerca de 10% das gestantes e puérperas com Covid-19 têm casos graves da doença.

Desde janeiro de 2021, o Governo do Estado disponibilizou a Cartilha de recomendações para gestantes e puérperas frente à pandemia da Covid-19, para informar e atualizar o grupo quanto ao contexto pandêmico e sua relação com o acesso, situação e assistência à saúde. Segundo a futura mãe, Eduarda Serafim, 29 anos, grávida de seis meses, as orientações prescritas no protocolo têm sido aplicadas no cotidiano da Saúde, ao menos nas unidades em que precisa visitar para o pré-natal e exames de rotina, no Grande Recife.

“Desde o início estou bem tranquila em relação a isso. Meu maior receio é sobre o dia de parir, de estar no hospital, onde a incidência [das infecções] parece maior. Eu já fiquei sabendo que no hospital onde eu estava imaginando ter a bebê, não estão recebendo grávidas porque lá só recebem pessoas que tenham sintomas da Covid-19 e sintomas relacionados, nenhum outro tipo. O resto é encaminhado ao Hospital da Mulher, que é onde provavelmente eu terei a bebê. Estão acontecendo superlotações por conta disso, mas lá eles estão tomando todas as medidas cabíveis para que tudo flua da melhor maneira. Sempre nas consultas eles nos confortam e nos informam. No hospital de pré-natal, que é perto de onde eu moro também há distanciamento entre as grávidas, a prioridade da consulta e dia específico para comparecimento. Isso me conforta muito”, relata Serafim.

Com uma vida ativa, Eduarda é professora de dança e ainda dá aulas presenciais semanalmente, tendo contato com as ruas e ambientes fechados, mas de convivência coletiva. Em casa, além do companheiro, também tem a responsabilidade de cuidar de sua filha mais velha, Fernanda, 8, fazendo o possível para não levar o vírus até dentro de casa. Se aproximando da reta final, Serafim diz que já se isola mais, evita idas ao supermercado e delega as atividades ao marido e aos sogros.

“O medo é existente, demais, principalmente agora, gestante. Até então não peguei, e se peguei, foi assintomático. Mas eu tenho muito medo. Quando eu descobri que estava grávida no meio da pandemia, fiquei desesperada. As pessoas que estão ao meu redor têm essa consciência também, estão tendo esse cuidado. Eu ainda estou trabalhando, de forma presencial e dou aulas de dança, mas tomo todos os cuidados desde sempre, em dobro agora. Agora ando mais isolada do mundo, só saio uma vez na semana para trabalhar. Não pego mais transporte público, mas é porque tenho a sorte de ter carro e moto. No geral, faço agora tudo o que estava fazendo há um ano”, completa, explicando que só se vê mais tranquila porque tem tido um acompanhamento “bacana” dos profissionais de saúde da rede pública, que focam no acompanhamento psicológico de gestantes durante a pandemia.

Covid-19 pode trazer complicações antes e no pós-parto

Assim como a gestante recifense, a potiguar Tatiane Lourenço, 24 anos, também passou por uma gravidez sossegada, mas foi pega de surpresa a menos de duas semanas do seu trabalho de parto, quando testou positivo para a Covid-19. A publicitária está trabalhando em regime home-office desde o início da pandemia e vivia em Vera Cruz-RN, sua cidade natal, até se mudar para o Recife em junho do ano passado. Dias após chegar à capital pernambucana, se descobriu grávida. Apesar de todos os cuidados, Lourenço contraiu a doença e acredita ter sido em algum momento durante as suas frequentes idas ao Rio Grande do Norte, onde realizava o pré-natal.

“Escolhi fazer assim porque como o bebê ia nascer lá, toda a minha rede de apoio está lá [no RN]. Passamos oito meses nos cuidando, eu e meu companheiro, sem Covid. Peguei a doença já no nono mês. A gente achava que estava indo tudo bem, até que no nono mês eu fui pro Rio Grande do Norte de vez, porque perto da hora de parir ficamos naquela iminência de que o bebê pode vir a qualquer momento e então comecei a apresentar alguns sintomas como tosse, moleza e coriza, mas não tive dor no corpo, nem febre, só sintomas gripais. Falei para a médica como estava me sentindo e ela disse que era bom fazer o teste. E foi bem num período que estava muito quente e do nada chovia, então a gente pensou até que podia ser uma crise alérgica”, relata a publicitária sobre o começo da sua relação com a doença.

Para ela, o ponto alto do seu período infectada foi quando precisou ser encaminhada a um outro hospital e se separou do filho. Temendo desenvolver um caso de SRAG e uma internação mais longa, diz ter pensado que poderia morrer: “Meu maior medo era ser separada do meu filho. Lembrei do que vemos nos jornais sobre os quadros respiratórios, fiquei com medo de piorar e precisar ser intubada. Entregar o meu filho para a minha mãe e seguir sozinha para o hospital foi cruel”.

Hoje, Tatiane está curada e o seu filho, Arthur, tem pouco mais de um mês de nascido. O bebê nasceu dia 6 de março, quando a mãe ainda estava com 11 dias de sintomas da Covid-19. Apesar do susto, a criança nasceu bem e não contraiu a doença. No entanto, ela não consegue mais amamentar, após ter a lactação interrompida por um processo anêmico grave, piorado pela doença e durante a sua internação, também não teve direito a acompanhante. 

