Educador transforma 'indignação' em projeto para o Enem

O professor de português Roberto David Junior anunciou, em suas redes sociais, que daria aulas gratuitas para pessoas trans que desejam se preparar para o Enem

por Ruan Reis sab, 03/07/2021 - 13:37
Cortesia O professor de português Roberto David Junior Cortesia

Às vezes, basta um empurrãozinho e milhares de vidas podem ser modificadas, especialmente por meio da educação. Atitude que, no Brasil, pode mudar a realidade de muitos jovens vestibulandos da comunidade LGBTQI+ que precisam, diariamente, lutar contra o preconceito e a desigualdade social, principalmente a população transexual. De acordo com o Trans Murder Monitoring, o grupo é o mais afetado pelo preconceito e violência relacionados à identidade de gênero e à orientação sexual.

O Brasil, segundo os dados do observatório, é o país que mais mata transexuais no mundo há 12 anos consecutivos. Foi justamente incomodado com essa realidade que o professor de português Roberto David Junior, de 29 anos, do Rio de Janeiro, anunciou, em suas redes sociais, que daria aulas gratuitas para pessoas trans que desejam se preparar para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

"Eu vou dar aulas preparatórias para o Enem para pessoas trans. Eu estou puto e vou transformar meu ódio em iniciativa para melhorar a vida de pessoas socialmente vulneráveis. Você, pessoa trans, só entra em contato comigo", anunciou o docente em um post no Twitter que rendeu, rapidamente, diversas mensagens de estudantes transexuais interessados em assistir às aulas.

Ao LeiaJá, o professor revela que já vinha nutrindo há um tempo o desejo de colocar em prática sua ideia de ministrar aulas para pessoas trans que estivesse interessada em realizar o vestibular. O professor ainda conta que até procurou e entrou em contato com alguns amigos atrás de pessoas trans que estão precisando de uma força nos estudos, mas não obteve sucesso.

“A gota d'água foram os acontecimentos da semana passada. Eu li muitas notícias de violência contra pessoas LGBTQIA+, e o caso da Roberta, que foi queimada viva em Recife, chegou para mim como o estopim. Fiquei indignado, como diria o Gil do Vigor. Naquele momento, eu decidi escrever o tweet-decisão-desabafo, achando que só ia alcançar algumas poucas pessoas. Só que o resultado foi realmente assustador pra mim. Não sei se foi a revolta geral, se eu disse o que muitos queriam dizer, mas deu no que deu”, detalha.

Motivado pela vontade de fazer a diferença, Roberto comenta que está marcando entrevista com cada pessoa que entrou em contato com ele, no intuito de conhecer cada caso e ver o que pode ser feito especificamente por cada indivíduo. “Entre as entrevistas que eu já fiz e as que estão agendadas, temos um pouco mais de 50 pessoas trans que serão atendidas de alguma forma”, diz.

A ideia inicial do professor era formar apenas uma pequena turma, entretanto, com a repercussão do tweet, o projeto social está tomando novos rumos. “Já recebi mensagens falando sobre projeto, até sobre pré-vestibular, e confesso que isso me assustou. Nunca foi a minha intenção algo nessas dimensões. Eu provavelmente atenderei pessoas em mais de uma turma, mas não posso confirmar ainda quantas. Muitos profissionais também apareceram oferecendo suas aulas e até outros serviços e propostas, e eu já comecei a conversar com essas pessoas para ver como podemos ajudar cada caso”, revela.

As aulas ainda não começaram, mas devem ser ministradas em breve. O educador ensinará redação e as disciplinas que compõem a prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Na parte de produção textual, Roberto afirma que irá corrigir minuciosamente o texto de cada pessoa, apontando os pontos positivos da escrita e aquilo que precisa ser melhorado. Além de explicar a pontuação dada de acordo com as competências cobradas na redação. “É muito importante que cada pessoa entenda os critérios de avaliação, para saber em que será avaliada e de que forma. Não dá para o trabalho ser efetivo se for feito de forma diferente. Quero que seja um trabalho de qualidade mesmo, que vai ajudar de verdade”, explica.

O projeto social que pretende ajudar muitas pessoas trans tem recebido um feedback positivo dos internautas. O professor acredita que sua iniciativa é o mínimo que ele pode fazer para transformar realidades. “Eu acredito que a minha proposta ainda é pouco, sou só alguém que se posicionou tentando fazer alguma coisinha. Mas espero que esse pouco realmente inspire mais gente e que gere transformação para uma comunidade que precisa ter sua existência garantida e respeitada”, pensa Roberto. Quem deseja ajudar de alguma forma pode entrar em contato com o educador por meio do e-mail robertofdavidjr@gmail.com ou através do Instagram (prof.robertodavidjr).

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