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A guerra na Ucrânia coloca o planeta à beira da maior crise sobre o custo de vida da população global desta geração, segundo alerta a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad, na sigla em inglês), em relatório divulgado nesta quarta-feira, 8. A entidade destaca que os choques nos preços de energia e alimentos, que elevam a inflação no mundo todo, podem provocar mais instabilidade política à medida em que reduzem a renda real das pessoas.

Em discurso durante evento de apresentação do relatório, a secretária-geral da Unctad, Rebeca Grynspan, alertou que a crise alimentar, por enquanto concentrada em países da Ásia e África, pode rapidamente se transformar em uma "catástrofe de proporções globais" em 2023. "Se a guerra continuar e os altos preços de grãos e fertilizantes persistirem na próxima temporada de plantio, a crise atual pode se estender a outros alimentos básicos, como o arroz, afetando bilhões de pessoas a mais", alertou.

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Entre as medidas defendidas por ela para controlar os mercados globais e reduzir a volatilidade nos preços de commodities, será necessário reintegrar as produções de Rússia e Ucrânia à cadeia global, apesar da guerra. Sobre energia, a dirigente destacou o papel relevante do uso de reservas estratégicas para diminuir os preços, mas ressaltou que o mundo deve acelerar a transição para fontes renováveis.

Grynspan também defende que governos ao redor do mundo aumentam a proteção social por meio de "suporte focado" em grupos vulneráveis. A secretária-geral ainda afirmou que países emergentes necessitam "urgentemente" de apoio fiscal de instituições financeiras internacionais. Sem isso, várias nações seguirão com dificuldades de pagar por sua comida e energia, realizar o serviço da dívida e aumentar a proteção social, disse.

Por fim, ela instou a comunidade global a "fortalecer a arquitetura da dívida global". O Grupo dos Vinte (G20) deve restabelecer a Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida e os vencimentos de títulos soberanos precisam ser adiados em dois a cinco anos, argumentou.

Pressionados pela alta dos custos, acentuada no último mês como consequência da guerra na Ucrânia, produtores de suínos e ovos passaram a reduzir suas ofertas em uma tentativa de elevar os preços de venda e diminuir os prejuízos que foram acumulados nos últimos dois anos. A medida deve dificultar - ainda mais - a vida do consumidor, que enfrenta uma inflação de 11,3% nos últimos 12 meses.

Desde o início da pandemia, a cotação do milho, uma das principais matérias-primas da atividade, avançou 71%. Enquanto isso, o preço no atacado da caixa de ovos comercializada em Bastos (SP), cidade que é a maior produtora de ovos do País, aumentou 36%. No caso da carne de porco, a situação é ainda mais delicada: o valor médio pelo quilo pago ao produtor em cinco Estados subiu 18%.

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A analista Juliana Ferraz, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Cepea-Esalq/USP), explica que, para os produtores de suínos, há uma dificuldade de repassar a alta nos custos porque a carne é tida como produto intermediário, nem caro nem barato.

Isso significa que, quando a carne bovina encarece, os consumidores não recorrem à de porco, mas à de frango. "Os preços do suíno acabam ficando muito voláteis e é mais difícil fazer o repasse", diz Juliana.

Preço da ração

Segundo ela, a suinocultura vive uma das piores crises da história, com produtores tendo prejuízos há mais de um ano. Entre as principais dificuldades enfrentadas pelo setor está o preço da ração. Do total do custo de produção, 70% é com milho e farelo de soja.

O suinocultor Fernando Haidemann Esser, de Santa Catarina, conta que, antes da pandemia, pagava R$ 45 na saca de milho e R$ 1,20 no quilo do farelo de soja, também usado na alimentação animal.

Em março, chegou a pagar R$ 105 e R$ 3,10, respectivamente. Sem conseguir repassar essa alta, diminuiu o número de matrizes de 600 para 400. "A cada ano eu renovava metade do plantel. Desde agosto passei a reduzir. Minha reserva financeira acabou. Não tenho mais como fazer reposição", diz. "Antes da guerra, a alimentação já estava cara, mas tinha perspectiva de que os preços começassem a cair. Com a guerra, ficou mais difícil."

