Por Olívia de Souza
Um dos momentos mais aguardados do 18º Janeiro de Grandes Espetáculos, a exibição do elogiado Amour, Acide et Noix, do grupo canadense da Daniel Léveillé Danse (Quebec), era carregada de expectativas por parte do público, que lotou o Teatro Santa Isabel na noite de sábado (14). Parte disso foi por conta de uma particularidade do espetáculo: o fato de todos os seus dançarinos (três rapazes e uma garota) se apresentarem nus durante toda a encenação.
Ao som de Vivaldi, com inserção de ruídos da natureza e músicas contemporâneas (como o volume baixíssimo de uma música de Led Zeppelin contrastando com o som ensurdecedor do metal industrial da alemã Rammstein), a peça aborda a solidão nos tempos modernos. A ausência (e o medo) do contato físico, e a importância do toque, trazendo ternura e segurança. Num mundo cada vez mais globalizado e individualizado, conclui-se que o nu seria a única alternativa para a verdadeira leitura do corpo. E que as relações humanas são mais do que necessárias nesse âmbito. Movimentos duros, repetitivos, realizados num desleixo proposital, e a ausência de emoção e empatia, buscam traduzir um pouco esse contexto. Por vezes, tudo parece uma longa série de exercícios, onde o esforço, a respiração e o som do impacto dos corpos no chão são bem acentuados. Dessa forma, o coreógrafo Daniel Léveillé tenta transgredir à rigidez e disciplina da dança clássica, uma das características da dança contemporânea.
Passado o impacto inicial, movimentos, técnica e a excelente iluminação valorizando ainda mais os corpos esculturais dos dançarinos tomaram as atenções de grande parte do público, que passou a encarar a nudez com certa naturalidade. É fato que uma parcela, no entanto, ainda se mostrou um pouco desconfortável com a situação. Foi possível observar alguns risos constrangidos e pessoas com dificuldade de olhar para o palco. Reações que, de certa forma, sabe-se que são esperadas da plateia. Esther Gaudette, Emmanuel Proulx, Mathieu Campeau e Justin Gionet, ao final da apresentação, abandonaram a nudez e apareceram vestidos para receber os longos e merecidos aplausos.
A peça faz parte de uma trilogia de onde também fazem parte os espetáculos: The Modesty of Icebergs e Twilight of the Oceans. O grupo realizou uma segunda apresentação no domingo, e no dia 21 deste mês, apresenta-se no Teatro Rui Limeira Real (Sesc Caruaru).