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Desembarcando pela primeira vez no Nordeste, a Copa dos Refugiados e Imigrantes 2019 terá uma das etapas regionais disputada no próximo dia 15 de setembro, na Arena de Pernambuco, Região Metropolitana do Recife. As seleções sorteadas para a disputa na capital pernambucana foram Senegal, Angola, Cabo Verde e Venezuela. Os jogos têm início às 8h e a entrada da torcida é gratuita. 

“Reserve um minuto para ouvir uma pessoa que deixou o seu país”. Esse é o tema da Copa dos Refugiados e Imigrantes de 2019, que além do lazer do jogo de futebol, visa garantir o protagonismo dos estrangeiros e mostrar a cultura dos participantes com o intuito de romper barreiras sociais e lutar contra a xenofobia. Outro objetivo é chamar atenção para a necessidade de inserir formalmente os refugiados e imigrantes no mercado de trabalho brasileiro. 

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O Brasil contabilizava, em dezembro de 2018, 11.231 refugiados já reconhecidos. Naquele mesmo mês, havia 161.057 solicitações de reconhecimento da condição de refugiado. Dos refugiados já reconhecidos, 36% são sírios; 15% congoleses; 9% angolanos; 7% colombianos e 3% venezuelanos.

Ainda de acordo com dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), há, em todo o mundo, 25,9 milhões de refugiados. Ao final de 2018, cerca de 70,8 milhões de pessoas foram forçadas a deixar seus locais de origem, motivadas por diferentes tipos de conflitos.

Seleções de Cabo Verde e Venezuela treinam na UFPE. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Em entrevista ao LeiaJá, o engenheiro Jean Katumba, da ONG África do Coração, responsável pela criação e organização da Copa, contou que a ideia é moldar o evento e torná-lo semelhante à Copa do Mundo de Futebol. “A gente sabe que as pessoas param para assistir o futebol. É uma maneira de chamar atenção para a nossa causa. Também queremos que a nossa copa seja uma plataforma de livre expressão dos imigrantes e refugiados”, disse. 

Katumba chegou ao Brasil como refugiado, saindo do Congo, há seis anos e entre muitos sonhos, decidiu apostar suas fichas na “competição” amistosa. “Sabemos que o esporte é uma linguagem universal. Futebol então, no Brasil, é o esporte mais querido e o que pode mais integrar as pessoas. Você não precisa falar português ou inglês. Queremos gritar gol juntos, imigrantes, refugiados e brasileiros”, destacou. 

Sobre ter escolhido pela primeira vez uma capital do Nordeste, Katumba acredita que existe um entendimento errado sobre imigração e refúgio na região. “Já escutei dos próprios imigrantes que vivem em São Paulo questionamentos para saber se iriam levar os residentes da capital paulista para jogar no Nordeste. Eles acham que não há imigrantes e refugiados naquela área. O que é muito diferente da realidade, pois cada vez mais os nordestinos recebem essa população. A gente também sabe que cada região tem sua dificuldade”, explicou. 

Apesar da Copa ter os países representantes na competição, as equipes podem ser mistas e os jogadores não necessariamente precisam ser de alguma nacionalidade específica. No Recife, por exemplo, só foram escolhidas quatro seleções oficiais, mas há participantes do Haiti, Guiné Bissau, Cabo Verde, Angola, Senegal, Venezuela, Colômbia, Israel e Benin. Ao todo, a competição envolverá aproximadamente 1.120 atletas de 39 nacionalidades e 46 seleções agregando pessoas em situação de refúgio (solicitantes de refúgio e refugiados reconhecidos) e imigrantes. 

Lieka é natural do Congo, país da África. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Papa Sufre acredita que o evento é muito mais do que uma competição, mas também o momento para se sentir em casa. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

A reportagem do LeiaJá acompanhou o treino das seleções de Cabo Verde e Venezuela. David Lieka, 34, é imigrante do Congo e veio ao Recife estudar na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É a primeira vez que vai jogar a Copa e diz que apesar de estar fora de forma, suas expectativas estão altas. “Para a gente é até bom os brasileiros terem um novo olhar sobre a imigração. A gente que é estudante ainda está em uma situação melhor pelo fetiche de falarmos outra língua, mas muitos refugiados e imigrantes que só trabalham sofrem muito mais”, afirmou. 

Lieka vai representar a equipe de Cabo Verde, que é composta basicamente por estudantes imigrantes da UFPE de diversas nacionalidades, em sua maioria africanos. Eles já têm a tradição de jogar futebol todos os sábados na quadra da instituição e por isso estão apostando em vencer a etapa regional e representar Pernambuco na grande final, realizada em outubro, no Maracanã, Rio de Janeiro. Organizado pela ONG África do Coração, com o apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) e da Organização Internacional para as Migrações (OIM), a competição surgiu em 2014, em São Paulo. A iniciativa teve, em 2017, uma edição realizada em Porto Alegre e outra, em 2018, no Rio de Janeiro. Este ano, a Copa dos Refugiados e Imigrantes terá estreia em Brasília, Curitiba e no Recife.

Papa Sufre, 30, diz que está contente pela organização do evento trazer pela primeira vez a Copa ao Nordeste. “É uma forma de aproximação com outros imigrantes e refugiados. Sentir a sensação de estar em casa e poder encontrar outras pessoas de diferentes nacionalidades não tem preço e sendo através do futebol, então, será incrível”. 

