Tópicos | 1932

Aos 94 anos, o barbeiro Francisco Rossi Filho, o Chiquinho, percorre a pé, quatro vezes ao dia, as quadras que separam sua casa da tradicional barbearia que tem em São Carlos, interior de São Paulo. As mãos que seguram com firmeza a tesoura estiveram a serviço dos paulistas na Revolução de 32. Chiquinho fez parte do Batalhão de Escoteiros de São Carlos - um grupo de garotos e garotas com idade entre 10 e 17 anos que, sem poder ir à frente de batalha, dava apoio às tropas. "Éramos chamados de calças curtas por causa do nosso traje, mas a gente se sentia tão importante quanto os soldados."

A pé ou de bicicleta, os escoteiros atuavam como estafetas e assumiam serviços de apoio. "Eu corria o dia todo, do quartel para o fórum, onde fosse preciso. Fazia com vontade, achando que São Paulo podia ganhar a guerra. Para nós, era uma guerra, com tiros, bombas e aviões." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

##RECOMENDA##

Na pequena Vera Cruz, de 10,7 mil habitantes na região de Marília (SP), seu Totó é uma lenda viva. As pessoas que o veem caminhando a passos lentos na direção da padaria ou ao salão de barbeiro o tratam com reverência. Com 103 anos, Antonio Andrade Guimarães é um sobrevivente da Revolução Constitucionalista de 1932.

Dos 35 mil paulistas que pegaram em armas contra a ditadura de Getúlio Vargas há 84 anos, apenas nove ainda vivem, conforme os cadastros da Sociedade Veteranos de 32 - MMDC e apuração da reportagem. Suas memórias são os últimos registros vivos - o número de sobreviventes diminui ano a ano. Em 2012, restavam 26.

##RECOMENDA##

Hoje, poucos desses centenários têm a vitalidade de seu Totó, embora ele reclame que a saúde está mais ou menos. "De vez em quando, dá alguma tontura. Por isso parei de dirigir e já não ando como antes, mas não sou de ficar parado."

Quando relembra a revolta dos paulistas, porém, as cenas voltam nítidas à sua mente. "Eu era um moço, 18 ou 19 anos, entrei como voluntário e passei 78 dias no campo de batalha, mudando de uma trincheira para outra. Os soldados do Getúlio invadiram nossa trincheira, machucaram alguns dos nossos e fizeram prisões, quando não mataram. Eu escapei por pouco. Meus companheiros foram presos e levados para a Ilha das Flores, no Rio."

As batalhas mais cruentas aconteceram em Eleutério, na divisa com Minas. Ele ainda lembra o estrondo dos canhões e dos rasantes dos aviões inimigos. "Eu era de Sertãozinho e nós fomos em 20. Alguns companheiros eu nunca mais vi."

Nas trincheiras, o ex-combatente passou fome e sede. "Valeu a pena, porque o povo ficou mais unido. Muitas vidas tombaram para que São Paulo fosse essa grandeza que é hoje."

As mulheres

E a história ainda pode ser contada não somente pelas batalhas. Maria de Lourdes Pinto Picarelli, de 103 anos, logo indaga: "Quer que fale de mim ou do meu marido?" Ela só se apresentou como voluntária em 32 depois que o então namorado, Laércio Picarelli, foi convocado para lutar com as tropas paulistas. Incorporado como cabo ao Batalhão 23 de Maio, Laércio seguiu para a frente de batalha na divisa com Minas. "Eu tinha 19 anos e, em vez de ficar rezando por ele, pensei em ser mais útil e me apresentei como voluntária na Casa do Soldado. Ali a gente era um ponto de apoio para os combatentes."

Zuleika Sucupira Kenworthy, de 103 anos, teve trajetória semelhante e fala da revolução como se tivesse sido ontem, destacando o papel do jornal O Estado de S. Paulo. "Os Mesquitas, pode-se dizer que eles fizeram a revolução. O Getúlio estava armando para tomar conta de tudo e, no dia 9 de julho, o jornal publicou 'Estamos em Guerra'."

Lembranças

O ex-combatente Arlindo Leonardo Ribeiro, de 104 anos, é o único constitucionalista ainda vivo em Barretos, mas luta contra o Alzheimer, que vai aos poucos minando as lembranças do campo de batalha. "Lembro pouco, lembro pouco... quem é mesmo o senhor? Os tiros, muitos tiros, a gente se escondia, todos tinham de caminhar muito embaixo da chuva e dos tiros. Falei dos ataques? Muitos feridos."

Já o alagoano Agenor Silva Lima, de 103 anos, mora sozinho no Ipiranga, em São Paulo. O ex-combatente foi condecorado pelos atos de bravura nas batalhas e seguiu carreira no Exército. Quando completou 100 anos, renovou a carteira de habilitação. Hoje, ainda é visto caminhando nos jardins do Museu do Ipiranga. E pediu desculpas por não poder conversar mais. "Estou ouvindo muito mal, você teria de gritar."

Capitão da reserva da PM, o ex-combatente Benedito Monteiro, de 101 anos, o Capitão Benê, ainda vive em Tremembé, no Vale do Paraíba. O presidente da Câmara, Adriano dos Santos (PDT), conta que ele será homenageado no dia 27 de agosto pelo 102º aniversário. Outro ex-soldado constitucionalista ainda vivo também seguiu a carreira militar: Irany Paraná do Brasil tem 102 anos e mora em São Paulo. Ele chegou a coronel da PM e dedicou-se a escrever livros sobre a revolução.

O MMDC e a prefeitura de Santos não tinham informações sobre o ex-combatente João da Cruz Batista, de 104 anos. Em julho do ano passado, ele foi homenageado e estava bem de saúde. A reportagem também não conseguiu contato com o ex-combatente Luiz Ferreira Junior, de Bragança Paulista. No MMDC, seus dados não estavam atualizados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando