Crise faz renda do brasileiro cair 16% em cinco anos

Trabalhadores das áreas de alimentação, hospedagem, construção e transporte foram os mais afetados

por Nataly Simões qui, 27/06/2019 - 15:21

A crise econômica que afetou o país nos últimos anos não só fechou vagas de emprego como também comprometeu o rendimento dos trabalhadores de cinco dos nove setores da iniciativa privada analisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A queda real, considerando a inflação, ultrapassou a média de 16% em cinco anos.

Entre o primeiro trimestre de 2014 e o primeiro de 2019, os trabalhadores do segmento de alimentação e hospedagem e da construção e do transporte foram os que tiveram as maiores perdas reais na renda mensal, de 7,2% a 16,3%.

De acordo com o economista Guilherme Pappi, a redução de 4 milhões de brasileiros no mercado formal explica a razão de os profissionais dessas áreas terem sido os mais afetados pela queda no rendimento.

Isso porque, conforme apontam dados do IBGE, em 2014, quase 37 milhões de brasileiros trabalhavam com carteira assinada. Já 2018 terminou com pouco menos de 33 milhões. "A formalidade é responsável por mais estabilidade no trabalho, o que proporciona um efeito psicológico no indivíduo de se programar para compras parceladas de médio ou longo prazo, o que beneficia toda cadeia produtiva gradativamente", explica Pappi.

Ele acrescenta que "a menor atividade econômica tem influência direta sobre volume de hospedagens, seja para turismo ou para negócios ou mesmo para os transportes de cargas e de passageiros, afetando a qualidade desses empregos. A alimentação também está relacionada à renda e à formalidade, uma vez que mais empresas fornecendo vale refeição aos funcionários impacta em uma demanda firme no comércio das cidades. E a construção civil necessita de estabilidade, uma vez que são compras em sua grande maioria de médio a longo prazo".

Números em alta

Somente os trabalhadores da agricultura apresentaram aumento real no rendimento habitual, de 5,2%. Para o economista, isso se deve ao fato de o setor ter apresentado nos últimos anos crescimento notório acima dos demais segmentos da economia do país. "A carne bovina brasileira, além de ser estratégica para a cadeia e para a economia doméstica, é de extrema importância para a segurança alimentar mundial. Este setor é prioritariamente exportador e o Brasil bate recordes de exportação no agronegócio, mantendo ou crescendo a renda dos trabalhadores dessa área", comenta.

Já os trabalhadores do setor público tiveram um ganho real ainda maior, de 7,5% por mês. Pappi lembra que os gastos públicos com funcionalismo tiveram um forte incremento no decorrer da gestão Lula e Dilma. "Por muitos anos os gastos do governo ajudaram a impulsionar a economia pela via da demanda, mas ao mesmo tempo gerou impactos inflacionários. O setor público é prioritariamente formal e estável", pondera.

Foto: José Cruz / Agência Brasil

Com o alto índice de desemprego, que, ainda segundo o IBGE, atinge 13,4 milhões de brasileiros, muitos trabalhadores caíram no mercado informal. Pappi afirma que a informalidade tem tudo a ver com a diminuição no rendimento dos trabalhadores, não apenas por receberem salários diretos menores e perderem benefícios, mas por criar um ambiente econômico com menor demanda agregada, prejudicando a vitalidade econômica do país.

"Portanto, mesmo como profissionais liberais donos de seus pequenos negócios haverá uma crescente escassez de clientes e estes com renda cada vez menor que acaba afetando todo o conjunto da economia, alguns com maior outros com menor velocidade", avalia o economista.

Volta ao setor financeiro

Comparada aos demais setores da economia, a lucratividade do setor bancário é historicamente a mais elevada. Nos últimos cinco anos o rendimento mensal dos trabalhadores da área financeira não foi negativo como o de outras áreas, com alta na remuneração média mensal de R$ 3.238 para R$ 3.245. Contudo, profissionais do setor também perderam seus postos de trabalho no período e, consequentemente, tiveram queda significativa na renda. É o caso da bancária Juliana Pelloso, 44 anos, que trabalhou mais de vinte anos na área financeira e em 2017 perdeu o emprego em decorrência da recessão. Ela também recorreu ao mercado informou, mas agora conseguiu retornar ao setor financeiro por meio dos bancos digitais.

"Meu marido tem uma pequena empresa de serviços automotivos e por causa da crise ele também teve que deslocar alguns funcionários, inclusive da área financeira. Então, durante um ano, com a minha experiência como gerente de banco, eu o ajudei no que ele precisava. Agora, no começo do ano, eu recebi a proposta de um banco digital, mas minha renda ainda é menor do que em bancos tradicionais", relata.

Juliana conta que antes da recessão conseguia ganhar mensalmente R$ 10 mil e que hoje sua renda caiu para R$ 6 mil, 40% a menos. No entanto, quando conseguir firmar uma carteira de clientes que buscam por serviços financeiros online, sua expectativa é de que seu rendimento volte a ser maior.

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