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Na noite desta sexta-feira (23), no Recife, uma programação especial foi montada para aqueles que exaltam a magia do São João. No Sítio Trindade, no bairro de Casa Amarela, o público foi contemplado com a apresentação do Mestre Galo Preto. Iniciando os trabalhos, o músico subiu ao palco do evento com toda a sua potência e conhecimento cultural. Aos 88 anos, o músico afirmou que deseja continuar colaborando com sua arte.

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Arrancando aplausos da uma pequena plateia, Mestre Galo Preto não perdeu tempo ao mostrar o seu improviso. “Alô, Sítio da Trindade. Sítio da Trindade, alô. Avise ao Sítio da Trindade que o Galo Preto chegou”, soltou o artista. Prestigiado por poucas pessoas, o cantador colocou para fora seu vigor, com uma performance visceral e esplendorosa.

Nascido em Bom Conselho, no Agreste pernambucano, Tomás Aquino Leão, o Mestre Galo Preto, ficou conhecido pela forma de como desenvolveu sua trajetória. Admirado por grandes nomes da música nordestina como Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, o embolador recebeu, em 2011, o título de Patrimônio Vivo do Estado de Pernambuco. A honraria só fez mostrar que a história do Mestre Galo Preto deve ser preservada, engrandecida e respeitada.

Era quase meia-noite quando Isis, em meio a uma sessão de prosa na cozinha de casa, pediu para seu avô, Ararinha da Viola - um dos maiores repentistas e cordelistas do Sergipe -, contar-lhe uma de suas histórias preferidas. Já idoso e com a memória comprometida pelo Alzheimer, o poeta lamentou por não poder concluir o repente, um dia depois, ele seria hospitalizado e não voltaria mais. 

Aquela foi a última vez que Ararinha recitou uma de suas histórias em vida e foi logo para a neta preferida, segundo ela própria. Não por acaso, a ela coube a missão de dar continuidade e renovar as tradições que estão no seio da família, original de uma terra tão rica em cultura popular. A menina logo entendeu isso e tornou-se Isis Broken, uma artista nordestina, travesti, preta, rapper, cantora e compositora, que nesta sexta (26) lança seu primeiro álbum, ‘Bruxa Cangaceira’, trabalho no qual condensa todo o legado a ela confiado 

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Isis cresceu ouvindo os repentes do avô e logo cedo, por volta dos nove anos de idade, começou a se aventurar escrevendo poesias e algumas músicas. Logo em seguida, aos 12, descobriu-se uma pessoa trans e deu início ao seu processo de transição. Nesse sentido, Ararinha da Viola também teve papel fundamental, como ela conta em entrevista exclusiva ao LeiaJá. “Quando eu me assumi, ele super me aceitou. Nunca falou nada, pelo contrário, ele era um cara do sertão sergipano, poderia ter limitações, o que seria até aceitável, mas ele nunca teve essas limitações comigo”.

'Bruxa Cangaceira' condensa as referências e vivências de Isis. Foto: Divulgação

Foi pouco depois da perda do avô que Isis tomou consciência de qual rumo deveria dar ao seu trabalho e qual o real propósito dele. Após ficar sem o final da história preferida, na última conversa com o repentista, ela acredita ter recebido dele, através de um jogo de tarot, a resposta que precisava. “Até hoje eu não sei qual é o final deste poema, mas eu acho que naquele momento não era pra eu saber, era pra eu dar continuidade. Uns dois anos depois eu tava sentada no meu altar, tirando um tarot, peguei cartas aleatórias e apareceu Elegbara (orixá que liga os vivos e os mortos), e ouvi uma voz falando ‘Elegbara, eleva o espírito e me renova’. Peguei um papel e comecei a escrever e o mais louco é que se eu te falar que eu lembro eu vou tá mentindo, eu lembro que quando terminei eu tava com várias páginas parecendo psicografadas, uma letra que não era minha e eu falei essa música não fui eu, foi meu avô que escreveu”.

