Pobreza e desemprego agravam problemas psicológicos

Psicólogo Márcio Valente explica como a dificuldade financeira pode levar as pessoas ao adoecimento e até desencadear pensamento suicida

ter, 30/04/2019 - 18:16
Arquivo pessoal Márcio Valente, psicólogo e professor da UNAMA Arquivo pessoal

A cobrança social baseada no acúmulo de capital está entre os faores que podem desencadear pensamentos suicidas, entende o psicólogo Márcio Valente, mestre em Psicologia e professor da Universidade da Amazônia - UNAMA“Não importa se é bom ou ruim para nós, importa que isso gere dinheiro para que a gente possa pagar nossas contas”, observou.

No Brasil, atualmente, existe um conjunto de serviços públicos que atuam na prevenção ao suicídio. Entre as iniciativas estão o atendimento nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e nas Unidades Básicas de Saúde (saúde da família, postos e centros de saúde). No primeiro semestre do ano passado, o Ministério da Saúde liberou meio milhão de reais para ampliação do alcance do Centro de Valorização à Vida (CVV) - que atende o número de apoio 188.

LeiaJá: O senhor acredita que as estratégias assumidas pelo Ministério da Saúde para atingir a meta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de redução de 10% dos óbitos por suicídio até 2020 são efetivas?

Márcio Valente: A Organização Mundial da Saúde (OMS) trabalha com a noção de que a saúde se comporta ou se institui como uma lógica de pleno acesso a todos os serviços e condições de possibilidade de viver. Nesse sentido da OMS, a gente está cada vez mais doente. Num sentido bem pessoal, você tem um sujeito vivendo em um universo que diz para ele que basta se movimentar que vai vencer, ao mesmo tempo que você tem cada vez menos opções de estabilidade econômica. E esse sujeito vai enfrentar uma rede cada vez mais pobre.

LeiaJá: Quais situações podem gerar gatilhos suicidas e como lidar com estes?

Márcio Valente: A situação de morte, de perda, essas situações de vazio podem funcionar como convites à experiência do suicídio. Porém, quando eu falo isso, acabo falando de suicídios que estão muito ligados a condições socioeconômicas. No sentido de um certo adoecimento, do que nós poderíamos chamar de uma depressividade. Embora nem todo depressivo seja um suicida em potencial. Mas também existem os suicídios que vão acontecer em virtude de outros elementos.

LeiaJá: Sendo o suicídio um fenômeno complexo e multifacetado existem maneiras de identificar tendências suicídas?

Márcio Valente: Existem tentativas de suicídio que podem acontecer envolvendo outros elementos. Por exemplo, é muito comum a tentativa de suicídio em adolescentes e, às vezes, em crianças que na verdade escondem outro quadro. Escondem quadros de violências muito próximas, em algumas condições familiares. Não é a mesma coisa, não dá para falar que esse suicida é o suicida para quem a vida se torna sem saída. São razões aparentemente próximas, mas distintas. Esse jovem ou essa jovem que tenta se matar, isso aparece como uma tentativa de comunicar esse sofrimento.

LeiaJá: Segundo estudo realizado pelo Ministério da Saúde, em 2017, os homens concretizaram o ato mais do que as mulheres, correspondendo a 79% do total de óbitos registrados. Quais os fatores influenciadores dessa taxa?

Márcio Valente: Ele (o machismo) impõe a nós, homens, assim como impõe às mulher, metas e regras muito rígidas em que alguns contextos são quase inegociáveis. Aquele homem que está justamente nessa posição de desempregado há anos, não conseguindo fazer aquilo que socialmente ele aprendeu que deveria fazer que é sustentar as pessoas, apoiar as pessoas no sentido financeiro, material, ele não consegue executar essa função e isso pode, a longo prazo, conduzi-lo a um adoecimento, a uma depressão e, em alguns casos, a uma tentativa de suicídio. Há uma relação direta entre essa cultura machista, misógina, patriarcal com o suicídio dos homens, que são muito maiores do que as mulheres.

Por Weslei Lima.

 

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