Altino aposta no evento inclusive para revelar possíveis talento no futebol. Foto: Júio Gomes/LeiaJáImagens

Altino Mulungu, gestor do Escritório de Assistência à Cidadania Africana em Pernambuco (Eacape), é um dos responsáveis pela organização da Copa em Pernambuco. Para ele, o momento é muito oportuno e o evento tem tudo a ver com a realidade do estado. “Pernambuco sempre foi cosmopolita desde séculos passados, é só olhar a nossa história. Temos aqui no Recife o consulado mais antigo do Brasil, é o Britânico de 1808. Também temos a primeira Sinagoga das américas, no bairro do Recife Antigo. É uma prova incontestável que esse direito migratório de ir e vir sempre esteve em nossa realidade. É um respeito ao nosso legado com a imigração”, detalhou Mulungu. 

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Jean Baptiste é um dos organizadores da edição inédita da Copa dos Refugiados e Imigrantes no Recife. Foto: Júio Gomes/LeiaJáImagens

O haitiano Jean Baptiste Joseph, 33, vive no Brasil desde 2010, mas é natural de Jean-Rabel, região mais pobre do Haiti. Na capital pernambucana, ele fundou em 2018 o Grupo de Embaixadores para o Desenvolvimento (GADE). Jean acredita no poder da inclusão social pelo esporte e pelo contato com o outro. "Eu sou imigrante e sei como é difícil ter essa integração social. A ideia também é que as torcidas de Pernambuco se unam para incentivar uma só ideia. O acolhimento aos imigrantes e refugiados", apontou. Como é um evento sem fins lucrativos, a Copa dos Refugiados também conta com o apoio de parcerias e voluntariado. "Ainda estamos na correria para conseguir algumas chuteiras para os meninos jogarem", disse. 

Em outro momento Jean esclarece que existe a vontade de propor uma Copa feminina de futebol, mas ainda é preciso saber se há mulheres suficientes para compor os times em cada região. “Talvez incluir outros esportes, realizar mais palestras e tornar o assunto como algo natural que acontece no mundo. As migrações são parte da nossa história”, complementou o pesquisador.

Para a Organização Internacional para as Migrações, agência da ONU para as Migrações, o aspecto sociocultural, muitas vezes deixado em segundo plano na integração dos migrantes e dos refugiados, é fundamental. “Apoiar iniciativas como a Copa dos Refugiados e Imigrantes é importante para nós, pois acreditamos que elas reforçam a criação de condições que garantam uma inclusão sustentável e benéfica a todos, migrantes e brasileiros. E esse é o espírito que a OIM difunde ao redor do mundo: todas as pessoas são iguais em termos de direitos humanos, independente da nacionalidade e condição migratória. Iniciativas como essa, que promovem a integração social e cultural dos migrantes e refugiados são importantes para mostrar a diversidade das pessoas, aumentar a empatia em relação aos migrantes e ajudar a construir um entendimento mais justo de suas realidades, perspectivas e necessidades”, destacou o órgão. 

Alguns integrantes da Venezuela se preparam para a competição no próximo dia 15 de setembro. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O venezuelano David Ramos, 42, é imigrante temporário e veio ao Recife através do Programa Pana, que visa a assistência humanitária e o apoio na integração da população migrante da Venezuela em vulnerabilidade, através de aluguéis subsidiados e da Casa de Direitos. Ramos salienta que reuniu os refugiados e estão treinando aos domingos para fazer bonito no dia do jogo. 

Para o futuro, o criador da Copa, Jean Katumba, sonha em torná-la internacional. “Acreditamos que o crescimento do evento pode aumentar ainda mais essa integração que tanto buscamos, não só no Brasil, como no mundo. Porque a gente sabe que a causa da imigração e dos refugiados é também internacional. Queremos cidadãos do mundo. 

Para a realização do evento no Recife, o apoio é também de representantes do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), da Defensoria Pública da União (DPU), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Federação Pernambucana de Futebol (FPF), que garantiu a viabilização da Arena de Pernambuco para a realização da competição.

Escalação das equipes

Senegal: Mame Thierno, Ahmet Sarr, Moudo Fall Tine, Tapha Geuye, Samba Fall, Ahmet Fall, Modou Lo, Elhadji Ndiaye, Mamor Diop, Ibrahim Lacom, Ibrahim Loum, Matar Cisse, Atou Khoule, Mamadou Balde, Asse Diange, Abdou Syla, Same Sow, Omar Cisse, Yahya Lam, Moussa Ndiay

Venezuela: Johan Flores, Andres Gonzalez, Robert Nieto, Jose Caguama, Orlando Garcias, Misael Rodriguez, Jordis Caraballo, Rodrigo Escobar, Cesar Beria, Llefridaniel Zambrano, Lleri Zambrano, Ivan Pokomovsky, David RAmos, Jose Vaquero

Angola: Geogany Carlos, José Lima, Arieh Calisto, Manuel Campos, Jesdras Banjale, Yuri Agostinho, Adriano Diogo, Pedro Sabonete, Delson Culembe, Agostinho Cortez, Nelson Nzage, Ousmani Armando, Jacinto Cruz, Algi Wendel, Miguel Francisco

Cabo Verde: Papa Sufre, Gabriel Vasco, Derciliano Cruz, José Ferreira, Codjo Olivier, Nathanael Dossa, Andrés Felipe, Davidson, Benedic, Sene, Jerónimo Pereira, Sourou, Lassana Danfá, Jeremias Fernando, David Lieka

Serviço

Copa dos Refugiados e Imigrantes 201

15 de setembro | A partir das 8

Arena Pernambuco - São Lourenço da Mata, s/n

Gratuito

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