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Localizado no coração do centro do Recife, o quase centenário Hotel Central, inaugurado em 1928, guarda lembranças de hóspedes lendários que por lá passaram. Nomes como o ex-presidente da República Getúlio Vargas, a cantora Carmem Miranda e o rei Roberto Carlos já se hospedaram por lá, alguns desses até mais de uma vez, fazendo do hotel sua ‘morada’ temporária na capital pernambucana.

No entanto, de todas as histórias que já passaram pelo Central a mais emblemática de todas talvez seja a de uma mulher que nunca se hospedou lá, mas cuja vida se confunde com a própria existência do suntuoso empreendimento: a chef de cozinha Rosa Maria Nascimento, 55 anos, proprietária do restaurante Tempero da Rosa, aberto no hotel em 2016 e que desde o início da pandemia do novo coronavírus vem garantindo as operações do lugar.

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Dona Rosa era ainda muito “miúda” quando começou a frequentar o Hotel Central. Ela vinha do sítio onde morava com a família no bairro do Fragoso, bairro de Olinda, com sua mãe, camareira do hotel à época, para acompanhá-la durante os dias de trabalho. A chef de cozinha conta, em entrevista ao LeiaJá, que tinha muitos irmãos e que “a vida era difícil”. Por isso, ela sempre teve o desejo de trabalhar para ajudar a família, mas nunca poderia imaginar que seu destino profissional estaria naquele prédio de cor salmão no qual ela passava os dias à espera da mãe.

Com o desejo de melhorar de vida, Rosa começou a trabalhar cedo. Aos 18 anos,  conquistou o primeiro trabalho com carteira assinada, no Hotel Central, como camareira, assim como a mãe. A paixão pela culinária, porém, falou mais alto, e rapidamente, Dona Rosa passou a trabalhar na cozinha do lugar. Antes disso, ela percorreu muito as ruas de Olinda e do Recife vendendo  os alimentos cultivados no sítio da família, como macaxeira e manga.

Durante esse período, nas vias da capital pernambucana, além de levantar algum dinheiro com as vendas, a então menina também cultivava sonhos e encantamento, diante da beleza e do movimento que a cidade ostentava. “Quando eu vinha pra cá, eu tava doida pra ficar na rua. A rua pra mim era isso aqui. O caminho da gente sempre foi esse aqui e eu via isso aqui muito movimentado, hoje em dia é muito triste”, diz mencionando a área onde o hotel está localizado, no bairro da Boa Vista.

O lamento de Dona Rosa refere-se ao pouco movimento encontrado hoje na região principalmente no período da noite. O pouco fluxo no local, inclusive, piorou após a pandemia, que além de ter colocado a população em quarentena em casa, também apertou a economia local e obrigou muitos comércios a fecharem as portas. O próprio Central sentiu gravemente a crise, e só não fechou suas portas pelo esforço da chef e da sua equipe de 17 pessoas. 

Ao descobrir que os arrendatários do local iriam fechar suas portas em junho de 2020, ela não teve dúvidas, assumiu o empreendimento para salvaguardar o seu trabalho de tantos anos e, claro, parte da história do próprio Recife.“‘Reinventar’ é a melhor palavra pra definir o que a gente passou nessa pandemia e o que inventamos pra conseguir manter esse hotel em pé. A gente não tinha recursos, tínhamos braços, trabalho e contamos com os funcionários que nos seguiram nessa empreitada, com muito esforço e união”, diz mostrando muita gratidão aos fiéis escudeiros que a acompanham. 

A salvação para o Tempero da Rosa e para o Central durante a crise sanitária veio, primeiramente, do serviço de delivery. O restaurante oferece almoço com ênfase na comida regional, com pratos como peixe ao molho de coco, feijoada e bode. Tudo feito sob os cuidados de Dona Rosa, além  dos saberes que ela herdou do pai, cozinheiro nato. “Eu cozinho muito com raiz, com especiarias, porque eu aprendi assim desde pequena. É uma comida de raiz, um tempero bem feito, uma comida bem feita, feita com amor, uma comida feita com respeito principalmente. É outro tempero”.

Agora, com o relaxamento dos protocolos de segurança, ela e a filha que a ajuda a manter o lugar de pé - e que prefere manter-se ‘anônima’ nos bastidores -, começam a retomar outros projetos. O primeiro é o Rosa com Vida, que se propõe a movimentar o espaço promovendo cultura e diversão. A ideia é ocupar o hotel com pequenos shows para dar oportunidade aos artistas locais e agitar a vida cultural da cidade. 

Em sua primeira noite, na última sexta (10), o chorinho deu o tom e encheu a sala do Central de música e esperança, com o show do grupo Samba de Varanda e discotecagem de Rogerman, músico olindense, líder da banda Bonsucesso Samba Clube, para um pequeno público e 50 pessoas. Tudo dentro das normas de segurança necessárias. Com o projeto, a gente vai trazer garçons, copeiros, auxiliares de limpeza, artistas, então, a gente vai gerar uma cadeia de empregos e de ajuda pra todos. Porque quando você pensa só em você, não vale a pena. Ninguém leva nada daqui, não vale a pena porque tudo vai embora, tudo fica aí, a única coisa que você leva é o que você faz de bondade pro seu irmão.”

A preocupação de Dona Rosa, contudo, não é voltada somente às pessoas. Ela também quer mudar o cenário da cidade que tanto ama, o Recife, e voltar a ver o hotel Central figurar como no passado, quando era ponto de encontro da sociedade e referência na capital pernambucana: “Sou recifense de coração, de corpo e alma. Recife pra mim é o meu país. A gente tem atrativos aqui maravilhosos, esperamos que as pessoas venham conhecer o centro, a Boa Vista boêmia que eu conheci, o Tempero da Rosa aqui no Hotel Central e saber o que é bom. Eu quero isso aqui vivo; que isso respire arte, gente, saúde, que respire povo aqui dentro”. 

Em tempo

O projeto Rosa com Vida foi pensado para durar por seis meses, culminando no Carnaval de 2022. Até lá, na segunda sexta-feira de todo mês, o Hotel Central vai receber um pequeno público para noites de música, petiscos e bebidas. No encerramento, Dona Rosa planeja fechar a programação com muito frevo, “celebrando a vida” e, como ela e sua equipe esperam, com o êxito da iniciativa.”Num futuro bem próximo eu espero que todo mundo esteja vacinado e que a gente tenha carnaval pra poder se firmar. (Quero) contratar muita gente, que esse hotel fique cheio, que esse restaurante bombe, que a gente tenha muito trabalho para todos, que nosso país se recupere, e que o Rosa com Vida se ‘avoe’ e dê muito que falar.”

Serviço 

Tempero da Rosa

Segunda a sábado - 7h às 15h

Domingos - 7h às 10h

Av Manoel Borba, 209 - Boa Vista

Delivery - 9.8533.7384 ou 30397733

Fotos: Arthur Souza/LeiaJáImagens


 

 

 

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