Oligarquias políticas: status, poder e prestígio
No Recife, os Arraes e Campos brigam pelo comando da principal cidade de Pernambuco. São rostos novos de uma política que se tornou um negócio de família
Arraes, Campos, Ferreira, Labanca, Coelho e Lyra essas são algumas das principais famílias inseridas na política e que perpetuam as oligarquias em Pernambuco. São famílias que há décadas comandam determinadas cidades do estado, passando o comando como uma forma de herança de pai para filho, neto, irmãos e sobrinhos.
Arraes/Campos
João Campos e Marília Arraes disputam o comando da capital pernambucana. Foto: Montagem/LeiaJáImagens
Esses sobrenomes devem ser os mais conhecidos no cenário político pernambucano por se tratar de famílias que comandam a capital pernambucana e o próprio Estado há anos e até décadas. Tudo começa com Miguel Arraes assumindo a Prefeitura do Recife pela primeira vez em 1960 - já em 1962 elegeu-se governador de Pernambuco pela primeira vez.
Ainda enquanto estava vivo, Arraes trilhou o caminho de seu neto Eduardo Campos, que conseguiu se eleger deputado estadual em 1991, depois ao cargo de deputado federal em 1995. Em 2004, no primeiro governo Lula (PT) foi nomeado, após indicação de seu avô, ministro da Ciência e Tecnologia do Brasil.
A partir daí, não mais o sobrenome Arraes tinha peso único, já que os Campos - mesmo integrando os Arraes - solidificaram o sobrenome no Estado. Em 2006, um ano após a morte de Miguel Arraes, o neto Eduardo foi eleito governador de Pernambuco.
Atualmente, temos na disputa pela prefeitura do Recife a “sucessora direta” de Arraes e o sucessor direto de Eduardo Campos disputando a continuidade da oligarquia na capital pernambucana. Marília Arraes (PT) lidera as intenções de voto, enquanto João Campos (PSB) está em segundo lugar.
Ferreira
Fred, Manoel, Rodrigo Maia, Anderson e André Ferreira. Foto: Júlio Gomes/LeiaJá Imagens
Em Jaboatão dos Guararapes e no Recife, o sobrenome Ferreira mostra ter uma força muito grande, não à toa já se organizam para tentar abocanhar o governo do Estado. Contando com a força do universo evangélico, Manoel Ferreira (PSC), patriarca da família, está em seu oitavo mandato como deputado estadual e conseguiu solidificar a família no mundo político, sempre com votos expressivos, seja como vereador, deputado estadual, federal ou prefeito.
Com 54,26% dos votos válidos, Anderson Ferreira (PL), filho de Manoel, conseguiu se reeleger neste ano como prefeito de Jaboatão dos Guararapes no primeiro turno. O irmão gêmeo de Anderson, André Ferreira (PSC), é atualmente deputado federal. Fred Ferreira (PSC), que é cunhado de Anderson e André, conseguiu se reeleger vereador do Recife neste ano, o que fortalece o clã na capital pernambucana.
Labanca
Ettore e Vinícus Labanca. Foto: Reprodução/Instagram
A hegemonia dos Labanca em São Lourenço da Mata, Região Metropolitana do Recife, começou em 1988, com a eleição de Ettore Labanca como prefeito da cidade. Ele permaneceu no poder até 1992, quando elegeu o seu sucessor Antônio Cândido. Em 1996, Ettore volta a ocupar a prefeitura de São Lourenço pela segunda vez e ficou até 2000. De 2002 a 2006 foi deputado estadual. Em 2008, o patriarca dos Labanca volta para São Lourenço e se elege prefeito pela terceira vez, se reelegendo pela quarta vez em 2012.
Ettore morreu em março de 2019, mas o caminho de seu filho Vinícus Labanca (PSB) já estava traçado e, neste ano, o deputado estadual conseguiu que os Labanca retomasse o poder político em São Lourenço e se elegeu prefeito com 40,60% dos votos válidos no primeiro turno.