A música em questão leva o nome do repentista, ‘Ararinha da Viola’ e além de ser uma das faixas do álbum ‘Bruxa Cangaceira’ também conta com um videoclipe, assinado por Letícia Pires e que agora concorre ao prêmio ‘Music Video Festival’, na categoria ‘Melhor clipe nacional envolvendo diversidade e inclusão’, ao lado de nomes como Renegado em um feat. com Elza Soares, Edgar, Ravi Lobo e Trevo. O trabalho chega à competição já premiado em uma outra, o ‘Festival de Cinema de Vitória’, no qual levou o troféu de Melhor Videoclipe Nacional’. 

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Além de colecionar indicações e prêmios, ‘Ararinha da Viola’ é também um apanhado das referências e missões de Isis Broken, coisa que se repete ao longo do primeiro álbum da artista. São elementos que vieram de seu avô e da cultura popular do Sergipe, como os parafusos de Lagarto, as taieiras e o jaraguá. Mas também aparecem, ao longo das faixas, outras influências diversas como o rap e o trap, o pop de Kelly Key, o forró do Nordeste, o rock de mulheres como Pitty e Avril Lavigne, e até coisas que surgem nos sonhos da cantora, autodeclarada bruxa. Tudo isso arrematado com um forte viés político, com discursos de empoderamento e auto afirmação que ela estende a todos as pessoas transvestigeneres.

Com sua música, Isis acaba sendo ela mesma uma referência, função de extrema importância da qual ela própria já sofreu influência também. “Eu transicionei com uns 12, 13 anos e me descobri uma pessoa trans. Eu não via corpos iguais ao meu cantando sobre suas histórias, eu não me via em lugar nenhum e eu achava que eu era proibida de cantar. Hoje eu percebo que sentia isso. Eu também não acreditava muito na minha voz, na minha potência, por ter uma voz travesti. A primeira pessoa que eu vi na TV que combinava com a minha história foi a MC Xuxú, que inclusive tá no (meu) álbum, e foi nesse momento que eu percebi a grandiosidade das nossas existências e que o mundo precisava ouvir isso. Ver MC Xuxú num domingo, na TV, me lembro como hoje, no (programa) Esquenta, um corpo travesti totalmente dissidente, eu falei: ‘é isso que eu quero’. 

Isis Broken é artista independente. Seus figurinos são montados por ela mesma, em brechós e com peças emprestadas. Foto: Divulgação

Broken quer, também, provar que tais referências estão em toda a parte e que devem ser validadas. Não por acaso, seus clipes e músicas já renderam cursos, deram mote para aulas em diversos níveis de graduação e já alcançaram até o público infantil. “Já teve pai que me disse: ‘Nossa, meu filho ama você, eu comecei a ouvir você por causa dele’. Eu falei: ‘Meu Deus, as crianças estão ouvindo Isis Broken’. As crianças estão consumindo uma travesti“. 

Recentemente, a artista se envolveu em uma polêmica nas redes sociais ao pleitear seus créditos em uma produção de Gloria Groove, assinada pelo diretor Felipe Sassi, com quem já trabalhou. A situação acabou ilustrando a luta por validação na qual ela tanto se empenha. “Por que as pessoas não querem validar uma travesti como referência? Quantas travestis você tem como referência? É justamente isso que eu queria falar, é uma responsabilidade. Tudo que eu penso e faço é pensando nisso: em como me transformar numa referência,  esse é o legado que quero deixar pro meu filho que tá chegando, pras novas gerações e para que as pessoas (trans) se percebem gigantes, porque durante muito tempo eu me senti muito pequena e hoje me percebo gigante e não deixo ninguém dizer que eu não sou”. 

Consciente de seus desejos e de onde quer chegar, Isis Broken sabe muito bem quem é. A segurança da artista é notória em sua lírica, seus figurinos - todos elaborados por ela mesma - e performances, sempre vigorosas e repleta de alegorias e elementos que vão das artes plásticas à cultura tradicional. Para viabilizar o seu trabalho, a sergipana mudou-se recentemente para São Paulo, ao lado do marido, o músico e produtor Aqualienn, que espera o primeiro filho do casal transcentrado, Apolo. 

Clique aqui para ouvir 'Bruxa Cangaceira'. Foto: Divulgação

A chegada dos seus dois ‘filhos’ representa um marco que não é de exclusividade de Isis. O bebê Apolo vai chegar ao mundo, dentro de poucos meses, provando que as famílias não precisam seguir qualquer tipo de modelo pré-estabelecido para existirem e que corpos trans também podem gerar e amar como quaisquer outros. 