Segundo o presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos, Losivanio de Lorenzi, o prejuízo dos produtores da região hoje é de R$ 1,10 por quilo de carne e deve se manter por mais um ano, período em que os custos estarão pressionados e ainda haverá excedente de carne suína no mundo.

A oferta da proteína tem crescido globalmente desde 2019, quando a peste suína africana dizimou o plantel da China. Produtores de todo o mundo ampliaram suas ofertas de forma desordenada para atender o mercado oriental.

Ovos

O setor de ovos também tem registrado perdas. Segundo o Sindicato Rural de Bastos, com o aumento no preço das commodities desde 2020, o custo para produzir uma caixa de 30 dúzias alcançou R$ 200, enquanto o preço de venda ronda os R$ 140.

Cristina Yabuta, diretora da entidade, reconhece que houve alta de 40% no preço de venda apenas neste ano, mas afirma que, ainda assim, não foi suficiente para cobrir os custos.

Segundo Cristina, diante do prejuízo, os produtores passaram a mandar as galinhas para o frigorífico e, assim, o número de aves destinadas à produção de ovos caiu de 12 milhões em 2020 para 8 milhões. "Nunca imaginamos que teríamos tanto prejuízo. Cada galinha é um rio de custos sangrando. E, para nosso consumidor, que é a base da pirâmide, também não está barato", afirma.

Com três granjas em operação em Bastos, Jorge Miyakubo precisava comprar 27 mil pintinhos a cada dois meses para manter o nível de produção. Agora, reduziu para 21 mil. "Tive de diminuir porque, quanto mais ração, mais prejuízo. Não estou repondo o total para ver se os preços melhoram."

Cristina afirma que o equilíbrio entre custo e preço de venda só deve ser atingido quando houver redução ainda maior no número de aves. Isso deve levar cerca de um ano para ocorrer, dado que, ao contrário do ciclo da carne de frango, o do ovo é longo. São ao menos seis meses para a galinha botar os primeiros ovos e, a partir daí, mais 70 semanas produzindo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Se os produtores de carne suína e ovos já enfrentavam dificuldades desde o começo da pandemia por conta da alta das commodities, a guerra se tornou motivo extra de preocupação. Com a Ucrânia e a Rússia sendo, respectivamente, o quarto e o sexto maiores exportadores de milho, a cotação disparou nas primeiras semanas após a invasão russa.

A média do preço da saca ficou em R$ 99,69 - valor que não se via desde maio de 2021 e quase o dobro do registrado dois anos atrás.

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Agora, porém, há sinais de trégua no mercado, o que pode garantir, ao menos temporariamente, um alívio aos produtores de proteína animal.

Por enquanto, o preço médio da saca de milho é de R$ 90,22, de acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Cepea-Esalq/USP).

Além da desvalorização do dólar ter ajudado nesse recuo, a expectativa de que a segunda safra deste ano no Brasil será boa reduziu a pressão no preço.

Terceiro maior exportador de milho, o País deve ter uma oferta 46% maior na segunda safra de 2022 na comparação com a de 2021, segundo estimativa divulgada na semana passada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Exportação

Dados dos EUA apontam que, pelo menos neste ano, as exportações ucranianas ficarão 23% abaixo do esperado. É uma redução significativa no volume de milho disponível no mercado, mas inferior ao que se esperava em março.

Ainda que haja indicativos de uma melhora para os produtores de proteína, a tendência é que os preços também não recuem muito mais. No mercado futuro, a cotação fica entre R$ 86 e R$ 87 até o fim do ano.

Para o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, os preços devem se manter elevados até início de 2023.

