SC: governador vai do 'céu ao inferno' em menos de 2 anos
Nesta quarta-feira, a Assembleia e o Tribunal de Justiça do Estado vão definir os cinco representantes de cada Casa que farão parte da comissão que vai julgar o processo de Moisés
Em um ano e nove meses, o governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), foi do céu ao inferno. Novato na política, o ex-bombeiro militar surfou na onda da negação da política e se elegeu com 71% dos votos no segundo turno de 2018. Rompeu um ciclo político de décadas no Estado e seu partido, o mesmo que elegeu o presidente Jair Bolsonaro, fez seis cadeiras na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc).
Com a segunda maior bancada no primeiro ano de governo, conquistou maioria no Parlamento e chegou a ter apoio de 28 dos 40 deputados. Mas o rompimento com o bolsonarismo, uma queda de braço com a Assembleia por causa de impostos a agrotóxicos, falta de articulação e denúncias de fraudes no combate à pandemia do novo coronavírus levaram ele a um processo de impeachment. Nesta quarta-feira (23), a Assembleia e o Tribunal de Justiça do Estado vão definir os cinco representantes de cada Casa que farão parte da comissão que vai julgar o processo de Moisés.
Após estabelecida, a comissão de deputados e desembargadores tem até 10 dias para analisar a denúncia contra o governador e vice, Daniela Reinehr. Se a acusação for aceita, os dois serão afastados por 180 dias. Este tribunal tem até seis meses para julgar a denúncia de crime de responsabilidade. O processo foi aberto em 22 de julho, e nele o governador e a vice são denunciados por terem reajustado o salário dos procuradores do Estado sem aprovação dos deputados.
A líder do governo na Alesc, Paulinha (PDT), reconhece que faltou diálogo com deputados. "Quando assumi a liderança do governo (em fevereiro deste ano), essa situação já estava bastante desgastada, muitos deputados sequer tinham contato com o governador."
O rompimento com o bolsonarismo começou ainda no primeiro ano de governo. Em junho de 2019, em entrevista ao Estadão, Moisés alfinetou Bolsonaro e disse que o presidente deveria "se preocupar com coisas mais importantes". Àquela altura, a sigla enfrentava um racha nacional com a polarização entre Bolsonaro e Luciano Bivar, presidente nacional do partido.
Moisés tentou se descolar do presidente. A atitude não só o distanciou de Brasília como também da sua própria base local, vendo, aos poucos, seus correligionários do PSL na Assembleia se tornarem os mais aguerridos opositores de sua gestão. Em março, já em meio à pandemia, Moisés gravou vídeo e criticou o posicionamento do presidente, contrário ao isolamento social. Em resposta, Bolsonaro declarou, também em vídeo: "Esse Carlos Moisés se elegeu com meu nome".
O descolamento do bolsonarismo também afastou o governador da vice Daniela Reinehr, que deixou o PSL para se tornar uma espécie de embaixadora do Aliança pelo Brasil - partido que os Bolsonaro tentam tirar do papel - em Santa Catarina. Os dois trocaram críticas pelas redes sociais e Daniela reclamou que seus posicionamentos não estavam sendo levados em consideração no combate à pandemia.
Rompida com Moisés, a vice-governadora foi buscar em Brasília apoio para sustentar sua defesa no impeachment. Desde então, conta com apoio da advogada Karina Kufa, que já atuou na defesa do presidente, para tentar se desvencilhar do caso envolvendo ela no reajuste dos procuradores. Segundo a denúncia, no curto período em que esteve como governadora interina, entre 6 e 17 de janeiro, Daniela deu encaminhamento ao procedimento administrativo que garantiu aumento no salário dos procuradores.
Outro atrito com os parlamentares foi o anúncio do fim dos incentivos fiscais para o setor de defensivos agrícolas, também em 2019. A pauta se arrastou até que, em 11 de março, os deputados lotaram as dependências da Assembleia com agricultores vindos de todas as regiões, contrários ao governo. Nenhum parlamentar, agricultor ou liderança saiu em defesa de Moisés. A audiência foi noticiada pela Agência Alesc como a maior já realizada no Parlamento.
"Eu acredito que esse foi um ponto que pesou. Acho que fui uma das primeiras a falar que ele não poderia se denominar um czar: 'Eu decido tudo, só por decreto'", disse Luciane Carminatti (PT), que logo após a aprovação do impeachment aderiu à campanha do PT que pede eleições diretas independentemente do prazo de cassação do governador e vice.