Olympia, o mais antigo cinema do Brasil, completa 106 anos
Aniversário da centenária sala de exibição, que funciona há mais de um século em Belém, será comemorado nesta terça-feira (24) com a exibição do clássico "A Dama das Camélias"
Administrado pela Prefeitura de Belém (PMB), por meio da Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel), desde 2006, o Cine Olympia celebra a data com uma programação bem especial. Nesta terça, às 18h30, haverá mais uma edição do tradicional projeto Cinema e Música, que exibe um filme mudo com acompanhamento musical, ao vivo, do pianista Paulo José Campos de Melo. A entrada é franca e tem apoio da Fundação Carlos Gomes.
O filme escolhido, “A Dama das Camélias”, narra o drama da cortesã Marguerite Gautier (Alla Nazimova), que se apaixona profundamente por um jovem promissor, Armand Duval (Rodolfo Valentino). Quando o pai do rapaz, Gaston Rieux (Rex Cherryman), implora à moça para que não se case com o filho, porque a união acabria arruinando o futuro e a carreira do jovem, ela consente e deixa o amante. No entanto, quando a pobreza e a doença terminal a dominam, Marguerite descobre que Armand não perdeu o seu grande amor por ela. Baseado em romance de Alexandre Dumas Filho, produção de 1921 com direção de Ray C. Smallwood, o filme tem 72 minutos de duração.
Com influências da arquitetura art déco e da Belle Époque, o Olympia foi inaugurado no dia 24 de abril de 1912, durante o governo do intendente Antônio Lemos, pelos empresários Carlos Teixeira e Antônio Martins, donos do Grande Hotel (que hoje é o hotel Princesa Louçã e já foi Hilton) e do Palace Theatre.
O Cine Olympia passou por uma grande reforma em maio de 1960, comandada pelo arquiteto paraense Ruy Meira, que na época buscou inserir aspectos modernos no prédio. Em 25 de abril de 2002, foi iniciado o processo de tombamento do Olympia. A partir dessa iniciativa, a sala passou a ser considerada mais um patrimônio histórico e material da cidade de Belém, inserida no entorno do complexo da Praça da República.
É o cinema mais antigo em funcionamento no Brasil, considerando que sempre esteve no mesmo lugar e não parou as suas atividades por muito tempo. Com inúmeras dificuldades econômicas e administrativas, o grupo Severiano Ribeiro, que o administrava, quase fechou as portas do cinema em 2006.
Atendendo aos apelos da sociedade e artistas belenenses, a prefeitura assinou contrato de locação com o proprietário da casa e criou um espaço cultural. Atualmente, o Olympia é palco de festivais de filmes e exibição de clássicos do cinema mundial, em programações gratuitas ao público.
Memória - Todos os que amam a sétima arte em Belém têm uma história especial com o Cine Olympia e lembranças de bons momentos vividos naquele cinema, em suas 434 poltronas na cor vermelha. O cinéfilo “de carteirinha” e administrador do grupo Cinema na rede social Facebook, Nelson Johnston, se lembra que o primeiro filme que viu no Olympia foi o desenho dos estúdios Disney “A Espada Era a Lei”. “No labirinto da memória, de forma imprecisa, recordo da imagem de uma prima e seu convite para ver ‘A Espada era a Lei’. Ao mesmo tempo, imagens de ‘A Noviça Rebelde’ e vários filmes de Elvis Presley, e assim foram meus primeiros contatos com o Cinema Olympia”, conta Nelson.
“O que mais me sensibilizou também foram as matinais de domingo. Era um frequentador assíduo, e foi numa daquelas sessões que conheci ‘2001: Uma Odisseia no Espaço’, o filme da minha vida. Daí em diante, surgem hiatos de lembrança que me lançam para o ‘Teorema’, do Pasolini; ‘Romeu e Julieta, de Zeffirelli, neste, numa sessão tão lotada, fiquei na fila do gargarejo, mas aliviado, pois pensei que iria ser barrado na entrada por não ser maior de 14 anos”, prossegue. “E também me vejo com toda a família, meu saudoso pai já falecido, minha mãe e irmã, na sessão de ‘E.T. - O Extraterrestre’ e com meu primeiro amor nas sessões de filmes liberados pela censura, ‘Decameron’ e ‘Saló: os 120 dias de Sodoma’, além das minhas primeiras sessões de ‘Império dos Sentidos’, ‘Laranja Mecânica’, naquela cópia com bolinhas da censura; ‘Nascido para Matar, ‘De Olhos Bem Fechados’, ‘Titanic’, e muitos outros filmes. Quero dizer parabéns ao Olympia e muito obrigado por tantos momentos felizes", encerrou.
