Lava Jato usou denúncia contra Lula para proteger Janot
Procuradores resolveram criar uma 'distração' diante das críticas que o então PGR estava recebendo na época por eventuais edições no áudio da conversa de Joesley Batista e Michel Temer
Novas mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil, nesta segunda-feira (14), sugerem que os procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba divulgaram a denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o caso do sítio de Atibaia de maneira estratégica. Em maio de 2017, o grupo publicizou a acusação contra o ex-presidente para tentar abafar as críticas que o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estava recebendo na época.
Janot estava sendo bombardeado por conta de um áudio vazado sobre a colaboração premiada dos executivos da JBS que envolvia o então presidente Michel Temer (MDB). Suspeitas apontavam que o material tinha sido editado.
Carlos Fernando dos Santos Lima, que era procurador da Lava Jato na ocasião, chegou a escrever para os demais colegas que a denúncia contra Lula poderia "criar distração" sobre a eventual edição da conversa entre Temer e o empresário Joesley Batista, que gerou grande repercussão naquele momento porque a gravação deixava a entender que Temer estaria articulando uma espécie de compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (MDB). O áudio vazou em 17 de maio e a denúncia contra Lula estava marcada para o dia seguinte, mas chegou a ser adiada pela repercussão.
Entretanto, quando surgiu a especulação de que o conteúdo havia sido editado, os procuradores, ao conversarem sobre a necessidade de um laudo técnico da Polícia Federal, também trataram de uma forma para abafar as críticas a Janot.
“Quem sabe não seja hora de soltar a denúncia do Lula. Assim criamos alguma coisa até o laudo”, disse Carlos Fernando no grupo Filhos do Januário 1. “Vamos criar distração e mostrar serviço”, asseverou Deltan Dallagnol. O caso do sítio Atibaia foi apresentado à Justiça no dia seguinte à essa conversa.
Veja:
Filhos do Januário 1
21 de maio de 2017
Carlos Fernando dos Santos Lima – 20:02:26 – Quem sabe não seja hora de soltar a denúncia do Lula. Assim criamos alguma coisa até o laudo.
Deltan Dallagnol – 21:03:14 – Acho que a hora tá ficando boa tb. Vou checar se tem operação em BSB, que se tiver vai roubar toda a atenção.
Após checar com a equipe de Brasília, Deltan volta a falar no grupo
Dallagnol – 21:39:51 – Nesta semana não tem op de BSB (mantenham aqui óbvio). Da pra soltar a den Lula Cf acharmos melhor
Jerusa Viecili – 21:40:51 – Faremos o release amanhã
Santos Lima – 21:45:18 – Vamos criar distração e mostrar serviço.
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A perícia da Polícia Federal detectou que houve cortes no áudio da conversa entre Temer e Joesley, mas descartou alterações no conteúdo que foi base, posteriormente, para uma denúncia da PGR contra o ex-presidente.
No caso de Atibaia, Lula foi condenado na primeira instância pela juíza Gabriela Hardt a 12 anos e 11 meses de prisão. O petista aguarda o julgamento de um recurso na segunda instância no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Questionado sobre a estratégia, o Ministério Público Federal do Paraná disse que “quando nenhuma questão legal (como a existência de prazo ou risco de prescrição) ou razão de interesse público determina o momento de apresentação de uma denúncia ou manifestação, a força-tarefa ouve a equipe de comunicação quanto ao melhor momento para sua divulgação”.
O ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, que se aposentou em março, não se manifestou sobre o assunto. Nem a Procuradoria-Geral da República.