Conhecendo o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies)

Daniel Cavalcante Silva, | qui, 25/10/2012 - 10:48
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Recentemente, o Governo Federal aprovou o chamado Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies), instituído por meio da Lei nº 12.688, de 18 de julho de 2012, cujo escopo visa assegurar condições para a continuidade das atividades de entidades mantenedoras de ensino superior com dificuldades financeiras.

O programa, que poderia ser considerado como uma importante política pública estatal, é implementado por meio de institutos de Direito Tributário, tais como a moratória e o parcelamento tributário (modalidades de suspensão da exigibilidade da obrigação tributária), ambos imiscuídos na conceituação do chamado “plano de recuperação tributária”, cujo conteúdo se afigura como vanguarda na legislação tributária.

O Proies se inicia por intermédio da conjugação dos três institutos tributários: aprovação de um plano de recuperação tributária, concessão de moratória de débitos tributários federais e parcelamento de débito em até 180 meses, com a possibilidade de quitação de até 90% destas parcelas por meio da concessão de bolsas de estudo.

Dentro desse contexto, o programa apresenta objetivos claros e perseguidos ao longo de todo texto legal, quais sejam: viabilizar a manutenção dos níveis de matrículas ativas de alunos; exigir das entidades qualidade no ensino de acordo com resultados positivos das avaliações usadas pelo Ministério da Educação (MEC); possibilitar a recuperação dos créditos tributários da União; e, ampliar a oferta de bolsas de estudo integrais para estudantes de cursos graduação.

O Proies é um programa que pode ser atrativo para a entidade que esteja em dificuldades financeiras, mas, ao mesmo tempo, bastante restrito e com sérias implicações para a instituição que aderir ao parcelamento, haja vista que as consequências da sua saída após adesão de forma voluntária e ou involuntária são nefastas.

Em que pesem as peculiaridades do Proies, resta patente que o mesmo se afigura como um ambicioso e sofisticado programa governamental, haja vista que transita por alguns institutos do direito tributário e implementa um projeto de recuperação tributária muito semelhante aos processo de recuperação judicial. Além do mais, o projeto enceta providências que imbricam o direito tributário e o direito educacional relacionado aos atos regulatórios da educação superior, fazendo com que o desiderato de recuperação financeira da instituição coincida com a melhoria dos seus indicadores educacionais, aferidos por meio de periódicas avaliações feitas pelo Ministério da Educação.

A implementação do Proies se inicia por meio do chamado plano de recuperação tributária, o qual é elemento objetivo e essencial para a adesão e manutenção da entidade no programa, nos termos do art. 4° da Lei nº 12.688, de 18 de julho de 2012 [1]. Em que pese a referida legislação ser de natureza predominantemente tributária e com certos aspectos educacional, o legislador utiliza-se a todo momento de conceitos oriundos do direito empresarial.

O Proies, ao propor o plano de recuperação tributária, propõe igualmente um projeto de recuperação extrajudicial fiscalizado diretamente pelo poder público, ou seja, é um plano inovador sob o ponto de vista também do direito empresarial.

Dentro desse cenário, com foco na preocupação do crescente do passivo tributário das Instituições de Ensino Superior (IES), considerando que em face da natureza jurídica de tais instituições (grande parte associação ou fundação) e consciente da extrema regulação que tais entidades sofrem, o Governo Federal teve o mérito de encontrar uma forma de estas entidades terem legalmente uma forma de recuperação administrativa e em combinação com seu órgão regulador, o Ministério da Educação.

Ressalte-se que o plano de recuperação tributária implica necessariamente em uma análise minudente sobre cada curso, vagas a serem oferecidas, análise de custos, cortes e investimentos que serão necessários em função de reconhecimento ou renovação de reconhecimento de curso, ou mesmo de recredenciamento da Instituição em função do que estabelece a Lei do SINAES. Importante ressaltar que este plano terá como base a situação econômico-financeira e regulatória, inclusive considerando que será ou serão objeto(s) objeto de oferta de vagas somente  o( s) curso(s) da instituição com conceito(s) positivo(s).

A proposta de repactuação de débitos tributários, prevista pela Lei nº 12.688, de 2012, envolve a possibilidade de significativos benefícios, como também restrições. Não obstante, tais vantagens só poderão ser gozadas por entidades que cumprirem as rígidas prerrogativas estabelecidas pelo diploma, dentre elas o cumprimento de plano de recuperação tributária.

A Instituição de Educação Superior (IES) que aderir ao Proies terá o direito à concessão de moratória das dívidas tributárias federais vencidas até 31 de Maio de 2012, em observância ao art.155 do Código Tributário Nacional[2]. Como é cediço, o CTN estabelece que a moratória é uma das modalidade de suspensão do crédito tributário[3], sendo compreendida como um benefício dado pelo credor ao devedor consistente na dilação ou prorrogação do prazo de vencimento da obrigação tributária.

Insta enfatizar que a legislação permite a inclusão no Proies de todas as dívidas tributárias federais da mantenedora da IES, na condição de contribuinte ou responsável, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, vencidas até 31 de maio de 2012. Desta forma, todo tipo de tributo federal, incluindo impostos e contribuições, poderão ser repactuados. Não obstante, tendo em vista o âmbito exclusivo da PGFN, não será possível a inclusão de débitos oriundos do Tribunal de Contas da União (TCU).