Coelho
Fernando Bezerra Coelho. Foto: Rafael Bandeira/LeiaJáImagens
Os Coelho são antigos na sucessão de familiares para o comando de Petrolina, maior cidade do Sertão pernambucano; a cidade também foi importante para a ascensão dos Coelho no cenário político nacional. O clã político domina a cidade desde o início do século XX, com Clementino Coelho, mais conhecido como Coronel Quelê, que foi subprefeito. Ele teve 12 filhos e a força política de sua família vem atravessando gerações há mais de um século.
Na geração atual, Fernando Bezerra Coelho (MDB), que foi prefeito de Petrolina por dois mandatos e atualmente é senador é a figura de destaque da família, conseguindo colocar os seus dois filhos no universo político. Fernando Coelho Filho (DEM), é deputado federal e já foi ministro de Minas e Energia no governo Michel Temer (MDB).
O filho mais novo do senador Fernando Bezerra Coelho, Miguel Coelho (MDB), conseguiu neste ano se reeleger prefeito de Petrolina com 76,19% dos votos válidos já no primeiro turno. O emedebista obteve a maior votação do Nordeste.
Lyra
Raquel Lyra, atual prefeita de Caruaru. Foto: Arthur Souza/LeiaJá Imagens
Na capital do Agreste pernambucano, os Lyra começaram a governar em 1959, com João Lyra Filho, que retomou o poder em 1973. O patriarca da família ainda conseguiu se eleger deputado federal e estadual, antes de morrer em 1999. Claro que, dentro desse tempo, ele conseguiu colocar os seus filhos Fernando Lyra e João Lyra Neto no mundo político.
João Lyra Neto (PSDB), filho mais novo de João Lyra Filho, foi prefeito de Caruaru em duas ocasiões: 1989 a 1992 e 1997 a 2000. Vice-governador de Pernambuco nos governos de Eduardo Campos, João Lyra Neto assumiu o governo do Estado quando Eduardo se afastou para concorrer à presidência da República.
Com a sua força em Pernambuco e, claro, em Caruaru, Lyra Neto investiu na candidatura da sua filha Raquel Lyra (PSDB) em 2015, que conseguiu se eleger. Neste ano, Raquel tentou a reeleição e saiu vitoriosa para o seu segundo mandato consecutivo, com 66,86% dos votos válidos.
Em entrevista ao LeiaJá, o cientista Político e professor da Faculdade Damas, Elton Gomes, explica que os oligarcas familiares costumam ser figuras de destaques do ponto de vista da negociação de status, poder e prestígio, além de serem importantes do ponto de vista do exercício do poder político e costumam ser os indivíduos mais preponderantes em uma dada região.
Segundo explica o professor, isso acaba possibilitando “que essas elites se perpetuem no poder de maneira praticamente dinástica, fazendo com que você tenha, de tempos em tempos, a renovação desses ciclos com a transferência do poder de pai para filho, de filho para sobrinho, de avô para neto. No caso mais contemporâneo que a gente está vendo aqui (no Recife) é de bisavô para bisnetos”, diz.
O especialista acentua que essa dinâmica da política familiar ou dinástica, de pessoas que são educadas para poder se incluir na atividade política partidária, que são consideradas herdeiras e sucessoras de personalidades políticas importantes é uma coisa que não acontece só no Brasil.
“Nos Estados Unidos, por exemplo, você vai encontrar famílias de políticos poderosos, por exemplo a família Bush. Mas você vai ter isso em maior escala no Brasil e, principalmente, nas regiões menos favorecidas, e aí o Nordeste ganha preponderância por fatores culturais e econômicos que beneficiam o exercício do poder de oligarquias familiares”, revela o cientista.
Para ele, é importante notar que as oligarquias conseguiram se apresentar como uma força política moderna, que foi vista como uma alternativa ao que existia antes, que eram oligarquias do passado escravocrata, do império brasileiro, da monarquia.
“Quando surgiram figuras como Antônio Carlos Magalhães, Miguel Arraes, Esperidião Amin, Eles foram saudados na sua época como reformistas e modernizadores . Mas hoje eles são verificados como elites políticas que se investem de poder e autoridade do poder econômico, simbólico e político, e perpetuam a sua permanência no poder”, pontua.