“O Cine Olympia foi amor e paixão à primeira vista, desde criança”, relembra o professor Elias Neves Gonçalves. “Eu não podia ir sozinho ao cinema até que um dia, aos 11 anos de idade, minha irmã me levou para assistir ao ‘E.T. - O Extraterrestre’, de Steven Spielberg. Sessão lotada. Pura magia e vibração. Foi minha ‘primeira-comunhão’ com o nosso templo da sétima arte, em Belém”, conta. “Depois, foram tantos outros filmes maravilhosos. A fila na bilheteria, a bombonière, o cheiro da pipoca no ar, as poltronas vermelhas, a luz do projetor saindo da janela na parede de fundo, enfim, detalhes que se misturavam ao sonho assistido no telão do Olympia. Pura imersão de emoção e arte”, enfatiza Elias.
Para o jornalista e cinéfilo Alessandro Baía, o Cine Olympia sempre fará parte da memória de qualquer apreciador de cinema na capital. “Foi no Cine Olympia que assisti ao meu primeiro filme com meu pai, em 1988: ‘O Milagre Veio do Espaço’. Foi e sempre será inesquecível. A magia do cinema dividida com o ente querido mais importante é para fincar na memória e na alma. Além deste momento, o Olympia me proporcionou conhecer outros grandes filmes que, hoje, são de cabeceira, como ‘Sociedade dos Poetas Mortos’, ‘A Insustentável Leveza do Ser’, ‘De Volta Para o Futuro II’ e tantos outros. A nossa cinefilia agradece pelo amor à sétima srte que esse cinema centenário ajudou a fortificar. É como o amor de um pai pelo filho: eterno", reforça Alessandro.
O Olympia não é apenas uma sala de cinema, mas um local com pequenos detalhes curiosos que saltam aos olhos. Por exemplo, na parte de trás da sala, ao lado na sala de projeção, no segundo piso, existe um pequeno apartamento, que, provavelmente, era utilizado por algum funcionário da casa.
Como em outras salas de cinema, o Olympia também tem o seu departamento de “achados e perdidos”. Na centenária casa, chama à atenção a quantidade de apenas um dos lados de brincos que foram perdidos ao longo dos anos. Estão todos guardados esperando a(o)s dona(o)s. “Guardamos tudo o que encontramos dentro da sala de exibição. Algumas pessoas voltam a procurar os objetos perdidos, outras não. Mas o que mais me intriga é uma dentadura achada, mas que nunca foi reclamada”, conta Marco Antônio Moreira, programador.
Projetos - O Cinema Olympia, além da programação de terça-feira a domingo, mantém projetos de exibição voltados à comunidade, como o “A Escola Vai ao Cinema", no qual instituições de ensino da rede pública ou privada, em parceria com a PMB, levam grupos de alunos à sala de projeção, com o objetivo de formar público para esse tipo de produção.
Para o presidente da Fumbel, Fábio Atanásio, manter um cinema centenário, como o Olympia, é de suma importância para a cidade. “A tradição dos cinemas de rua está se perdendo, mas o Olympia vai continuar a ser essa grande sala, não só pela sua importância histórica, mas também por ser o retrato vivo de uma época das mais importantes para a capital do Pará, como foi a Belle Époque”, disse Atanásio.
Ainda nas celebrações pelos 106 anos do Cine Olympia, a programação prevê no dia 4 de maio, às 18 horas, a realização do “Encontro de Audiovisual em Comemoração aos 106 anos do Cinema Olympia”, com debates sobre a produção crítica e fílmica do cinema paraense. Os convidados são Ângela Gomes e Ana Lúcia Lobato, professoras do curso de Cinema da Universidade Federal do Pará (UFPA); Zienhe Castro, produtora cinematográfica paraense, diretora do curta-metragem “Promessa em Azul e Branco”; Cássio Tavernard, produtor cinematográfico, diretor da animação “A Onda - Festa na Pororoca”; e Marco Antônio Moreira, crítico de cinema e presidente da Associação dos Críticos de Cinema do Pará (ACCPA). Haverá entrega de certificados aos participantes. A entrada é gratuita.
Serviço
Programação de aniversário de 106 anos do Cinema Olympia, nesta terça-feira, 24, às 18h30, no projeto Cinema e Música, exibição do filme mudo “A Dama da Camélias”, com acompanhamento musical, ao vivo, do pianista Paulo José Campos de Melo. Apoio da Fundação Carlos Gomes. Entrada franca.
Por Dedé Mesquita, da Agência Belém.