A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) pretende aprofundar o debate sobre o novo regime fiscal do país, proposto pelo atual governo. Para isso, o colegiado fará nesta terça-feira (20), às 9h, uma audiência pública interativa para debater o projeto de lei complementar do novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023), já aprovado na Câmara e em tramitação no Senado.
Um dos objetivos da audiência pública é discutir as implicações resultantes de medida adotada pela Câmara, que não manteve a proposta original que excluía do teto de gastos as transferências para o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), bem como sua correção. Os recursos do fundo são utilizados para a execução de serviços públicos dos quais dependem a população que vive e trabalha no Distrito Federal, observam os senadores.
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A promoção da audiência pública foi solicitada pelos senadores Plínio Valério (PSDB-AM), Izalci Lucas (PSDB-DF) e Rogério Marinho (PL-RN), por meio dos requerimentos apresentados em decorrência de acordo celebrado na CAE no último dia 13 (REQs 43, 44 e 48, de 2023). O debate contará com a participação, já confirmada, dos professores José Márcio Antônio Guimarães de Camargo, da PUC-RJ, e Marcos José Mendes, do Insper. Após a audiência, a CAE fará reunião deliberativa. O PLP 93/2023 é um dos projetos na pauta.
Arcabouço fiscal
O PLP 93/2023 foi apresentado pelo atual governo em cumprimento ao disposto no artigo 6º da Emenda Constitucional 126, de 2022. O artigo determina que o presidente da República deveria encaminhar ao Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, projeto de lei complementar sobre o tema.
O texto encaminhado pelo governo estabelecia explicitamente que não se incluía, na base de cálculo e nos limites estabelecidos pelo regime, “as despesas referentes ao inciso XIV do caput do artigo 21 da Constituição Federal”, dispositivo que determina como sendo de competência da União “organizar e manter a polícia civil, a polícia penal, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio”. Em outras palavras, trata-se do Fundo Constitucional do Distrito Federal-FCDF, instituído pela Lei 10.633, de 2002.
Ocorre que o substitutivo aprovado pela Câmara, de autoria do deputado Cláudio Cajado (PP-BA), ao estabelecer seu rol de exclusões, não excluiu do teto de gastos as transferências para o FCDF. Consequentemente, acabou incluindo as transferências ao FCDF no teto de gastos, “de maneira inadvertida e sem qualquer debate prévio, tampouco anuência ou concordância do governo”, destaca Plínio Valério no requerimento da audiência pública.
Além dessa alteração, o substitutivo propõe a alteração do artigo 2º da Lei 10.633, de 2002, de modo que a correção do montante devido pela variação da receita corrente líquida da União deverá ocorrer somente até o exercício financeiro de 2024. A partir do exercício de 2025, a atualização do fundo se fará pelos mesmos critérios aplicáveis à correção do teto de gastos.
“O FCDF é responsável pelo custeio integral da segurança pública da capital da República, sede dos três Poderes e de representações diplomáticas de dezenas de países, além de auxiliar em áreas sensíveis como educação e saúde no Distrito Federal. A retirada de recursos do Fundo corrói a autonomia e a capacidade do governo do Distrito Federal de atender às necessidades de sua população, com consequências prejudiciais em todos os aspectos da vida cotidiana da população”, ressalta Plínio Valério.
Controle e correção das despesas Rogério Marinho, por sua vez, avalia que o novo arcabouço fiscal, aparentemente, visa manter o controle das despesas, considerando tanto a execução orçamentária quanto financeira, mas levanta questões que merecem ser discutidas de forma mais aprofundada.
“Além disso, é necessário considerar a base inicial inflada de correção das despesas sujeitas a essa nova regra fiscal, ou seja, os gastos aprovados no Orçamento de 2023. A promulgação da Emenda Constitucional 126/2022 retirou do teto de gastos o valor de R$ 145 bilhões, sob o pretexto de garantir o pagamento do Programa Auxílio Brasil, que claramente demandava um montante substancialmente inferior. Na prática, com essa autorização constitucional e outras exceções criadas, como o excesso de arrecadação, saldos não reclamados do PIS/ PASEP (não recorrentes), projetos socioambientais e despesas de ensino, o governo contou com cerca de R$ 200 bilhões adicionados ao orçamento de 2023”, explica Rogério Marinho em seu requerimento.
Na avaliação do senador, a regra do teto de gastos está sendo substituída por uma regra de piso de gastos, que corresponderá aos valores mencionados acima, acrescidos de inflação e, no mínimo, um crescimento real de 0,6%.
“Essa abordagem implica um crescimento real das despesas, mesmo em um cenário de déficit fiscal, como projetado para 2024, onde se espera um resultado primário negativo. Isso aumentará a pressão por incremento de receitas ou pelo aumento do endividamento do país. Adicionalmente, propõe-se a criação de um piso específico para a programação orçamentária destinada a investimentos, no valor aproximado de R$ 75 bilhões”, destaca o senador.
Rogério Marinho considera que essa medida estabelece uma nova modalidade de despesa obrigatória, o que pode limitar o crescimento dos demais gastos discricionários do governo no médio prazo, destinados a custeio. Ele ressalta ainda que a proposta do governo não aborda como será incrementada a receita necessária para o cumprimento da meta de resultado primário, que o próprio Ministério da Fazenda estima em R$ 150 bilhões, o que gera uma expectativa de fortes e hipotéticos aumentos de receita. Um ajuste realista no Produto Interno Bruto (PIB) implicaria em uma redução das receitas.
Na avaliação de Rogério Marinho, enquanto o governo defende a redução da taxa básica de juros, projeta um aumento da dívida em pelo menos 10 pontos percentuais do PIB em três anos, o que pressiona a inflação e impede a redução da Selic. No entanto, “o governo tenta transferir a culpa para o Banco Central por essa situação, em uma estratégia diversionista”, destaca o senador.
“Em resumo, o projeto propõe a substituição de um conjunto robusto de regras fiscais com sanções por um arcabouço extremamente flexível, desprovido de qualquer mecanismo de punição ou temor que a sociedade, por meio do Congresso Nacional, possa impor ao comportamento irresponsável do governante”, conclui Rogério Marinho. A reunião da CAE será na sala 19 da Ala Alexandre Costa.
Como participar
O evento será interativo: os cidadãos podem enviar perguntas e comentários pelo telefone da Ouvidoria do Senado (0800 061 2211) ou pelo Portal e‑Cidadania, que podem ser lidos e respondidos pelos senadores e debatedores ao vivo. O Senado oferece uma declaração de participação, que pode ser usada como hora de atividade complementar em curso universitário, por exemplo. O Portal e‑Cidadania também recebe a opinião dos cidadãos sobre os projetos em tramitação no Senado, além de sugestões para novas leis.
*Da Agência Senado