Artistas trans são vetados em 'Paixão de Cristo' no Recife
A ONG Fábrica Fazendo Arte acusa a diretoria do espetáculo encenado no bairro de Casa Amarela, na Zona Norte da capital pernambucana, de transfobia
O coletivo ‘Fábrica Fazendo Arte’ está acusando a diretoria da ‘Paixão de Cristo de Casa Amarela’, espetáculo anual que acontece na Zona Norte do Recife (PE), de preconceito. Por meio de nota, divulgada no Facebook da organização na noite dessa quinta-feira (17), o coletivo afirmou que os organizadores do evento vetaram os artistas transexuais que fariam parte da peça.
De acordo com a organização sem fins lucrativos (ONG), eles foram convidados para dirigir e produzir o evento este ano, mas durante o processo, parte do elenco foi vetado do espetáculo pela direção, que alegou não querer se indispor com a Cúpula da Igreja Católica, justificando que o arcebispo de Recife e Olinda Dom Antônio Fernando Saburido, não aprovaria a participação de artistas transexuais no espetáculo.
O Fábrica Fazendo Arte também relatou que a direção deu a "opção" dos artistas trans participarem apenas da cena do Bacanal de Herodes "por ser um momento e espaço propício", no entanto, não poderiam divulgar que parte do elenco era transgênero. Descrevendo a situação como absurda, a ONG deixou a produção do espetáculo.
Procurado pela equipe do LeiaJá, o diretor geral e fundador da Paixão de Cristo de Casa Amarela, José Muniz, afirmou que as acusações são falsas, que ele luta pelas minorias e que nenhum artista foi vetado do espetáculo.
"Em nenhum momento convidamos a Fábrica Fazendo Arte para fazer parte da Paixão de Cristo de Casa Amarela, convidamos somente o diretor, que isso fique claro", disse.
Segundo José Muniz, o que aconteceu foi uma divergência de opinião na colocação dos artistas e ao questionar ao diretor da Fábrica Fazendo Arte onde o elenco iria se posicionar, o diretor não quis dar a informação.
Confira nota do Fábrica Fazendo Arte na íntegra:
"O Fábrica Fazendo Arte há 19 anos desempenha um trabalho árduo com o compromisso dos direitos humanos, arte e cidadania.
Estávamos a frente este ano da Paixão de Cristo de Casa Amarela na direção e produção do espetáculo a convite da diretoria da mesma. Iniciamos as atividades e oficinas oferecidas por jovens, artistas e multiplicadores de direitos humanos integrantes do Fábrica, onde este ano seria a Paixão da inclusão fizemos articulação com o programa ATITUDE, a AMOTRANS e o Movimento de População em Situação de Rua de Recife para que este evento cultural-religioso que é feito do povo para o povo fosse executado pela diversidade que o Recife tem, onde RESPEITAMOS a dramaturgia escrita pelo saudoso e militante das causas sociais e dos Direitos Humanos Dom Helder Câmara.
Ficamos surpresos que durante o processo de construção do espetáculo que estava sendo feito por nós fomos questionados e obrigados a censurar uma parcela de componentes do evento, componentes estes TRANS que foram convidados por nós do Fábrica Fazendo Arte a partir de uma parceria nossa com a AMOTRANS, onde não iriam poder participar ou então nos disseram que eles e elas poderiam participar apenas do Bacanal de Herodes "por ser um momento e espaço propício" e que também não poderíamos divulgar que teria pessoas trans na Paixão de Cristo de Casa Amarela para que não houvesse problemas com a Cúpula da Igreja Católica, pois foi justificado que o Arcebispo de Olinda e Recife que assiste esta paixão todos os anos não iria aprovar a participação de TRANSEXUAIS e TRAVESTIS na unica Paixão de Cristo que ele assiste todos os anos.
Diante deste absurdo nós voluntários, integrantes, padrinhos, amigos e simpatizantes do Fábrica Fazendo Arte não corroboramos com este ato inaceitável, inescrupuloso, inadmissível, preconceituoso, desumano, medíocre e tantos outros adjetivos que rasgam nossa garganta, por tanto viemos comunicar nossa saída deste processo.
Num país que mais mata transexuais e travestis no mundo, invisibilizar identidades é fortalecer a cultura do ódio e por consequência contribuir com as estatísticas de morte desta população.
Repudiamos veementemente qualquer tipo de exclusão, segregação social e descriminação, estaremos firme com nossas vozes e lutas ocupando espaços onde temos direito.
A equipe composta por Direção Geral - Jefferson Vitorino, Kleiton Barros; Direção Artística - Lucrécia Forcione; Produção - Pricila Freitas, Rodrigo Gomes, Gigi Abagagerry, Rodolfo Lima, Natália Florêncio; Cenógrafo - Dida Did'Ats; Coreografa - Nayna Valentin; Preparadora vocal e Maquiadora - Andreza Cavalcanti; Design - Rodrigo Alves e Diretoria do Projeto Fábrica Fazendo Arte esta a disposição para qualquer dúvida ou esclarecimento sobre o fato ocorrido no processo.
E assim dizemos que isto tudo só nos fortalece e faz com que a gente cresça e reafirmamos que: NINGUÉM SOLTA A MÃO DE NINGUÉM!"