'Prazeroso, mas cansativo': mães falam do home office

No Dia das Mães, mães contam, ao LeiaJá, como lidam com a rotina de home office ao lado dos filhos em tempos de pandemia

por Camilla de Assis dom, 10/05/2020 - 08:00

“Tudo aquilo que eu sou, ou pretendo ser, devo a um anjo, minha mãe”. A frase de Abraham Lincoln traduz os sentimentos de milhares de filhos pelo mundo: o de gratidão às mães. E são elas as grandes responsáveis por sustentar um lar. Não necessariamente apenas financeiramente falando - embora 28,9 milhões de lares são chefiados por mulheres no Brasil -, mas são impostas socialmente como as mantenedoras de uma casa.

E nesse tempo de isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus não é diferente. Muitas mães tiveram que adaptar suas rotinas ao esquema de home office e fazer das suas mesas, bancadas, sofás e escrivaninhas, seus próprios postos de trabalho. As atividades profissionais feitas remotamente certamente são um benefício que muitas delas já gostariam de ter, mas podem se tornar também um grande desafio.

Isso porque não apenas precisam dar conta do trabalho, como de todo um lar, que envolve filhos, casa, marido ou esposa - para alguns casos -, animais domésticos, entre outras coisas que fazem parte desse processo de construir uma família. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2019, mulheres dedicam quase o dobro do tempo dos homens em tarefas domésticas. Mesmo trabalhando fora, a mulher cumpria 8,2 horas a mais em obrigações de casa que o homem também ocupado.

Por isso, em comemoração ao Dia das Mães, o LeiaJá conta agora a história e a rotina de quatro mães de Pernambuco. De diferentes cores, jeitos e crenças, elas contam um pouco como é lidar com a dia-a-dia de trabalhar em casa, proteger os filhos, cuidá-los e educá-los em um período tão delicado. Seu medos e aflições certamente são apenas um detalhe nesse processo tão gigantesco que é mostrar a força, o colo e a autoridade de uma mãe.

Jamine

E dentro desse processo se encontra a administradora de empresas Jamine Bruno de Oliveira, de 42 anos. Mãe de três filhos, ela conta que sua rotina tem mudado muito desde que foi decretado o período ainda indeterminado de quarentena no Brasil. Funcionária pública, ela e o marido, também servidor público, dividem as tarefas do lar. Jamine tem três filhos: Arthur, de 12 anos, Pedro, de 10 anos, e Daniel, de um 1 ano. Arthur é portador de uma doença congênita chamada esquizencefalia, que provoca atraso neuropsicomotor. Com isso, ele não anda e não fala.

Foto: Arquivo pessoal







Jamine é mãe de Daniel, de 1 ano, Arthur, de 12 anos, e Pedro, de 10 anos (que não aparece na foto)

Isso faz com que a rotina de Jamine seja dividida com o companheiro. Pela manhã, a também mestranda em Políticas Públicas pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) começa o trabalho antes das 6h. “Fico até 11h, nesse horário eu começo a organizar o almoço. Depois do almoço, meu filho de 1 ano dorme um pouquinho mais e eu volto a trabalhar, volto a escrever minha dissertação. Quando chega próximo do horário da janta, eu me desloco e vou fazer o jantar e após a janta a gente tem um horário em família, e mais tarde eu volto ou ao trabalho ou à dissertação. Meu marido também volta ao trabalho”, detalha.

A rotina com as três crianças exige muita atenção e cuidados. Arthur, pelas suas necessidades, tem tudo em horários bem determinados. “Ele estuda na rede municipal e não está tendo aula”, diz Jamine. Já Pedro tem aulas virtuais em uma escola privada do Recife, e consegue ter uma certa independências nas atividades. Já o pequeno Daniel, pela pouca idade, também é dependente dos cuidados dos pais.

Para a mãe, o maior benefício do trabalho home office com os filhos é poder ter o contato em família. Já o maior desafio é a conciliação dos horários. “Quando você está fora de casa, você se arruma, fecha a porta e vai embora fazer suas coisas, o foco é 100%. E quando você está em casa, alguns momentos, realmente, você tem que parar, tem que dar atenção, responde a uma pergunta, responde outra. É bom, mas ao mesmo tempo é cansativo”, diz.

Eduarda

No mesmo cenário de tentar conseguir lidar com as coisas de casa e do trabalho está Maria Eduarda. A administradora do terceiro setor na ONG Espaço Feminista do Nordeste para a Democracia e Direitos Humanos tem uma filha de oito anos, chamada Maria Fernanda. A garota tem Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) além de uma comorbidade chamada Transtorno de Ansiedade Generalizada. “Como diz no popular, ela tem uma cabeça a mil por hora e vai longe na imaginação. Apesar de ser medicada para melhorar a capacidade de concentração dela nos estudos, e acompanhada pela psicóloga, ela tem muitas habilidades a desenvolver ainda, então requer muito de mim”, diz Eduarda.