O Proies se afigura como um programa inovador sob o ponto de vista legal porque restringe a sua adesão somente às entidades de ensino superior em grave situação econômico-financeira. Sob esse aspecto, dada a amplitude daquilo que poderia ser considerado como “grave situação econômico-financeira”, ao contrário da sistemática adotada pela Lei de Recuperação Judicial, o Proies estabelece um mecanismo inovador para parametrizar aquilo que seria preconizado como “grave situação econômico-financeira”.

A fórmula encontrada pelo legislador para a definição desta gravidade está na divisão do montante integral das dívidas tributárias federais vencidas até 31/05/2012 pelo número de alunos matriculados nas IES vinculadas à mantenedora, de acordo com os dados disponíveis do Censo da Educação Superior em 31/05/2012. Caso esta operação resulte em valor igual ou superior a R$ 1.500,00, a entidade estará em grave situação econômico-financeira e apta a aderir ao Proies[4].

Dentro desse cenário, a legislação prevê que o cálculo deverá levar em consideração o montante de dívidas tributárias vencidas, inscritas ou não em dívida ativa, ajuizadas ou não e com exigibilidade suspensas ou não. O cálculo para verificar aquilo que a lei considera como “grave situação econômico-financeira” é razoavelmente simples de ser efetuado.

No que tange à adesão ao programa, além dos documentos de praxe e do plano de recuperação tributária, devidamente analisado, importante ressaltar que o pedido de adesão ao Proies demandará a apresentação de vasta documentação financeira envolvendo não só a entidade como de seus representantes. Tal exigência denota um potencial interesse em futuros redirecionamentos de cobranças para os gestores da entidade em caso de exclusão do parcelamento.

Não restam dúvidas que, dependendo da gravidade da situação econômico-financeira da Instituição de Ensino Superior, esta pode ser uma excelente oportunidade para repactuação dos débitos tributários federais vencidos até 31/05/2012, já que além da moratória de doze meses, será possível a quitação dos tributos mediante o oferecimento de bolsas de estudo previstas no programa, de forma que apenas 10% das parcelas mensais precisariam ser quitadas em moeda corrente.

Por outro lado, o Proies não deve ser encarado como um novo parcelamento extraordinário, assim como o Refiz ou Paes, já que as condições de adesão e manutenção no programa são extremamente restritas e a exclusão da mantenedora deste parcelamento resultará, virtualmente, na inviabilidade de sua operação na medida em que a penalidade prevista para o descumprimento do programa é o descredenciamento da IES.

Por essa razão, o programa deve ser analisado com extrema cautela antes de sua adesão, pois trata-se de uma opção que pode mudar o destino de uma Instituição de Educação Superior, motivo pelo qual recomenda-se a contratação de profissionais e auditorias capacitadas, já que é fundamental a elaboração de um plano de recuperação tributária fidedigno e apto a ser cumprido.

Para isso, é necessário um estudo profundo das condições financeiras da entidade, certificando o atendimento de todos os pré-requisitos de adesão e da viabilidade de autofinanciamento e manutenção dos índices educacionais ao longo de toda a repactuação. Ademais, é importante que seja analisada a situação regulatória da Instituição e considerar que em caso de não preenchimento de vagas em bolsas Proies, o pagamento do percentual não preenchido deverá ser feito em moeda corrente.

Por fim, insta reconhecer que o programa é deveras inovador, pois congrega importantes institutos de direito tributário em uma só legislação, além de igualmente mesclar regras de dois ramos do direito: tributário e educacional. Com efeito, o Proies propõe a concepção de um novo caminho jurídico que será construído em uma perspectiva interdisciplinar e inovadora, caminho este até então desconhecido na legislação pátria.

 

 



[1]. Art. 4o  O Proies será implementado por meio da aprovação de plano de recuperação tributária e da concessão de moratória de dívidas tributárias federais, nos termos dos arts. 152 a 155-A da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966, em benefício das entidades de que trata o art. 3o que estejam em grave situação econômico-financeira.

[2]. Art. 155. A concessão da moratória em caráter individual não gera direito adquirido e será revogado de ofício, sempre que se apure que o beneficiado não satisfazia ou deixou de satisfazer as condições ou não cumprira ou deixou de cumprir os requisitos para a concessão do favor, cobrando-se o crédito acrescido de juros de mora:

I - com imposição da penalidade cabível, nos casos de dolo ou simulação do beneficiado, ou de terceiro em benefício daquele;

II - sem imposição de penalidade, nos demais casos.

Parágrafo único. No caso do inciso I deste artigo, o tempo decorrido entre a concessão da moratória e sua revogação não se computa para efeito da prescrição do direito à cobrança do crédito; no caso do inciso II deste artigo, a revogação só pode ocorrer antes de prescrito o referido direito.

[3]. Art. 151, inciso II, do CTN.

[4]. Lei n.° 12.688, de 18 de julho de 2012.

Art. 4°.

...

Parágrafo único.  Considera-se em estado de grave situação econômico-financeira a mantenedora de IES que, em 31 de maio de 2012, apresentava montante de dívidas tributárias federais vencidas que, dividido pelo número de matrículas total, resulte em valor igual ou superior a R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), observadas as seguintes regras: 

I - o montante de dívidas tributárias federais vencidas engloba as inscritas ou não em Dívida Ativa da União (DAU), as ajuizadas ou não e as com exigibilidade suspensa ou não, em 31 de maio de 2012; e 

II - o número de matrículas total da mantenedora corresponderá ao número de alunos matriculados nas IES vinculadas à mantenedora, de acordo com os dados disponíveis do Censo da Educação Superior, em 31 de maio de 2012. 

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