Exército olímpico: a tropa de elite do Time Brasil
Atletas de alto rendimento por vocação e militares por questão de oportunidade, eles representam quase 30% dos 465 membros do Time Brasil
A flecha traça uma parábola e acerta o alvo a 70 metros. Um gesto repetido dezenas de vezes por Bernardo Oliveira, um dos 143 militares brasileiros que lutarão por medalhas olímpicas em casa, no Rio Janeiro.
O sonho do pódio pode ser medido em flechadas: 350 por dia, seis vezes por semana, há cinco anos. Um total de 546.000 até a estreia no Sambódromo, marcada para o dia 6 de agosto, com a competição masculina por equipes.
Disciplina, respeito da hierarquia, força física e mental. Esses pontos de convergência entre valores militares e esportivos alimentam o sonho de glória olímpica dos integrantes do programa do exército brasileiro.
Atletas de alto rendimento por vocação e militares por questão de oportunidade, eles representam quase 30% dos 465 membros do Time Brasil.
O projeto foi criado em 2008, com âmbito de reforçar a delegação que disputou três anos depois os Jogos Militares, também realizados na Cidade Maravilhosa.
Mas o sucesso foi além dos quartéis. Atletas do exército foram responsáveis pela conquista de cinco das 17 medalhas conquistadas dos Jogos Olímpicos de Londres-2012 e 67 das 141 obtidas no Pan de Toronto, em 2015.
No Canadá, muitos se surpreenderam com uma cena curiosa: brasileiros batendo continência no pódio na hora do hino.
O almirante Paulo Zuccaro, diretor do programa, arrisca uma meta ainda mais ambiciosa para os Jogos do Rio: a ideia é dobrar o total de Londres, com dez dos 30 pódios almejados pelo Brasil para ficar entre as dez melhores nações do planeta.
"Desde o início, o programa via um enorme potencial para transformar o Brasil em potência olímpica", garantiu Zucarro, em entrevista à AFP na base do Grupamento de Fuzileiros Navais de Brasília.
Exemplo da Rússia e da China
Seguindo o modelo que fez sucesso na Rússia ou na China, o programa de esporte de alto rendimento do exército conta com apenas 76 militares de carreira, com 594 atletas civis selecionados por meio de um concurso ou através dos resultados obtidos em competições.
Eles recebem uma formação acelerada e entram diretamente com patente de terceiro sargento.
Os beneficiados têm a disposição a gigantesca infraestrutura esportiva e médica das forças armadas e recebem salário mensal que não os impede de buscar patrocinadores privados, usar os próprios técnicos ou treinar fora dos cartéis.
Se obtiverem sucesso esportivo, os atletas podem permanecer nas forças armadas por até oito anos. Caso contrário, ou se o comportamento não for adequado ao ambiente militar, pode ficar fora do programa.
"O esporte imita o combate e os atletas são bons militares ou então se tornam bons militares, porque existem valores comuns, como a perseverança, a hierarquia, o espírito de equipe e o cumprimento das regras", explicou Zuccaro.
Obsessão por medalhas
A pressão por resultados é mais uma motivação para Bernardo Oliveira, promessa de 23 anos que já conquistou o bronze por equipes no Pan de Toronto.
"Temos potencial para conquistar uma medalha", garantiu o jovem arqueiro. "As forças armadas defendem o país e é o que estamos fazendo também. Levamos a bandeira e defendemos o nome do nosso país. Eu sinto que sou a pessoa certa, no lugar certo e no momento certo", enfatizou.
Outro beneficiado é o pugilista Patrick Lourenço, também de 23 anos. Há dez, luta boxe, desde que entrou no ginásio do Instituto Todos em Luta, no Vidigal, comunidade da zona sul do Rio de Janeiro.
"Entrar no time militar, passar pela experiência de ser soldado, foi algo essencial. Aprendi muito sobre companheirismo, comprometimento com horários e outras coisas, não apenas como atleta", revelou.
"Também aprendi a liderar ou socorrer alguém que precisa de ajuda. Já não sou apenas Patrick, sou o sargento Patrick", ressaltou o pugilista, que luta na categoria mosca-ligeiro até 49 kg.
Liberado das tarefas dos 38.000 colegas militares que cuidarão da segurança do evento, Patrick lembra que passou muita dificuldade antes de contar com a estrutura militar.
"No Rio, eu não tinha ginásio para treinar. Nas forças armadas, posso usar equipamentos de qualquer cartel", completou.
Zuccaro não tem dúvidas: "Existem especialistas que dizem que a pretensão do Brasil de se tornar uma potência olímpica vai depender a continuidade e da robustez desse programa", sentenciou.