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O líder supremo do Talibã ordenou, neste domingo (3), a proibição do cultivo no Afeganistão da papoula, planta da qual são extraídos ópio e heroína, alertando que as autoridades destruiriam quaisquer plantações descobertas e puniriam os responsáveis.

O Afeganistão é de longe o maior produtor mundial de papoula, e a produção e exportação cresceram consideravelmente nos últimos anos.

"Todos os afegãos estão agora informados, o cultivo da papoula está estritamente proibido em todo o país", indica um decreto do líder talibã, Hibatullah Akhundzada.

"Em caso de violação do decreto, o cultivo será imediatamente destruído e os culpados tratados de acordo com a sharia", a lei islâmica, indica o texto.

Entre 80% e 90% da heroína e do ópio do mundo vêm do Afeganistão, segundo a ONU.

A área dedicada a essa cultura bateu recorde em 2017 com 250 mil hectares, quatro vezes mais do que na década de 1990.

No sul do Afeganistão, trabalhadores rurais dos campos de papoula, matéria-prima do ópio e da heroína, comemoram com jogos e festa uma colheita excepcional, que pode trazer uma receita importante para os talibãs este ano.

No Afeganistão, a primavera é sinônimo de ofensiva dos insurgentes islâmicos, mas também de colheita da papoula. Como ocorre todo ano, milhares de pessoas foram a Naqil, na província de Uruzgan, para retirar a resina da papoula, a partir da qual se produz o ópio e a heroína.

Desta vez, a colheita parece promissora e à noite, os trabalhadores jogam o "laço": os participantes se posicionam no meio da multidão, agitando uma corda comprida, com a qual devem tocar seus adversários. A alegria toma conta do local e muitos compram sorvetes de framboesa de um vendedor.

"É o único momento do ano em que se ganha dinheiro", explica Afzal Mohammed, um agricultor que veio de Kandahar para trabalhar na colheita. "Aqui, a gente trabalha durante 15 dias e o resto do ano não tem emprego", afirma. Segundo os moradores da região, muitos trabalhadores rurais que colhem a papoula são talibãs vindos de outras regiões do país.

"Embora todo mundo diga que sem a papoula não haveria guerra no Afeganistão, a verdade é que para nós não haveria trabalho, nem comida sem a papoula", afirma Abdul Bari Tokhi, líder tribal cuja família possui vários hectares de terra em Naqil.

A vinda de trabalhadores de todo o país para a colheita é a prova da precariedade da situação econômica no Afeganistão, onde o desemprego afeta uma em cada cinco pessoas economicamente ativas. E sobretudo, demonstra o fracasso das campanhas para erradicar o cultivo da planta, lançadas pelos países ocidentais, após a derrubada dos talibãs, em 2001.

O Afeganistão permanece como o líder mundial deste cultivo e, em 2014, ano em que a Otan deu por concluída a missão de combate no país, registrou-se a melhor colheita de papoula desde 2002.

No ano passado, a produção caiu enormemente, mas segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, foi por causa da seca e não das campanhas de erradicação. Por isto, este ano os produtores fazem tudo o possível para recuperar o que não conseguiram ganhar no ano passado.

'Estamos em guerra'

Durante a colheita da planta, os talibãs costumam reduzir seus ataques, um sinal de que controlam o cultivo, um mercado que representa 3 bilhões de dólares. "A colheita está prestes a terminar (...), pelo que esperamos um aumento dos ataques talibãs", explicou recentemente Charles Cleveland, porta-voz das tropas americanas no Afeganistão.

"Com a colheita muito boa deste ano, tememos que os talibãs reinvistam sua receita em esforços de guerra", lamentou. Em Uruzgan, província montanhosa de difícil acesso, a papoula está em toda parte. De seu gabinete, o governador da província, Mohammed Nazir Kharoti, tem a vista dos campos verdes entre colinas que se perdem no horizonte.

