Lava Jato fez manobras para livrar bancos, diz mensagens
De acordo com o conteúdo obtido pelo site The Intercept Brasil e divulgado através do El País, nesta quinta-feira (22), os procuradores preferiram firmar acordos do que investigar as instituições
A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba preferiu fazer manobras para que grandes bancos com atuação no Brasil firmassem acordos ao invés de instaurar investigações sobre acusações de envolvimento das instituições financeiras com o escândalo de corrupção. É o que apontam as novas mensagens reveladas pelo site The Intercept Brasil através do El País, nesta quinta-feira (22).
As conversas registradas no aplicativo Telegram entre procuradores da força-tarefa aconteceram em 2016, após alguns bancos serem citados em delações premiadas. No dia 16 de outubro daquele ano, por exemplo, o procurador Roberson Pozzobon alertou aos colegas de profissão: “O Banco, na verdade os bancos, faturaram muuuuuuito com as movimentações bilionárias dele”.
Na ocasião, segundo a reportagem, Pozzobon se referia às movimentações financeiras do empresário e lobista Adir Assad, condenado por lavagem de dinheiro, acusado de envolvimento em diversos escândalos de corrupção, incluindo o da Petrobras. Os procuradores, naquele momento, já tinham a informação de que Assad havia aberto uma conta no Bradesco nas Bahamas para lavar dinheiro “a rodo”. E Compliance Officer, setor responsável por fazer o banco cumprir normas legais, chegou a alertar o Bradesco em 2011 sobre algo errado naquela conta, mas Pozzobon disse que o Bradesco nada fez.
Apesar da informação, ainda em 2016, foi criado um arquivo de “Ideias e Metas FTLJ 2017_2018”, enviado em um dos chats dos procuradores. No documento, em que aparece objetivos a serem cumpridos, o item bancos aparece com a descrição de acordos “a título de indenização por lavagem de dinheiro e falhas de compliance”.
Atingir os bancos com investigações, de acordo com a matéria, na ótica dos procuradores causaria o chamado "risco sistêmico", conceito financeiro que supõe um possível efeito dominó para a economia.
Em 21 de outubro de 2016, o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, enviou uma mensagem para o grupo Filhos de Januário 1 sugerindo a instalação de um Inquérito Civil Público (ICP) que averiguaria falhas de compliance dos bancos. Na conversa, ele diz que a intenção era de “pintar tempestade na portaria”.
“CF, em relação aos bancos e falhas de compliance, Orlando, Paulo e eu pedimos pro Douglas instaurar ICP e pediremos infos pros bancos. A ideia é pintar tempestade na portaria e mandar ofício pedindo infos sobre investigações internas que tenham feito etc., para incentivá-los a virem para a mesa negociar. Vc será o responsável pelos ICPs, como nosso especialista em compliance, mas conte comigo pro que precisar”, diz a mensagem [mantida com a grafia enviada] de Dallagnol para o procurador Carlos Fernando Lima.
“Bradesco, Itaú, Credit suisse e Banco Paulista de SP (só paulista para dar esse nome mesmo... banco paranaense do Paraná nca vi rsrsrs)”, acrescentou.
A reportagem aponta também que, apesar dessa conversa ter acontecido em 2016, apenas em maio deste ano que a Lava Jato chegou de fato à primeira instituição bancária. No dia 8 daquele mês, foram presos três executivos do Bancos Paulista, acusados de lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta para beneficiar a Odebrecht.
Outro fato curioso, levantado pelo El País, é que além da morosidade da Lava Jato atingir os bancos, em outubro de 2018 Deltan esteve fazendo uma palestra paga pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) sobre prevenção e combate a lavagem de dinheiro, pela qual recebeu R$ 18.088 líquidos, quase seu salário daquele mês: R$ 22.432.
Além disso, em 2018, os procuradores chegaram a cogitar o rompimento das negociações do acordo de delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci. A proposta apresentava uma narrativa complexa sobre sua relação com poderosos, como Joseph Safra (Banco Safra), Pedro Moreira Salles (na época, do Unibanco), Lázaro Brandão e Luiz Carlos Trabuco (Bradesco), dentre outros.
Por meio de nota, a força-tarefa de Curitiba disse que "é de conhecimento público que as forças-tarefas Lava Jato no Paraná e no Rio de Janeiro já adotaram diversas medidas de persecução criminal em face de integrantes de instituições financeiras, incluindo diretores e gerentes de bancos e corretoras". O texto ainda observou que o grupo "não reconhecesse as mensagens que lhe têm sido atribuídas. O material é oriundo de crime cibernético e sujeito a distorções, manipulações e descontextualizações".