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Alvo de críticas e polêmica, a estratégia planejada para permitir a reeleição dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em fevereiro de 2021, é prática adotada há décadas na maioria das Assembleias Legislativas do País. Enquanto Alcolumbre teve até mesmo conversas reservadas com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em busca de alternativas, deputados estaduais já alteraram leis, regimentos e, nos últimos anos, conseguiram brechas para se "eternizar" no poder.

O cenário de longevidade nas Assembleias foi usado como um dos argumentos da cúpula do Senado para pedir aval do Supremo ao projeto de reeleição de Alcolumbre. Além disso, aliados do senador coletam assinaturas para a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), mas o Centrão promete enterrar qualquer iniciativa nesse sentido na Câmara.

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O caso mais emblemático de perpetuação no cargo está no Piauí, onde o deputado Themístocles Filho (MDB) sentou na cadeira de presidente da Assembleia em 2005 e de lá nunca mais saiu. Está há 15 anos no comando do Legislativo estadual e já venceu oito eleições consecutivas para o posto. Político tradicional da região, ele é autorizado pelo regimento da Casa a se reeleger quantas vezes quiser.

À frente da Assembleia do Piauí, Themístocles Filho praticamente não tem oposição. Na última disputa para a Mesa Diretora, conseguiu 28 dos 30 votos. "Se os parlamentares a nível federal, no Senado ou na Câmara, assim também desejarem, eles poderão fazer (a reeleição). É uma questão interna", disse o deputado ao Estadão.

Embora a Constituição proíba a recondução para o comando da Câmara e do Senado na mesma legislatura, 21 dos 26 Estados, além do Distrito Federal, encontraram brechas e lacunas para permitir a reeleição de presidentes das Assembleias no período que abrange os quatro anos de mandato. O levantamento foi feito pelo professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) Daniel Falcão, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Em alguns casos, a possibilidade apareceu nas Constituições estaduais e, em outros, em regimentos internos das Casas, dependendo apenas de aprovação dos próprios parlamentares.

No Piauí, Themístocles Filho tem uma fórmula pronta para conseguir a permanência no poder por tanto tempo: procura sempre contemplar interesses tanto do governo quanto da oposição. O controle da pauta e das principais políticas do Estado ficou ainda mais evidente durante a pandemia do novo coronavírus.

Em abril, por exemplo, a Assembleia do Piauí deu sinal verde para o governo se endividar e contratar empréstimos que ultrapassam R$ 1 bilhão. O financiamento foi destinado não só a ações de saúde, mas também a obras de infraestrutura, ou seja, demandas anteriores ao período da crise.

 

Jogo

Está nas mãos de Themístocles pautar projetos de interesse do Executivo e também fiscalizar os gastos do Estado. "O presidente da Casa é muito poderoso e consegue organizar bem o jogo político dentro da Assembleia", afirmou o cientista político Vítor de Sandes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI). "Mas, em termos democráticos, não é o melhor modelo. A democracia implica em competição e mais disputa, com uma pluralidade de visões, ainda que a continuidade possa existir", ressalvou.

Situação semelhante ocorre em Pernambuco. Guilherme Uchoa (PSC) presidiu a Assembleia local por 11 anos, até 2018, quando morreu, vítima de uma pneumonia. A hegemonia do político no Legislativo pernambucano começou em 2006 e, a partir daí, ele articulou sucessivas mudanças na Constituição para se manter no poder.

Em 2011, uma alteração proibiu a recondução para um terceiro mandato, proposta classificada como "antídoto ao fenômeno Uchoa". Ex-juiz e fortemente ligado às lideranças locais, porém, Uchoa conseguiu aval do Judiciário para seguir como presidente.

No Paraná, o deputado estadual Ademar Traiano (PSDB) dá sinais de que quer trilhar o mesmo caminho. Em 10 de agosto, ele foi reeleito para o quarto mandato consecutivo na direção da Assembleia, rumo à marca de oito anos no comando da Casa.

Com receio de que o tucano não desocupe a cadeira tão cedo, a oposição pressiona os colegas a mudar o regimento e proibir a reeleição. "Não dá para ficar assim. Vai ser sempre o mesmo presidente? Não vivemos uma experiência de renovação e a alternância é muito importante", argumentou o deputado Professor Lemos (PT), líder da oposição, que prepara projeto para barrar a recondução à presidência da Assembleia paranaense.

O alinhamento ao governador de plantão, seja ele de qual partido for - para negociar a distribuição de recursos a redutos eleitorais - é comum entre políticos que se perpetuam nos cargos.

"O grande problema é que o presidente da Assembleia acaba agindo como um líder do governo e demonstrando que liga o rolo compressor. Tratora a oposição porque tem poder de agenda, da pauta do dia", observou o cientista político Leon Victor de Queiroz, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). 

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu hoje (8), por 6 votos a 5, que as assembleias legislativas dos estados têm o poder para revogar a prisão de deputados estaduais, expandindo a estes as imunidades previstas para parlamentares federais no artigo 53 da Constituição.   

Os ministros negaram uma liminar (decisão provisória) pedida pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para suspender normas aprovadas pelas assembleias de Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Mato Grosso que permitem a revogação de prisões de seus membros, salvo em casos de flagrante de crimes inafiançáveis.

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Também ficou permitido às assembleias sustar ações penais abertas contra deputados estaduais.

O julgamento sobre o assunto foi retomado nesta quarta-feira após ter sido suspenso, em dezembro de 2017, devido à ausência dos ministros Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski. Na ocasião, o placar ficou em 5 a 4 contra a possibilidade de revogação da prisão de deputados estaduais pelas assembleias.

Uma reviravolta nesta quarta levou ao resultado que estendeu aos deputados estaduais as imunidades de parlamentares federais. O presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, último a votar, decidiu mudar seu voto anterior, proferido em 2017. 

Antes, Toffoli havia sido o único a votar a favor de uma diferenciação, permitindo às Assembleias suspender ações penais contra seus membros, mas impedindo a revogação de prisões. Hoje, ele votou no sentido de permitir aos legislativos locais também a prerrogativa de soltar deputados estaduais presos por ordem judicial. 

“Esse [meu] voto restou isolado. Eu não vou insistir na minha posição. Na medida em que há 10 colegas que não entendem diferenciação, eu me curvo àquilo que entendo estar na Constituição que é a imunidade da prisão, a não ser em flagrante", disse Toffoli, nesta quarta, ao mudar seu voto.

Além de Toffoli, votaram por autorizar as assembleias a suspender prisões os ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello.

Ficaram vencidos o relator, ministro Edson Fachin, e os ministros Luiz Fux, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso, que votou contra dar a autorização às assembleias.

Para Barroso, permitir às assembleias revogar prisões pode transformar “o Poder Legislativo em um reduto de marginais, o que evidentemente ninguém deseja, nem os parlamentares honestos e de bem que ali estão”.

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