Enem: o amor se une ao sonho da aprovação no mesmo curso
Casais têm em comum o desejo de seguir a mesma profissão. Eles revelam como unem o amor aos estudos
A rotina de quem está prestes a enfrentar o vestibular é estressante e necessita de dedicação quase exclusiva. Alguns estudantes abrem mão das saídas de fim de semana, dos passeios com amigos e familiares, e até mesmo com o namorado ou namorada.
Por outro lado, existem algumas pessoas que conseguem manter o relacionamento e ainda divide com o amor o sonho de entrar no mesmo curso universitário. Júlia* e Aline* estão há três anos juntas e compartilham o sonho de serem médicas. Nos últimos anos, o curso tem sido o mais concorrido de diversas universidades pelo país, sobretudo aquelas em que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é utilizado como principal forma de ingresso.
Para inscrição do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), ambas escolheram o Recife como primeira opção, além de analisarem as cidades que se mudariam, caso sejam aprovadas em uma segunda opção. No entanto, mesmo com tanta gente disputando uma única vaga, elas não se vêem como rivais.
“Não vejo ela como concorrente, mas como alguém que pode construir, ser participante na minha vitória, e futuramente, colegas de trabalho. Estudamos juntas, ajudo ela nas dificuldades dela e vice versa”, diz Júlia. A jovem tem 23 anos e está há seis tentando ser aprovada em uma faculdade de medicina. Durante a semana frequenta as aulas do cursinho, usa as salas de estudo e ainda revisa o conteúdo em casa. Aliado a isso, busca sempre uns dias à tarde ou à noite para ter a companhia da amada na preparação. Para a estudante, o curso é meta de vida. “Sou do interior, desde pequena eu queria ajudar as pessoas, conseguir transformar o mundo através das minhas ações, foi quando na adolescência minha avó morreu de câncer. Descobri que medicina era o caminho que queria trilhar”, conta.
Já Aline só vê vantagens de estar disputando uma vaga no mesmo curso ao lado da namorada. Traz também da infância a ideia de fazer medicina, influenciada por amigos da família. Está indo para a quarta tentativa, ocupando muito mais da metade do seu dia com os estudos. O casal já passou por reprovações e ela considera que a união foi fundamental para que se mantivesse no foco. “A vontade de desistir veio várias vezes, mas a gente sempre deu força uma a outra. Queremos passar juntas”, diz a candidata.
Da escola à universidade
Karolina Leal e Rodrigo Leal, 17 e 19 anos de idade, respectivamente, compartilham muito mais do que o sobrenome. Se conhecem desde o ínicio do ensino médio, sentando juntos, dividindo os desafios da vida escolar, que agora almejam levar para a universidade. Os dois querem cursar educação física e dedicam-se às aulas na escola pela manhã e revisam as matérias à tarde, sempre focados no futuro profissional em comum.
Karolina acredita que ter o namorado ao lado é uma vantagem. “Tem dias que distrai e dias que ajuda muito porque um vai auxiliando o outro, dando o melhor, principalmente quando é para explicar um assunto que o outro não sabe. Nos ajudamos para passarmos juntos e seguirmos juntos para a faculdade, sem rivalidade”, diz Karolina.
O amado da Karol decidiu há pouco tempo que queria ser educador físico. Naquela indecisão do final de ensino médio, descobriu que tinha afinidade com o curso e está se preparando para encarar o Enem no final do ano. Tem a mesma opinião da namorada em relação à questão de serem concorrentes. “Essa situação é meio chata mesmo, saber que somos concorrentes, mas a gente vem se esforçando para que os dois consigam”, conta o jovem.
Quando pensam na possibilidade de apenas um ser aprovado, eles são unânimes: “Ficaria mais triste se ela não passasse”, afirma Rodrigo. Karolina diz que se sentiria muito feliz em ver o sucesso do seu namorado. Os dois assumem que algumas vezes há uma distração, no entanto, fazem questão de ressaltar que têm noção do objetivo final: dedicar-se aos estudos.
Um relacionamento pode atrapalhar a preparação dos estudantes para o Enem?
O professor de história, sociologia e filosofia, João Pedro Holanda, acostumado com a rotina de quem está "louco" para entrar na faculdade, acredita que o namoro pode ser até um ponto agregador na rotina, com uma ressalva, desde que os dois estudantes estejam focados, independente de concorrerem ou não ao mesmo curso. “Há casais em que as duas pessoas estão com foco de comprometimento e de disciplina, então o fato deles estarem na sala de aula juntos não interfere em nada no processo de aprendizagem, muito pelo contrário, até auxilia. Quando estão fora de sala, estudam juntos, fazem questões e corrigirem simulados juntos. Às vezes um é melhor numa matéria, já o outro tem uma dificuldade. e aí essa relação extrapola os limites do amor físico. Assume características mais puras, eu diria assim, no sentido de somarem juntos, caminharem juntos rumo à aprovação. A velha história: 'sonho que se sonha junto se torna realidade'”, comenta o docente.
A psicóloga do Grupo Ser Educacional, Márcia Karine, também não vê grandes problemas na ‘disputa’, desde que o romance seja sadio. “Quando fazemos o que gostamos juntos, se consegue um clima diferente, a cumplicidade alimenta as boas energias. E dessa forma um incentiva o outro. Em um relacionamento, os interesses precisam ser compartilhados. Cada um também precisa ter seus sonhos e vivenciá -los, o companheiro precisa estar ao lado para apoiar”, afirma a psicóloga.
Sobre o casal ser concorrente, ela também diz que a união pode contribuir para o sucesso dos dois. E caso um passe e o outro não, o sentimento em comum pode ser o gás para que se siga em frente.
“Quando existe cumplicidade haverá a felicidade da conquista da aprovação e o incentivo para a tentativa na próxima oportunidade. Em um relacionamento maduro se consegue vibrar com o outro. Se houver rivalidade, então não está existindo cumplicidade. Em um relacionamento os dois precisam se admirar para que tudo possa dar certo. Se um não consegue ficar feliz com as conquistas um do outro, então é hora de repensar qual o caminho a ser seguido”, conclui a psicóloga.
De acordo com a psicóloga da Escola Conecta, Janayna Rosas, que lida diariamente com alunos de terceiro ano do ensino médio, existe a possibilidade de o casal manter o relacionamento, mesmo com o Enem estando próximo, desde que mantenha o foco e a determinação nos estudos. Veja no vídeo a seguir:
*Aline e Júlia são nomes fictícios. Por questões de segurança, o casal preferiu não se identificar