Servidora do Cabo denuncia caso de racismo institucional

Coordenadora do CRAS do município é candomblecista e se tornou alvo de denúncia ao Ministério Público por utilizar artefatos da sua religião

por Vitória Silva sab, 25/09/2021 - 12:33
Reprodução/Instagram Elayne Viana, coordenadora do CRAS Vila Roca, no Cabo de Santo Agostinho Reprodução/Instagram

Denunciando intolerância religiosa e racismo institucional, uma servidora pública do município do Cabo de Santo Agostinho, no Grande Recife, foi às redes sociais relatar que descobriu ser alvo de denúncia ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE), na última quarta-feira (22). Elayne Viana, de 31 anos, que é psicóloga e coordenadora do Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) Vila Roca e candomblecista, foi denunciada por “fazer rituais da sua religião” no ambiente de trabalho, durante o expediente. 

Na queixa, foi anexada uma foto de Viana, na qual ela aparece utilizando o turbante e uma guia. A guia é um colar utilizado pelos filhos (abiãs) de um determinado ilê ou casa de candomblé, e que representa o orixá “guia” de determinada pessoa de fé. No Brasil, a liberdade de culto e expressão é direito constitucional garantido, acobertado também através da Lei 9.459/2007 de Intolerância Religiosa. 

LeiaJá teve acesso ao documento que formalizou a denúncia ao MPPE. O denunciante solicitou anonimato, justificando que é uma pessoa que trabalha no CRAS. A priori, a denúncia foi feita somente à ouvidoria do órgão, mas no dia seguinte a gerente de Elayne soube do pedido ao MP. 

“A coordenadora Elaine, do CRAS VILA ROCA, no município do Cabo de Santo Agostinho, tem feito no ambiente de trabalho e no horário de trabalho rituais de sua religião. Sempre compostos por velas, incensos, imagens, flores. Não suportamos mais. E isso quando se encontra no local. A mesma nunca cumpriu horário de trabalho, nem de chegada, nem de saída, muitas vezes quando vai para o almoço não retorna. Um absurdo”, diz a queixa. Elayne nega qualquer comportamento inadequado além da manifestação individual de sua fé.

Elayne Viana, de 31 anos, alega ser vítima de racismo institucional. Foto: Reprodução/Instagram

Também ex-presidente do Conselho de Igualdade Social do Cabo, a denunciada afirma estar ciente dos próprios direitos e também possuir articulação com o Movimento Negro de Pernambuco. Elayne, já sob orientação, deve argumentar racismo na resposta ao Ministério Público, que deve ser feita pela Secretaria de Programas Sociais do município, dentro de um mês. “Me informaram que vão construir uma resposta ao MP, dentro do prazo de 30 dias, e a resposta que será construída será com base na intolerância religiosa e racismo institucional”, contou Elayne ao LeiaJá.  

E continuou: “É um caso explícito de racismo institucional, religioso e intolerância religiosa. Até quando nós de comunidades tradicionais vamos precisar passar por isso? Começa com uma denúncia e depois levamos uma pedrada na rua. Isso quando não morremos”. 

LeiaJá entrou em contato com a Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho no sábado (25), para entender como a gestão deve se manifestar em seu retorno à denúncia; e também com o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), em busca de um esclarecimento sobre como as questões de manifestação religiosa dos servidores públicos do estado são cobradas, uma vez que a denúncia foi aceita pela instituição.

O MPPE respondeu que "a manifestação encontra-se na Promotoria de Justiça na Defesa do Patrimônio Público do Cabo de Santo Agostinho porque a questão apresentada diz respeito a possíveis faltas funcionais por descumprimento da carga horária". 

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