Já o álbum ‘Bruxa Cangaceira’, além de cumprir os papéis designados a Isis por sua ancestralidade: de continuidade e renovação dentro de várias culturas - provando que essas são vivas e por isso sofrem constante mutação -, chega também para marcar a existência e competência dessa artista nordestina, preta, travesti, ‘bruxa’ e, sobretudo, disposta a encabeçar um verdadeiro clã do qual ela já assumiu o comando como sua verdadeira “suprema”. 

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu hoje (11), por unanimidade, o repente como patrimônio cultural do Brasil. Referência para a identidade da região Nordeste, o repente é conhecido também como cantoria e tem como fundamentos verso, rima e oração. Os repentistas ou cantadores se espalham pelas capitais e interior dos estados do Nordeste brasileiro e também nas regiões para onde ocorreram migrações de nordestinos. A votação foi feita pelos 22 membros do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, órgão vinculado ao Iphan.

Em entrevista à Agência Brasil, o diretor do Departamento de Patrimônio Imaterial (DPI) do Iphan, Tassos Lycurgo, declarou ter ficado "triste" porque não conseguiu comemorar rimando. Na avaliação dele,  o reconhecimento pelo Iphan vai beneficiar todo o Nordeste, bem como estados do Brasil, como o Rio de Janeiro. “O Nordeste está em todo o Brasil. Existe influência nordestina em todos os lugares. É um bem cultural do qual já se tem notícia no século 19. Isso é muito caracterizador da cultura nordestina. É um negócio muito bonito mesmo”.

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O dossiê de registro elaborado documenta mais de 50 modalidades de repente, nas quais estão incluídos os versos heptassílabos, cuja acentuação tônica obrigatória está na sétima sílaba; e versos decassílabos, em que o acento obrigatório está na terceira, sexta e décima sílabas de cada verso.

Com o reconhecimento pelo conselho consultivo, o repente foi inscrito no Livro de Registro das Formas de Expressão, onde também estão catalogados bens como a roda de capoeira, o maracatu nação (PE), o carimbó (PA) e a literatura de cordel. A partir de então, o repente passa a ser alvo de políticas públicas para a salvaguarda da manifestação, que devem incidir ainda sobre um universo de bens associados que inclui a embolada, o aboio, a glosa e a poesia de bancada e declamação.

Alegria

O pedido de registro do repente como patrimônio cultural foi formalizado em 2013 durante a gestão do repentista Chico de Assis à frente da Associação dos Cantadores Repentistas e Escritores Populares do DF e Entorno (Acrepo). “A gente vem nessa luta há muito tempo”, relembrou Assis que recebeu a notícia do reconhecimento com satisfação.

Outro repentista satisfeito é João Santana. “É uma alegria pela conquista, apesar de saber que esse é o primeiro passo de uma nova fase”. Ele acredita que a decisão vai abrir portas para os repentistas brasileiros. “Acreditamos que, com isso, nós possamos ter um olhar dos entes fomentadores da cultura, dos meios de comunicação, um olhar mais atencioso para com o repente”.

Forró

O próximo bem que será analisado pelo conselho consultivo vinculado ao Iphan é o forró. Tassos Lycurgo disse que a reunião ainda não tem data definida, mas adiantou que a análise do pedido será feita em dezembro.

“É um mês muito importante porque o dia 13 é aniversário de Luiz Gonzaga e é também o Dia do Forró. Tem a ver também com o Nordeste que é muito representativo dessa nossa característica brasileira da miscigenação, da união de vários vetores, dando essa identidade brasileira. Então, o forró é muito importante”.

Também conhecido como o Rei do Baião, Luiz Gonzaga foi considerado uma das mais completas, importantes e criativas figuras da música popular brasileira. Levou para todo o país a cultura musical do Nordeste, como o baião, o xaxado, o xote e o forró pé de serra. Suas composições descreviam a pobreza, as tristezas e as injustiças de sua árida terra, o sertão nordestino.