"Estamos em guerra", explica, assegurando que não pode fazer nada contra o "ouro verde". "A erradicação forçada só agrava a situação econômica. Cria um movimento de simpatia da população com os talibãs e inclusive leva as pessoas a acolhê-los em suas casas", afirma.

Naqil, no sul de Uruzgan, está repleta de agricultores, narcotraficantes, dependentes químicos e talibãs. Oficialmente, a região está sob o controle do governo, mas as autoridades são cada vez menos presentes.

Nos campos, o sistema de colheita é sempre o mesmo. À tarde, é preciso fazer com uma faca uma incisão na cápsula da planta, de onde sai uma seiva branca. À noite, a substância endurece e fica marrom e a resina resultante é retirada no dia seguinte, usando um raspador.

Alguns produtores consideram a incisão da papoula um ato quase poético. "É preciso sujeitá-la com cuidado", diz Sher Mohammed, recomendando que a incisão seja feita "com amor".

A produção da matéria-prima do ópio, a papoula, no Afeganistão aumentou neste ano para níveis recordes, apesar dos esforços internacionais na última década para afastar o país do tráfico de drogas. A informação faz parte de um relatório divulgado nesta quarta-feira pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodoc).

A colheita de maio foi de 5.500 toneladas, 49% maior do que a do ano passado e mais do que a produção combinada do restante do mundo. Até mesmo em províncias afegãs com algum sucesso passado no combate ao cultivo da planta registrou reversão dessa tendência, segundo o relatório deste ano da agência antidrogas da ONU.

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A retirada das tropas estrangeiras do Afeganistão no ano que vem deve piorar ainda mais as coisas, disse Jean-Luc Lemahieu, representante regional do Unodoc em Cabul. Ele alertou que, na medida em que a ajuda internacional é reduzida, o governo afegão se tornará cada vez mais dependente de fontes ilícitas de renda.

O aumento da produção começou em 2010, quando agricultores foram rápidos em plantar papoula para aproveitar o aumento dos preços, resultado de uma doença que atacou as plantações no ano anterior e da escalada militar norte-americana no sul, disse Lemahieu à Associated Press.

Segundo ele, dentre os que se beneficiam do tráfico de drogas há agricultores, insurgentes e muitos membros do governo. Lemahieu disse que geralmente eles trabalham juntos.

Khan Bacha, que cultiva papoula num pequeno pedaço de terra na província de Nangarhar, reduto do Taleban a leste do país, disse que os insurgentes cobram dos fazendeiros um "imposto religioso" de um quilo a cada 10 produzidos, embora a taxa seja "negociável". "Eles dizem que estamos numa jihad", disse Bacha. "É o dinheiro de Deus que damos."

Tentativas anteriores da comunidade internacional de combater o cultivo de papoula incluíram a produção de culturas alternativas e o pagamento de agricultores, em algumas áreas, para que não plantassem papoula. Mas a ação não deu certo, já que eles passaram a fazer as plantações em outros locais para ter algum dinheiro caso os pagamentos fossem encerrados.

As plantações também parecem estar se espalhando para novas partes do país. Foram 209 mil hectares em 17 províncias neste ano, contra 154 mil hectares em 15 províncias em 2012, diz o documento.

A maior parte do cultivo de papoula no Afeganistão acontece no sul, sudoeste e leste do país, áreas onde cresce a insurgência do Taleban. Mas foi na província de Cabul e na parte central onde houve o maior aumento: 148% entre 2012 e 2013.

Apesar das notícias, o relatório destaca o aumento dos serviços sociais para lidar com o crescente número de dependentes do ópio no país. "Esses são sinais tangíveis e que dão esperança", diz o documento.

Há cerca de 1 milhão de dependentes de drogas no Afeganistão, 15% dos quais são mulheres e crianças, disse Kanishka Turkistan, porta-voz do Ministério de Saúde Pública. Fonte: Associated Press.

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