Tópicos | Mãe Gilda

O Dia Mundial da Religião é comemorado nesta quinta-feira (21). No Brasil, a data também celebra o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, que foi instituído em 2007 pela Lei n° 11.635/2007, em homenagem a Iyalorixá dos Santos, também conhecida como Mãe Gilda, vítima de preconceito religioso.

Mãe Gilda foi uma ativista social que participou de inúmeros movimentos para melhorar o bairro Nova Brasília de Itapuã, em Salvador (BA). Por pertencer ao candomblé, ela recebeu diversos ataques, como agressões físicas e verbais, de devotos da Assembleia de Deus. Mãe Gilda morreu em 21 de janeiro de 2000, com a saúde fragilizada pelos acontecimentos.

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O ocorrido com Mãe Gilda ilustra a intolerância religiosa, preconceito ainda presente nos dias de hoje. A psicóloga e bacharel em direito Doné Conceição d'Lissá, de Duque de Caxias (RJ), da religião candomblé Djeje Mahim, relata que, nos últimos dez anos o templo religioso que lidera foi alvo de ataques. "Foram vários incêndios provocados e três carros incendiados. Fomos alvos de tiros, e, no último ataque, ficamos um ano inteiro sem poder funcionar, porque foi tudo destruído", lembra.

Apesar de o Ministério Público e a Delegacia Local agirem diante do ocorrido, não foi possível identificar os autores dos crimes. "Acredita-se que a motivação foi devido à intolerância religiosa, que eu chamo de racismo religioso, pois se não tivéssemos professando em uma religião de negros, muito provavelmente não teríamos tanta animosidade", declara Doné.

De acordo com a Legislação Brasileira, o preconceito religioso tem crime previsto na Lei de nº 9.459/1997, que pode resultar em pena de até três anos de reclusão e pagamento de multa.

A origem da intolerância religiosa e como deve ser combatida

No Brasil, o sincretismo religioso atua por meio do catolicismo português e as tradições africanas e indígenas. "Historicamente, houve desde o princípio da formação da sociedade brasileira, a violência religiosa por imposição das crenças dos colonizadores, primeiramente aos povos indígenas e, depois, aos africanos, que se tornaram escravos em nosso país", destaca o doutor em Teoria do Direito e Teologia e professor da Faculdade Arnaldo de Belo Horizonte (MG) Luciano dos Santos.

De acordo com dados registrados pelo Disque 100, número criado para denúncias de violação aos Direitos Humanos, em 2019, os casos de preconceito religioso tiveram aumento de 56%. Os praticiantes de religiões de matriz africana foram os que mais registram queixas. Segundo Santos, as agressões surgem pela sensação de ameaça, insegurança e tentativa de intolerantes para garantir a verdade defendida por determinada crença.

O teólogo lembra que muitas das agressões não partem da religião, mas do fiel e da maneira como ele interpreta a doutrina religiosa. "O fundamentalismo representa a atitude do crente, que confere caráter absoluto ao seu ponto de vista. A partir deste posicionamento, o fiel que se sente portador de uma verdade absoluta não consegue viver e conviver com outra verdade, tendo por efeito a intolerância religiosa", explica.

Por conta do preconceito religioso, o indivíduo despreza aqueles que possuem outras crenças e se comporta de maneira agressiva. "Por resultado prático, surgem os conflitos religiosos e suas vítimas, como exemplo, o aumento das agressões verbais e físicas com os praticantes do candomblé e da umbanda na sociedade brasileira", descreve Santos.

Desde 1890, o Brasil é considerado um estado laico, ou seja, imparcial em relação às questões religiosas, o que concede ao cidadão brasileiro o direito de escolher qualquer crença. "Nenhum cidadão é obrigado a seguir uma religião ou tornar-se vítima por viver uma religião diferente de seu grupo social. A liberdade religiosa é um direito e faz parte da dignidade humana. É uma garantia inviolável à liberdade de consciência e de crença", afirma o teólogo.

Segundo Santos, para superar esse preconceito, é necessário o diálogo social de maneira civilizada, que visa criar uma cultura de paz e respeito, diante do pluralismo religioso. Isso possibilitaria o respeito a todas as crenças. O teólogo explica que parte dessa educação deve vir dos líderes religiosos, que devem educar os seus fiéis a respeitar a crença do próximo. "O diálogo é um dos caminhos privilegiados para o aprendizado com o diferente. Entendemos que a família e a escola devem promover a permanente educação ao diálogo, e o compromisso ao respeito às liberdades de crenças dos indivíduos", recomenda.

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