Diego Rocha

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Cultura Nerd

Perfil: Publicitário de formação, mestre em Design, entusiasta da Estética. Professor universitário, fashion-geek, zen-gamer e aficcionado por séries de tv, quadrinhos e cinema de ficção.

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Princesas Politicamente Corretas (spoiler alert)

Diego Rocha, | ter, 07/10/2014 - 13:33
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Por muito e muito tempo a Disney foi acusada de criar uma realidade falsa e um parâmetro de perfeição irreal que atingiu gerações inteiras da sociedade ocidental. Num ambiente cultural como o nosso, em que as pessoas leem cada vez menos e assistem cada vez mais a filmes, as produções audiovisuais tomam para si um papel fundamental na educação das crianças. Os contos de fadas, assim como as fábulas desde a Grécia Antiga, são formatos literários cuja função principal é exatamente transmitir uma lição ou um valor moral através do que se passa com os personagens. Esses valores nascem na moralidade da sociedade e por isso podem mudar ao longo do tempo.

É um papel indispensável da mídia (seja ela qual for) retratar o público que a assiste, primeiramente porque é uma necessidade das pessoas se verem retratadas na mídia (sério mesmo, é uma necessidade do sujeito na sociedade midiatizada) e segundo porque a mídia é uma das forças que movem e moldam as pessoas. A sociedade, por sua vez se mantem em constante mudança e questionável evolução, de forma que manter os mesmos modelos eternizados não são suficientes para retratar novas gerações... as releituras são necessárias para que os contos de fadas cumpram suas funções. Vejamos alguns exemplos:

1) Chapeuzinho Vermelho

A história da garotinha que "vai pela estrada afora bem sozinha levar doces para a vovozinha" nasce como uma forma de ensinar para as meninas que o mundo é cheio de perigos e que elas não devem nunca falar com estranhos. Na história, a Chapeuzinho simboliza a pureza e o "Lobo Mau" representa as maldades do mundo... que tenta enganar a garotinha para se aproveitar de sua inocência. Claro, nada disso teria acontecido se a garotinha tivesse dado ouvidos à sua mãe e tivesse seguido pelo caminho certo, mais longo e mais seguro. No final, ela é salva pelo caçador, uma figura masculina que simboliza força, mas também a figura do "homem de bem", capaz de dar proteger uma mocinha indefesa.

Justamente contra essa imagem de indefesa, temos essa outra versão batizada no Brasil de "A Garota da Capa Vermelha":

Essa releitura foi lançada nos cinemas em 2011 e coloca a personagem feminina no papel de controle e de poder. Ao longo da história é construída uma noção (através da insinuação e do suspense) de que qualquer um poderia ser o lobo (leia-se: "que existe o potencial para o mal em qualquer um de nós"). Fica clara, também, a relação desenvolvida entre a Chapeuzinho e o lobo, o interesse e o desejo da garota pelo "monstro" e ao final a sua entrega consciente.

Por fim, temos essa outra visão do personagem, onde a Chapeuzinho é, de fato, o próprio Lobo Mal:

No seriado norte-americano Once Upon a Time, no qual vários personagens de diversos contos de fadas, são transportados para uma cidadezinha no interior do estado do Maine (tipo no meio do nada). Nessa realidade a Chapeuzinho se chama "Ruby" (em homenagem à cor da capa vermelha) e ela é ajudante da vovó, que é dona de uma lanchonete/restaurante. Já na realidade de origem deles, a Ruby era a vítima da maldição e se transformava em lobo e a capa era exatamente o que impedia a sua transformação. Maneiras de atualizar o personagem.

2) O Amor Verdadeiro Amor

Em diversas histórias, simbolizando as dificuldades da vida, os personagens passam por feitiços, maldições e outros infortúnios que requerem algo que lhes permita superar essa adversidade. Em muitos casos esse "algo" é a chegada do grande amor na vida dessa pessoa, e nada simboliza mais do que o beijo apaixonado. O problema desse beijo e dessa situação é que com o passar do tempo era sempre a mocinha (a donzela, a princesa...) que ficava esperando que o príncipe viesse ao seu encontro e lhe desse o beijo, o que coloca a figura feminina sempre na dependência da figura masculina.

Com o passar do tempo e a transformação da nossa sociedade chegamos ao momento em que as mulheres salvam a si mesmas, não dependendo de um homem. Isso não quer dizer que essas mulheres modernas rejeitem os homens ou devam ser auto-suficientes... mas mais importante que isso é a  compreensão de que existem outras formas de amor e que são igualmente verdadeiros.

No filme Frozen é o amor das irmãs Anna e Elsa é o amor das irmãs que as salva... salva a Anna do congelamento do seu coração (efetivamente salvando a sua vida) e sava a Elsa do descontrole de seus poderes (efetivamente salvando todo o reino de um inverso sem fim). O filme aproveita essa situação para distanciar o "ato do amor verdadeiro" da dinâmica mencionada acima, onde a jovem Anna achava que seria salva do seu destino gélido pelo beijo do seu jovem pretendente, mas é o seu sacrifício que a liberta.

A mesma situação ocorre no filme Malévola, onde temos uma nova visão do clássico beijo do Príncipe na Bela Adormecida (a princesa Aurora)... mas como o filme se passa pela perspectiva da "bruxa" e não da "princesa", ele se dá ao luxo de explorar o significado do verdadeiro amor que se dá pelo contato de quem conheceu a menina a vida inteira, cuidou e protegeu e não de um cara que acabou de conhecer. 

E caso você esteja se perguntando, aquela imagem lá em cima são as releituras das emblemáticas personagens femininas dos clássicos Disney "A Bela e a Fera", "Branca de Neve e os Sete Anões", "A Bela Adormecida", "Alladin", "A Pequena Sereia" e "Cinderella" recriadas pelo artista Emmanuel Viola (Evvi). O estilo desse artista é marcado pela transformação de personagens para um contexto urbano atualizado e muitas vezes underground, adornando-os com tatuagens, piercings e vestindo-os de forma igualmente contemporânea e arrojada. Você pode ver mais do trabalho dele em http://www.evviart.com/

 
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