Insegurança e inflação agravam a desnutrição na Nigéria

O noroeste da Nigéria tem sido devastado por gangues de milícias que invadem cidades, roubam gado e sequestram pessoas em troca de resgate

qui, 28/07/2022 - 09:14
PIUS UTOMI EKPEI Mães fazem fila para serem atendidas com crianças que sofrem de desnutrição em uma clínica montada por autoridades de saúde em colaboração com Médicos Sem Fronteiras (MSF) no estado de Katsina, noroeste da Nigéria, em 20 de julho de 2022 PIUS UTOMI EKPEI

A família de Lariya Abdulkareem cultivava soja em sua cidade no estado de Katsina, no noroeste da Nigéria, antes que ameaças de ataques de bandidos os obrigassem a deixar suas terras para trabalhar em outro lugar.

Alimentar sua família está se tornando mais difícil, diz sua avó, com a insegurança nas estradas complicando as entregas de milho e soja.

Sua família é uma das milhares com crianças que sofrem de desnutrição crescente no noroeste da Nigéria, enfrentando uma combinação de insegurança, aumento dos preços dos combustíveis e alimentos e um flagelo de doenças como o sarampo, segundo autoridades médicas e agências humanitárias.

"Não podemos acessar os lugares que costumávamos ir antes", conta Abdulkareem com sua neta de sete meses nos braços, em uma clínica criada um ano antes pelas autoridades de saúde e Médicos Sem Fronteiras (MSF).

O noroeste da Nigéria tem sido devastado por gangues de milícias que invadem cidades, roubam gado e sequestram pessoas em troca de resgate.

Centenas de milhares de pessoas foram deslocadas nas regiões central e noroeste, e milhares morreram na violência, bem como no conflito jihadista de 13 anos que deixou mais de 40.000 mortos.

A maioria das agências de ajuda opera no nordeste da Nigéria, onde dois milhões de pessoas foram deslocadas, mas poucas operam no noroeste.

O aumento da desnutrição grave é um resultado da complexa crise no noroeste da Nigéria, que ameaça dezenas de milhares de crianças, segundo MSF, com quase 44.500 menores admitidos em programas nutricionais em Katsina de janeiro a junho deste ano.

Somente em Katsina, MSF e as autoridades locais de saúde se preparam para atender 100 mil crianças desnutridas este ano.

Nafisa Sani, uma autoridade de saúde de Katsina, diz que o estado tem números "altos" de desnutrição, mesmo para uma região acostumada a lidar com esse fenômeno.

Dentro das clínicas em tendas, crianças menores de cinco anos, algumas em atendimento de emergência, são pesadas, medidas e diagnosticadas com desnutrição, de acordo com a equipe médica.

"Temos casos de sarampo, fome e com a bandidagem temos muitos deslocados. Isso afeta as crianças", lamenta o pediatra Yakub Abubakar, que trabalha em uma clínica da MSF na cidade de Katsina. "E isso é apenas em um estado."

Bandidos e inflação

O escritório de MSF em Gummi, no estado vizinho de Zamfara, disse que suas equipes examinaram mais de 36 mil crianças com menos de cinco anos em junho, após um alerta nutricional.

Mais da metade das crianças estava desnutrida e uma em cada quatro sofria de desnutrição grave e precisava de atenção médica urgente.

De acordo com o Unicef, a Nigéria ocupa o primeiro lugar na África e o segundo no mundo em desnutrição infantil. Cerca de 8 milhões de crianças no noroeste estão desnutridas, de acordo com a agência. A insegurança aprofunda cada vez mais o fenômeno.

O medo de ataques de milícias de bandidos sediados nas florestas vizinhas de Rugu, nas áreas de Katsina, perto da fronteira com o Níger, afastou muitas famílias de suas terras agrícolas.

Somente este ano, cerca de 1.000 pessoas foram deslocadas por violência ou ameaças em três áreas da região de Jibiya, segundo moradores e uma fonte do governo local.

Muitos cruzaram a fronteira para ficar com suas famílias no Níger, outros estão com parentes na cidade de Katsina e outros estão em dois acampamentos próximos à cidade.

"As pessoas têm medo de serem sequestradas, mortas ou deslocadas", afirma Nuhu Iliya, funcionário de saúde do governo local em Jibia.

O noroeste da Nigéria muitas vezes enfrenta insegurança alimentar, especialmente nos meses pós-colheita, quando os estoques ficam baixos.

Enquanto isso, a invasão russa da Ucrânia atinge o abastecimento de trigo e aumenta os preços dos combustíveis e dos alimentos.

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