Professores que ensinam a voar

No dia dedicado aos professores, o LeiaJá mostra histórias de educadores que vão além no processo ensino-aprendizagem

por Dulce Mesquita seg, 15/10/2012 - 07:30
Dulce Mesquita/LeiaJáImagens Thailise Marissa (no centro) com parte dos alunos que participam do projeto social Dulce Mesquita/LeiaJáImagens

Paulo Freire, o patrono da educação no Brasil, já dizia que "ensinar não é apenas transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou construção". As palavras do educador pernambucano refletem a iniciativa de muitos professores que vão além do ensino das disciplinas obrigatórias, mas também investem na formação do cidadão e vão além das quatro paredes da sala de aula.

No Colégio Sagrado Coração de Maria, de Brasília, a aula de língua portuguesa do 7º ano do fundamental levou os alunos ao posto de saúde. Não como pacientes, mas para conhecer a realidade da infraestrutura e atendimento à população de São Sebastião, uma das cidades-satélites. Depois de assistirem ao filme Patch Adams – O amor é contagioso e produzirem um relatório, a ideia era humanizar dois postos, inicialmente com a instalação de biblioteca e videoteca. A ideia foi além. Espantados com a realidade, bem diferente do que veem na propaganda do Governo do Distrito Federal, os alunos quiserem apoiar o trabalho médico com adolescentes grávidas de 12 a 14 anos.

“Nós olhamos os estudantes de 11 e 12 anos e os vemos como crianças, mas eles são muito mais espertos que nós. Nossa escola estimula o protagonismo e foi isso que esse projeto proporcionou a eles. Nós apontamos o caminho e eles deram a solução”, destacou a professora Thailise Maressa. Com o apoio do Serviço de Orientação Religiosa (SOR), os alunos arrecadaram kits com fraldas, pomadas e produtos de higiene de bebês durante a gincana anual do colégio. Tudo será entregue às mães no dia 24 de outubro, quando os alunos e o médico do posto farão palestras sobre cuidados com o bebê e pré-natal.

Apesar de o trabalho ainda não ter acabado, os resultados já podem ser vistos na aula de redação. “Os alunos tiveram o prazer de escrever, porque eles vivenciaram tudo”, disse a educadora. E o benefício vai além. “Queremos que os nossos alunos sejam cidadãos com conteúdo, porque o conteúdo sem a vida acaba se perdendo. É preciso dar sentido ao que fazemos”, salientou Thailise, que defende que o professor vá além do conteúdo curricular. “O conteúdo sufoca. Não tem cara, não tem nada. É preciso dar vida. O que essas crianças precisam é de amor e de alguém que as estimule a se posicionar no mundo”, finalizou.

Aprendizado e diversão



Foto: Arquivo pessoal





Iniciativas de dinamizar as aulas não ocorrem apenas nas instituições particulares. Nas escolas públicas, também há docentes que tornam as aulas mais atraentes e transmitem o conhecimento de uma forma inusitada. É o caso do professor João Marcelo Mendes, que leva os alunos das escolas estaduais Maria Amália e São Miguel, ambas do Recife, para uma aula de física num parque de diversões. Participam da aula os alunos do 9º ano do ensino fundamental e do ensino médio.

Na montanha-russa e no bate-bate, o assunto é inércia. No Thunder, uma espécie de pêndulo giratório que atinge até 25 metros de altura, as lições são sobre força, trabalho, potência e gravidade. “Eles adoram porque sabem que é uma aula diferente, sem ‘quadro’. Eles aprendem brincando”, garantiu o professor.

Foto: Vitória Pirro/CAB/Divulgação

E que tal ser avaliado através de uma gincana? Essa é a ideia do professor de biologia Kilder Alves, que há 13 anos realiza a Biogincana com os estudantes do ensino médio do Colégio Americano Batista, de Recife. A proposta deu tão certo que há sete anos tornou-se transdisciplinar, envolvendo as demais áreas do conhecimento. “A ideia surgiu da nossa insatisfação com o método tradicional do ensino que se baseia na totalidade por notas e avaliações. Queríamos algo que estimulasse os alunos e valorizasse o talento e sensibilidade numa visão maior, que aliada à cidadania pudesse transformar e acrescentar ao ambiente da escola a realidade social e de pesquisa”, explicou Kilder.

Engana-se quem pensa que obter a nota 10 nesse formato de avaliação seja fácil. A organização das turmas dura meses e culmina com a realização da gincana, que dura três dias. No primeiro deles, os estudantes recebem as tarefas e nos dias seguintes realizam experimentos científicos, painéis sobre temas previamente elaborados por uma banca de professores, produções que unem gêneros literários e assuntos de diversas disciplinas, além de apresentações culturais e tarefas que estimulam a cidadania. “É visível o crescimento e aprendizado dos nossos jovens após participarem de um evento desse porte. Há uma melhora significativa não só em termos de notas, mas de comportamento e de visão de mundo”, destacou a professora de física Kátia Cunha, que também organiza a Biogincana.

Para os professores, a satisfação está em contribuir para a formação dos estudantes. “Somos mais que formadores de opiniões, somos formadores de sonhos e os sonhos devem ser vividos. Eu creio nisso e me sinto satisfeita e sou feliz com a profissão que escolhi. Logo, tenho valor independente de ter valorização”, frisou Kátia. O professor Kilder também destacou a importância do trabalho conjunto da escola com a família e sociedade. “Fazemos a nossa parte, mas devemos lembrar que, se não houver a família e a sociedade apoiando o desenvolvimento da criança e adolescente, nem sempre o nosso trabalho irá dar bons frutos. Acredito que, segundo Larissa Betfuer, existem escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Preferimos voar e ensinar a voar”, ressaltou.

Colaboração de Lidiane Dias.

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