Em 10 dias de gestão, Bolsonaro já mostra para o que veio
Primeiros passos como presidente da república foram marcados por corte no valor fixado para o salário mínimo, idas e vindas em decisões e polêmicas com relação aos direitos das minorias
No discurso de posse, no último dia 1° de janeiro, o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), foi direto ao falar que a data representava o início da “libertação do socialismo, da inversão de valores e do politicamente correto”. Ele também chegou a dizer que havia “uma grande nação” para reconstruir e que seria feita em conjunto com a sociedade. Passado 10 dias, muitas foram as medidas tomadas por Bolsonaro e sua equipe de governo, que vem abrindo um leque de discussões que parecem sem fim.
No primeiro dia de mandato, Jair Bolsonaro assinou um decreto, publicado em edição extra do Diário Oficial da União, fixando o salário mínimo em R$ 998, menor que o projetado anteriormente, quando foi proposto R$ 1.006. A reação da oposição foi de imediato. O Partido dos Trabalhadores (PT) chegou a preparar um decreto para que o valor fosse de R$ 1.006, como previa o orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A senadora Gleisi Hoffmann, presidente da legenda, argumentou que essa era uma obrigação já que os juízes e promotores tiveram reajuste de 16% em suas respectivas remunerações.
Outro dos seus primeiros atos foi a retirada da Fundação Nacional do Índio (Funai) o poder de identificar e demarcar terras indígenas, que foi transferida para o Ministério da Agricultura. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), logo após a iniciativa, recomendou às suas representações nos Estados o ingresso de uma ação popular requerendo a nulidade dos atos praticados pelo presidente. Segundo a organização, a atitude destruía praticamente “toda a política indigenista brasileira”.
Também no início do governo, dois conselhos ligados à Presidência da República foram extintos: o de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e o de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão. Já na área da educação, a qual Bolsonaro já vinha alertando para grandes mudanças, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), que integrava o Ministério da Educação (MEC), foi extinta. Em seu lugar, foi criada a Secretaria de Modalidades Especializadas.
Ainda no setor, Bolsonaro sancionou lei que permite o aluno faltar por motivo religioso. A partir deste mês, as escolas terão dois anos para tomar as providências necessárias para colocar a medida em prática. No entanto, os estudantes vão precisar apresentar um requerimento com a devida antecedência.
O presidente também havia aproveitado para alterar o edital do ano de 2020, do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que estabelece as normas para os livros didáticos entregues às escolas públicas. Dessa forma, temáticas raciais, rurais e de combate à violência contra a mulher não seriam mais requisitos para publicações didáticas, mas o governo voltou atrás na decisão - o que, inclusive, tem sido marca da gestão Bolsonaro.
Entre idas e vindas em atitudes governamentais, o militar chegou a dizer à imprensa que havia assinado decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), na última sexta-feira (4). Mas, após uma reação negativa, ele assinou um novo decreto descartando a possibilidade de aumentar a carga tributária e afirmando que os novos contratos firmados neste ano só terão impacto financeiro a partir do ano seguinte.
Segurança e corrupção
O ex-deputado, que passou quase três décadas no Congresso, já avisou que o decreto que flexibiliza a posse de armas de fogo sai ainda este mês. Ele contou que estava conversando com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, sobre o assunto. O que se sabe é que o desejo do militar é que moradores de locais com altos índices de mortalidade tenham mais facilidade em adquirir armas. “Pode ter certeza que a violência cairá assustadoramente no Brasil”, acredita. O ex-juiz já teria editado o decreto e listado a necessidade de uma justificativa convincente para a posse de armas.
Outro foco de campanha e apesar do ministro Moro prometer “medidas mais duras” contra a corrupção e crime organizado, até agora não foi tomada alguma iniciativa marcante nesse sentido. O magistrado avisou que pretende enviar à Câmara, em fevereiro, proposta para endurecer o regime de prisão para corrupção e crimes violentos.
Expectativas e oposição
Nesta semana, Bolsonaro realizou a segunda reunião ministerial com a sua equipe no sentido de definir quais serão as 50 medidas que serão implementadas nos 100 primeiros dias de governo. O objetivo incluiria medidas para estimular a economia, divulgação de corte de gastos e até revogações de iniciativas do governo passado. Segundo o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, a equipe “é muito, muito sintonizada”.
Além dos decretos assinados, algumas outras polêmicas foram protagonizadas nestes primeiros dez dias. Nesta semana, o Brasil deixou o Pacto Global de Migrações da ONU. O acordo tratava de questões relativas a como proteger melhor os migrantes e como integrá-los à sociedade, entre outros pontos.
Bolsonaro chegou a ser enfático, por meio das redes sociais, ao ressaltar que o Brasil é soberano para decidir se aceita ou não migrantes. “Quem, porventura, vier para cá deverá estar sujeito às nossas leis, regras e costumes, bem como deverá cantar nosso hino e respeitar nossa cultura. Não é qualquer um que entra em nossa casa, nem será qualquer um que entrará no Brasil via pacto adotado por terceiros”, disparou.
Opositores continuam a falar sobre as medidas que vem sendo tomadas pelo Governo Federal. O deputado federal eleito Túlio Gadêlha (PDT) chegou a dizer não são poucos os retrocessos que estão acontecendo. O pernambucano falou que era necessário um “diálogo amplo”.
Uma das ferrenhas críticas do militar da reserva, a deputada federal eleita Marília Arraes (PT) vem falando com insistência sobre as ações que estão sendo feitas. “Uma escalada de desmandos, atropelos e fascismo. A nós, parlamentares e cidadãos, cabe continuar o combate em defesa da democracia e da soberania de nosso país”, disse recentemente por meio das redes sociais.
Positividade
Críticas à parte dos insatisfeitos, desde o início do ano, a Bolsa acumula alta de mais de 4,72%. O Ibovespa conquistou um recorde e fechou, nessa terça (8), acima de 92 mil pontos pela primeira vez na sua história. Bolsonaro comemorou, em sua conta no Twitter, os resultados. “Bolsa bate novo recorde e dólar se aproxima da marca de R$ 3,70; um dos menores em muitos meses. Estamos resgatando a confiabilidade do investidor no Brasil”, escreveu.
*Foto do Flickr Palácio do Planalto