O pesquisador Lucilio Alves, do Cepea-Esalq/USP, lembra que ainda não se sabe se os ucranianos vão conseguir plantar a próxima safra. "A guerra prejudica o fornecimento de sementes, combustível, fertilizantes, além da comercialização. Boa parte da produção era escoada via Mar Negro, o que fica complicado agora. Isso tudo ainda pode mexer nos preços", afirma. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A guerra Rússia-Ucrânia deve ainda impactar em abril no reajuste de preços de matérias-primas para um terço das empresas entrevistadas em pesquisa conduzida pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). Para 43% das empresas, a eclosão da guerra agravou o reajuste de preços.

A guerra começou em 24 de fevereiro. Os preços internacionais recuaram, mas ainda estão, em alguns casos, maiores do que antes do conflito.

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A Fiesp entrevistou 131 empresas do Estado de São Paulo, entre os dias 14 e 17 de março para ter um termômetro da percepção das empresas sobre os efeitos da guerra tanto pelo lado da alta de preços quanto pelas dificuldades em encontrar os insumos.

O resultado da pesquisa, obtido pelo Estadão, mostrou também que 29% das empresas verificaram impacto na oferta de insumos para produção em março e 36,6% esperam efeitos em abril.

FALTA

A dificuldade para encontrar as matérias-primas aumentou, mas não é um quadro de falta de produtos. Somente 3,1% das empresas relataram que não encontraram insumos em março.

Para o economista-chefe da Fiesp, Igor Rocha, a situação requer monitoramento, mas aparentemente o quadro está longe de um cenário similar ao da pandemia da covid-19 em 2020, quando houve desabastecimento e aumento de preços: "A guerra afetou a cadeia de suprimentos numa proporção menor do que a pandemia, mas faz com que o processo de normalização dessa fase agora tenha um retardo."

Rocha lembrou que a economia já caminha para uma perspectiva de normalização das cadeias produtivas num processo lento e paulatino, o que pode agora demorar mais um pouco.

A disparada da inflação esvaziou o carrinho de compras de supermercado dos brasileiros no ano passado, e as novas pressões de preços das commodities, como trigo, soja, petróleo, provocadas pela guerra, devem piorar a situação.

Pesquisa da consultoria global Kantar mostra que, em 2021, com IPCA a 10,06%, o brasileiro levou para casa um volume 5,6% menor de produtos de uma cesta com 120 categorias, entre alimentos, bebidas, higiene e limpeza, na comparação com o ano anterior. Em número de unidades, o recuo foi de 2,6%. Mesmo comprando menos, o consumidor gastou 8,6% a mais do que em 2020. Em 2022, a alta de preços não deu trégua, pelo contrário (em 12 meses, até fevereiro, subiu para 10,54%).

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Esse cenário de bolso apertado com compras menores "se consolidou no final de 2021, especialmente no caso das commodities e dos produtos perecíveis, que inclui carnes", afirma Raquel Ferreira, diretora comercial da Kantar.

Mensalmente, a consultoria tira uma fotografia da despensa de 11 mil domicílios para projetar as compras de 58,8 milhões de lares existentes no País.

No último trimestre do ano passado, o consumo dessa cesta de produtos caiu ainda mais em unidades, 5% em relação a igual período de 2020. No caso das commodities, que incluem farinha, arroz, óleo de soja, a retração foi de 7,7%. E o desembolso em reais pela cesta como um todo aumentou 5,5%.

"A cesta de commodities já sofreu muito no fim de 2021 e deve ter um primeiro trimestre mais impactado pela alta de preço por conta da guerra", diz Raquel.

Mudança de hábito

Diante do aperto no orçamento que deve piorar em razão de novas pressões inflacionárias, a alternativa para o consumidor é intensificar o que ele já vinha fazendo ao longo de 2021. Isto é, buscar promoções, trocar marcas caras por econômicas, substituir carne por proteínas mais baratas, como ovo e empanados.

