O canto de alerta de Gonzagão

Daniel Coelho, | ter, 16/04/2013 - 13:48
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No já distante 1947, 66 anos atrás, o gênio pernambucano Luiz Gonzaga compôs, em parceria com o cearense Humberto Teixeira, um dos mais tristes e belos lamentos da música brasileira: Asa Branca. A canção, entoada lentamente no ritmo que Gonzagão popularizou mundo afora – o baião –, poderia ser apenas (como se fosse pouco) o retrato de uma época de sofrimento e judiação para o sertanejo, fruto da aridez de um clima que maltratava milhões de pessoas no Nordeste. Poderia, mas não é.

Asa Branca, ouvida nos dias atuais, soa como um recado, um aviso muito bem dado por quem conhece de perto a realidade da seca. E que foi solenemente ignorado ao longo dessas quase sete décadas. Basta ler/ouvir/sentir alguns de seus versos para perceber isto:

“Quando olhei a terra ardendo

Qual fogueira de São João

Eu perguntei a Deus do céu, ai

Por que tamanha judiação

Que braseiro, que fornalha

Nem um pé de plantação

Por falta d’água perdi meu gado

Morreu de sede meu alazão”

A terra arde no Nordeste desde sempre. Não há como lutar contra uma realidade climática – ainda que a desordenada ação humana tenha intensificado o aquecimento global, mas esse é outro debate. A terra sempre ardeu e continuaria ardendo. Mas, será que o homem, que foi capaz de ultrapassar as fronteiras do espaço, chegar até a lua, não conseguiria, em 70 anos, encontrar uma solução para minimizar o sofrimento do sertanejo?

Hoje, vemos promessas, como a da Transposição do Rio São Francisco, para se trazer um futuro melhor para quem sofre com os males da seca. A bilionária obra, imaginada inicialmente por D. Pedro II – cem anos antes do canto de Gonzagão –, foi vendida pelo governo federal como a salvação do povo. Passado o período eleitoral e colhidos os frutos das promessas, hoje ela se encontra parada, atrasada, superfaturada.

Sim, existem formas de se resolver o problema da seca para o nordestino – tanto existem que elas são prometidas a cada quatro anos, durante o período eleitoral. Mas, enquanto não houver uma vontade política de se mudar essa situação, lamentavelmente, os sertanejos continuarão a perder seus gados. Seguirão morrendo de sede seus alazões.

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