A rotina diária precisa muita atenção e dedicação a Fernanda. Pelo fato da filha ser “grandinha” já tem autonomia em algumas atividades, como tomar banho e se vestir. “Mas eu preciso ficar cobrando e verificando”, pontua Eduarda. “Depois vamos à aula virtual, eu preparo tudo e tento deixá-la fazendo sozinha, mas é impossível pela dificuldade em manusear o computador. Então eu fico alternando entre fazer alguma coisa no escritório que tenho em casa e ajudá-la”, completa. 

Foto: Cortesia

Eduarda concilia o trabalho com a atenção à filha, Maria Fernanda

Após as atividades matinais, Eduarda é responsável pelo preparo do almoço e organização da casa. À filha, ela delega pequenas atividades domésticas para auxiliá-la o dia a dia. “Como a organização que trabalho é feminista, ela é bem flexível e entende quando digo que estou ocupada com minha filha”, diz Eduarda. 

Fabiany

Aos 38 anos, a bancária Fabiany Souza Andrade divide a atenção do trabalho com três crianças. Seu dois filhos, Kaiky, de 10 anos, e Lara, de 5 anos, e seu sobrinho, Ryan, de 12 anos. Com a quarentena, o garoto veio passar o período de isolamento sob os cuidados da tia. O privilégio de Fabiany entre as outras tantas mães é ter os horários de trabalho flexíveis. “Me dedico entre cinco e seis horas diárias”, diz.

Apesar disso, não faz a rotina ser mais fácil. É trabalho, cuidado com a casa e dedicação às crianças diariamente. Com as aulas on-line, ela buscou um outro computador no trabalho para que conseguisse dar conta da educação dois dois filhos e do sobrinho. Pela manhã, Kaiky assiste às vídeo-aulas de forma mais autônoma, enquanto Lara precisa da atenção da mãe nas atividades escolares. À tarde, é a vez de Ryan.

Por volta das 9h30 ou 10h, ela inicia o home office. “Inicio meu home office ao lado de Kaiky, quando ele já está iniciando as atividades e fico disponível para a necessidade de ele me demandar ajuda. Eu sempre ensinei ele a estudar sozinho, então ele recorre muito pouco a mim. Pausamos para o almoço (que já deixei pronto na noite anterior) e retomo meu home office até umas 15h30, 16h. Ryan inicia as aulas on-line às 14h e termina às 17h, como ele também fica ao meu lado, posso auxiliá-lo quando necessário” explica. O restante da noite se divide entre fazer as atividades de casa, deixar o resto do almoço do dia seguinte pronto, cuidar da família e, ainda, cuidar de si. 

Para Fabiany, o grande desafio de estar no processo de isolamento social e home office com as crianças é não perder o foco, não brigar e levar as adversidades com leveza. Já o grande benefício é ter o contato diário. “Eles sentem falta e querem estar literalmente juntos. Eles entram no escritório para me dar beijos e abraços. Isso não tem preço”, garante.

Vanessa

Aos 29 anos, Vanessa Bastos divide a profissão de professora técnica supervisora CTI da Gerência Regional de Educação Metropolitana Sul, da Rede Estadual de Ensino de Pernambuco com a vida de empreendedora. Ela tem uma marca voltada para a produção de doces, chamada Dolce Por Vanessa Bastos.

Dentre as mães já citadas nesta reportagem, Vanessa destoa por um motivo: não está com o filho. Diante da exposição devido à entrega dos doces que precisa fazer, sobretudo com a proximidade de datas comemorativas como o Dia das Mães, ela optou por se afastar daquele que é o seu bem maior: seu filho, Gabriel, de 9 anos. O pequeno está na casa da avó, que mora em Paulista, na Região Metropolitana do Recife.

“E aí acabo que não tenho que me desdobrar tanto com relação aos cuidados com ele, porém supervisionando a distância. Porque, sabe, casa de avó pode tudo. Então, tenho que monitorar o horário que  dorme, que joga, que faz tarefas…”, diz. 

Essas foram quatro breves histórias. Quatro mães que, cada uma com suas peculiaridades, mostram a força da mulher. Quatro mães que, assim como a repórter que escreve esta matéria ou a leitora que a aprecia, se identificam com as lutas e glórias diárias de estar no papel maternal de cuidar, educar e proteger os filhos.

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