Calor extremo e secas ameaçam ecossistema amazônico

Especialistas falam dos riscos do aquecimento global e do desmatamento na região

seg, 04/10/2021 - 16:24
Bruno Cecim/Agência Pará Desmatamento contribui para aquecimento global, segundo pesquisadora Larissa Amorim Bruno Cecim/Agência Pará

Publicado no início de agosto, o mais recente relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU (Organização das Nações Unidas) aponta como um fato o aquecimento global de 1,1°C, provocado pela ação humana, desde o início da Revolução Industrial. Segundo o relatório, esse aquecimento da atmosfera, oceanos e superfície do planeta gerou mudanças climáticas drásticas e sem precedentes nos últimos milênios, como ondas extremas de calor, chuvas mais intensas e seca mais severa e prolongada.

Para o professor e pesquisador do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará (UFPA) José Henrique Cattanio, especialista em mudanças climáticas, já é possível detectar aumento de temperatura na região paraense. “No Estado do Pará, em uma análise de 1973–2013, é observada tendência de aumento na temperatura entre 0,4 e 0,8 °C por década, sendo que todas as regiões do Estado mostraram aumento de temperatura atmosférica”, afirmou.

O especialista também afirma que o aumento da temperatura ocorre em toda a Amazônia. “As projeções do IPCC (2021) apontam para um aquecimento praticamente certo em todas as sub-regiões do bioma Amazônia. Existem fortes evidências que o aquecimento continuará em todos os lugares na América do Sul”, disse.

José Henrique explica que é grande a possibilidade de eventos climáticos extremos na região se tornarem mais frequentes, como o estresse térmico extremo, quando a temperatura aumenta acima de 41°C. “Já é possível observar um aumento nos extremos climáticos para a temperatura do ar em todas as sub-regiões da Amazônia”, declarou. O professor também cita redução das chuvas e maior frequência e duração de dias secos por causa das mudanças climáticas.

“Dados anuais mostraram reduções nas precipitações e aumento na evapotranspiração entre 2000 e 2016. Isto indica que o clima Amazônico está tendendo a ficar mais seco e mais quente, diminuindo a água disponível no solo para as plantas (agrícolas e florestas)”, afirmou.

Segundo o pesquisador, outro efeito do aquecimento global na região será a redução do litoral amazônico, provocada pelo aumento do nível do oceano. “Em 2100, com o aquecimento global e degelo dos glaciares e calotas polares, projeta-se um recuo médio entre 50m a 100m para o litoral Amazônico, ou seja, algumas construções nesta faixa no litoral serão inundadas pelas marés”, disse.

Para o professor José Henrique, é preciso tomar atitudes para controlar o aquecimento global antes que ele se torne definitivamente irreversível. “Se chegarmos a um aumento de 2°C na temperatura global não teremos mais volta ao que era antes da industrialização. Para os governos amazônicos, seria fundamental que fizessem cumprir a Lei Ambiental e fiscalizassem o avanço do desflorestamento”, afirmou.

Conforme explica o professor, a lei estabelece que 20% da cobertura florestal original pode ser modificada para atividades como agricultura e pecuária. “No Pará, este limite já foi atingido. Neste sentido, até que se recuperem as áreas já alteradas nas propriedades, que não estão de acordo com a Lei, seria imprescindível adotar desflorestamento zero”, disse.  

O pesquisador entende que os governos ignoram a urgência da situação mostrada pela ciência. “Nossos governantes não conseguem olhar para o futuro. Se assim o fizessem e acreditassem no que os cientistas estão prevendo, não haveria mais desflorestamento na Amazônia, pelo simples e irrefutável fato de que as chuvas que ocorrem ao sul da região amazônica dependem das florestas que aqui ainda existem”, finalizou.

Um dos grandes desafios que a floresta amazônica enfrenta nos últimos anos é a intensificação do desmatamento, atividade que contribui para o aquecimento global. “Nossos últimos monitoramentos apontaram a intensificação da fronteira do desmatamento que abrange o sul do Amazonas e partes dos Estados do Acre e Rondônia”, explicou Larissa Amorim, pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia – Imazon.

Larissa reforça que a intensificação do aquecimento global levará à ocorrência de eventos climáticos extremos que irão afetar a região. A pesquisadora cita as alterações no ciclo hidrológico, que influenciam o regime das chuvas, comprometendo o armazenamento de água e podendo causar crises energéticas.

Para combater e diminuir o desmatamento e seus efeitos, a pesquisadora diz ser preciso aumentar a fiscalização nas áreas mais críticas, embargar áreas que foram desmatadas ilegalmente e punir os responsáveis. Além disso, Larissa destaca que é preciso recuperar e reutilizar áreas já desmatadas. “Também é preciso destinar terras públicas que ainda não tiveram seu uso definido para a criação de áreas protegidas, como territórios indígenas e quilombolas ou unidades de conservação”, afirmou.

Segundo Larissa, a falta de fiscalização, junto com ações que buscam flexibilizar as leis ambientais, e a falta de políticas públicas destinadas à preservação ambiental dificultam o combate ao desmatamento e incentivam o desmatamento ilegal. “Sem o devido controle do desmatamento, teremos como consequência a perda da biodiversidade de fauna e de flora. Além da ameaça ao território de povos e comunidades tradicionais, como indígenas, ribeirinhas, quilombolas e extrativistas”, finalizou.  

Por Felipe Pinheiro.

 

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