Cuidados

Para alertar sobre os cuidados necessárias que as gestantes devem ter, o LeiaJá convidou o médico e especialista em saúde da família e ginecologia obstetrícia André Buarque Lemos, coordenador do programa Nascer Bem, da rede Hapvida. Lemos também é médico intensivista e trabalha na linha de frente da Covid-19, tendo demandas dos dois grupos — gestantes e pessoas com Covid positivo.

LeiaJá: Qual o protocolo para atendimento de gestantes durante a pandemia? Há demanda com dúvidas e medos relacionados à Covid?

ABL: O cuidado da gestante e da não gestante, de prevenção, é o mesmo: evitar contato com quem teve contato com a doença recentemente, respeitando o período dos quatorze dias de quarentena. O tratamento também vai ser o mesmo da gestante para a não gestante. A dificuldade da gestante é que ela é uma paciente que tem uma imunodepressão pela gestação. Então ela tem uma tendência de o caso ter uma porcentagem um pouco maior de evoluir para casos moderados e graves. Lembrando que a Covid tem um percentual de chance de 85% da população ter sintomas leves. E 15% ali, 10% a 15%, vai ter sintomas moderados a graves. Grave mesmo, na realidade, apenas 5%, e desses, apenas 1% a 2% podem ter chance de risco de morte.

*LeiaJá: Como é que a Covid atua durante uma gestação?

ABL: A gestante é imunodeprimida. A gestação em si causa inflamações no corpo que diminuem o sistema imunológico da mulher, deixando ela mais suscetível a infecções sistêmicas, que é o maior medo dos médicos, se tratando de gestantes que contraem Covid. Por isso, nós obstetras também temos medo de uma infecção urinária ou de uma infecção vaginosa se tornar uma infecção maior. Porém, na prática médica, a gente não observa essa grande quantidade de gestantes graves e óbitos de gestantes [por Covid]. A gente não tem um número tão expressivo, seguindo mais ou menos a lógica que a gente tem visto no normal, com apenas 1%, menos de 1%, 0.5%, 0.3%, de óbitos entre as gestantes. Realmente é um grupo de risco, mas elas estão seguindo os grupos [de vacinação] conforme as comorbidades. Elas não estão pulando na frente de idosos e jovens; estão seguindo o critério.

*LeiaJá: Quais os perigos para a saúde do feto e da criança, durante a recepção do corpo ao vírus?

ABL: O grande risco de a mulher [gestante] pegar Covid é essa infecção se tornar uma infecção sistêmica. E o corpo, durante a infecção, vai querer se proteger, vai querer viver. A primeira forma de ele querer viver é querer expulsar esse feto e ser iniciado um trabalho de parto prematuro, levando, assim, ao aborto ou a uma perda fetal. Um exemplo muito conhecido disso aqui no Brasil foi o caso da esposa de Alok (DJ), cuja Covid evoluiu para um caso tão grave que acabou com o corpo tendo que expulsar a criança. Como ela já tinha trinta e três semanas gestacionais, a criança era uma com viabilidade e sobreviveu. A gente ainda não tem estudos que relatem se a imunidade da mãe passa pra criança; ainda não tem nada em relação a isso. Sobre a transmissão [da doença] da mãe para o feto, não passa, muito pelo contrário. O que a  gente observa é que em RNs e em crianças, a doença não desenvolve. Muito se coloca devido à hemoglobina, porque a hemoglobina das crianças é fetal, então ela, com o passar do tempo, vai se transformando em hemoglobina normal, que é a que tem os adultos.

*LeiaJá: Sabemos que os estudos sobre a reação dos imunizantes da Covid em gestantes ainda caminham de forma um pouco mais lenta que os demais. Qual a orientação médica quanto à imunização desse público?

ABL: A recomendação é tomar a vacina. A gente sabe que a nossa realidade é a seguinte: a gente não tem ainda números que deem relatos de que tomar ou não tomar a vacina pode causar algum problema para a restante, mas a gente sabe que uma gestante com Covid é preocupante e ainda há dificuldade no acesso à vacina por parte da população. Independente de qual seja a vacina, a gestante ou lactante podendo tomar, deve tomar. Tanto para sua segurança, quanto para a segurança do seu lar. Então essa celeuma de possíveis contra indicações ainda não tem números, ainda não tem dados, pra gente em nenhuma hipótese alarmar ou criar esse pânico para a população. Então, acho que a corrente é incentivar e, a partir daí, com a população vacinada é que infelizmente a gente deve conseguir dados. A gente sabe que é uma pandemia, sobre a vacina foram feitos estudos, mas a gente não sabe realmente as reações mas a gente sabe de fato que as gestantes, principalmente que pegarem no segundo ou terceiro trimestre, podem ter maiores chances abortivas e aí sim o perigo ser maior para a criança e para a vida dessa mãe.

*LEIAJÁ: O que pode ser feito para proteger o bebê depois que nasce?

ABL: O que se sabe é que o aleitamento materno traz anticorpos pra criança de forma geral. Então a criança bem amamentada vai pegando esses anticorpos e vai estar forte pra qualquer infecção. E mais uma vez: a gente não tem visto COVID como problema pra RN, neonatos, e ainda um problema pediátrico. 

 

 

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