A pesquisa mostra que a disparada da inflação a partir do segundo semestre do ano passado provocou um aumento da participação das marcas econômicas, aquelas cujos preços estão 20% abaixo da média do mercado, no carrinho de compras. Até meados de 2021, respondiam por 14% da cesta total e fecharam o ano em 16%.

A perspectiva, diz Raquel, é de que a fatia das marcas econômicas, especialmente as regionais, avance e represente 18% da cesta. Essa foi a participação na época da hiperinflação, antes da estabilização com o Plano Real.

Sem marca

A publicitária e designer Sibele Monice, de 56 anos, que mora com filho de 17 anos e a mãe no ABC paulista, está um passo à frente de boa parte dos brasileiros. Para economizar, ela tirou as marcas da sua lista de supermercado e começou a comprar muitos produtos a granel, como cereais, arroz, feijão, e itens de limpeza, como sabão líquido, lustra móveis, por exemplo. "Eu não fui para a marca regional, mas aboli a marca", diz.

Na compra a granel de produtos sem uma marca específica, o consumidor tem a possibilidade de levar para casa a quantidade exata que precisa e não paga pela embalagem.

Arroz, por exemplo, ela costuma comprar três quilos. É uma quantidade diferente das embalagens comuns de marca, encontradas nos supermercados.

No caso do sabão líquido, Sibele trocou o Omo, cuja embalagem de três litros chegava a custar quase R$ 50, pelo sabão líquido a granel, que sai por R$ 20 cinco litros. "É muito mais barato comprar grãos e itens de limpeza a granel."

Ao optar por esse tipo de compra, ela reduziu a participação do supermercado como canal de abastecimento de produtos básicos e incluiu as lojas de bairro.

Em itens nos quais não é possível comprar a granel, Sibele continua se abastecendo no supermercado, mas trocou de marca para economizar. Só a marca de pó de café, trocou quatro vezes e assim baixou em R$ 7 o gasto com o item. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Sem citar a possibilidade de conceder subsídios para bancar parte do custo dos combustíveis, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse nesta terça-feira que o governo está preparado "para qualquer guerra". Ele lembrou que o protocolo para acionar a calamidade e não precisar cumprir as regras fiscais - como ocorreu na pandemia - está pronto desde a aprovação da PEC Emergencial no ano passado.

"Estamos preparados e vamos agir como agimos na pandemia. Temos protocolo de guerra preparado. Temos o botão de emergência, temos exceção ao teto de gastos se for preciso. Estamos preparados para qualquer guerra", enfatizou o ministro, em cerimônia no Palácio do Planalto.

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Após a aprovação do PLP 11 na semana passada, Guedes voltou a dizer que a nova legislação sobre a tributação de combustíveis levará a uma redução de R$ 0,60 nos preços nas bombas, com impacto de R$ 0,27 os Estados e de R$ 0,33 para a União.

"O barril de petróleo foi a US$ 130 e conseguimos atenuar em dois terços o primeiro impacto. O impacto em combustíveis seria de R$ 0,90, mas absorvemos R$ 0,60. Ou seja, apenas um terço do impacto da alta do petróleo chegou aos consumidores", alegou. "Os impostos estavam em cascata nos combustíveis, era um absurdo. O governo não pode ter resultado em cima da desgraça do povo. Não tem sentido comemorar aumento da arrecadação com alta do petróleo. Estamos abrindo mão de receitas, estamos reduzindo IPI, PIS/Cofins e ICMS", completou.

O ministro voltou a afirmar que a economia brasileira já se recuperou e está mais forte do inclusive a maioria dos países desenvolvidos. "Somos uma geração que paga suas guerras, não estamos hipotecando o futuro dos nossos netos e bisnetos. O déficit já está zerado. Estamos fortes para outra briga, se vier guerra mundial estamos prontos. Somos firmes, somos duros na queda, temos planos", acrescentou. "Os ministros estão todos trabalhando juntos pelos mesmos objetivos. Teremos R$ 1,1 trilhão de planos de investimentos contratados até o fim deste ano. O Brasil está condenado a crescer", concluiu.

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