Lycurgo lembrou ainda que, juntos, o cordel, já registrado; o repente, reconhecido hoje; e o forró, que deverá ser apreciado em dezembro, formam um trio muito importante, “caracterizador da identidade nordestina e, portanto, da brasileira também”.

Revalidações

Durante a reunião, foram apreciadas também as revalidações do título de Patrimônio Cultural do Círio de Nossa Senhora de Nazaré (PA), do modo artesanal de fazer queijo de Minas (MG) e do modo de fazer renda irlandesa, tendo como referência este ofício em Divina Pastora (SE). De acordo com o Decreto 3.551/2000, os bens culturais registrados devem passar, pelo menos a cada dez anos, por processos de revalidação dos títulos.

Marcado para acontecer próximo domingo (24), no Cálidus Bar, localizado no Recife Antigo, às 16h, o evento “Um Repente no Calidus Bar” prometendo trazer a cantoria de Viola ao Boulevard do Recife Antigo. O projeto já está em sua segunda edição e conta com os poetas violeiros Antônio Lisboa e Luciano Leonel, a meia entrada é para todos no valor de R$ 20.

 Os encontros sempre acontecem nos domingo e a cada nova edição o público encontra diferentes atrações de Pernambuco e também de outros Estados do Nordeste, valorizando repentistas locais. O evento promete participação do público onde é possível sugerir motes, temas, gêneros e canções.

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Serviço

Um Repente no Cálidus Bar

24 de março | 16h

Calidus Bar (Av. Rio Branco, 66 - Recife Antigo, Recife)

R$ 20

Paulista se transformará na capital do improviso, nesta sexta (16), com o I Encontro Metropolitano de Repente. O evento vai reunir repentistas e declamadores no Teatro Paulo Freire, para uma noite de muita cantoria e poesia popular e, ainda, celebrar o aniversário de 70 anos de Ivanildo Vila Nova, um dos principais cantadores da atualidade.

Na programação, estão duplas consagradas como Ivanildo Vila Nova e Severino feitosa, João Lourenço e Hipólito Moura, além de Rogério Meneses e Daniel Olímpio. A declamação ficará a cargo de Amaro Poeta e Antônio Lisboa. A iniciativa conta com o apoio da Secretaria Municipal de Turismo e Cultura de Paulista.

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Confira este e mais eventos na Agenda LeiaJá. 

Serviço

I Encontro Metropolitano de Repente

Sexta (16) | 20h

Teatro Paulo Freire (Av. Marechal Floriano Peixoto - Centro de Paulista)

R$ 20 e R$ 10

Ivanildo Vila Nova, um dos mais populares cantadores nordestinos, começou a acompanhar o pai tocando viola aos 12 anos, aos 18 iniciou sua carreira oficialmente. Agora, consagrado como um dos maiores nomes da cultura popular nordestina, o repentista vai comemorar seus 50 anos de carreira com o show de gravação de seu DVD, 50 anos de cantoria, próxima quinta (21), no Teatro de Santa Isabel.

O trabalho de Ivanildo ganhou destaque pela sutileza dos versos, improviso e grande variedade de temas abordados. Seus repentes são carregados de questões de cunho social, político e traduzem a realidade do interior nordestino com citações de figuras como Lampião, Zumbi dos Palmares e Luiz Gonzaga. 

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Para a gravação do DVD comemorativo de suas 5 décadas de cantoria, o repentista receberá no palco artistas como Sebastião Silva, Daniel Olímpio, Miro Pereira, Raimundo Caetano, Rogério Menezes, Raulino Silva e Luciano Leonel. Além destes, os emboladores Barra Manda e Caetano da Ingazeira, o aboiador Amâncio Sobrinho e a cantora Indira Vila Nova também participam do show. 


Serviço

Gravação do DVD de Ivanildo Vila Nova - 50 anos de cantoria

Quinta (21) | 20h

Teatro de Santa Isabel (Praça da República, s/n - Santo Antônio)

R$ 15 e R$ 7,50

(81) 3355 3323

 

 

O Cais do Sertão desenvolveu um projeto para realizar um verdadeiro intercâmbio cultural entre diferentes expressões artísticas. O projeto De Repente ao Rap vai unir repentistas e poetas populares com cantores de rap. O projeto é bimestral e vai acontecer no último domingo do mês. 

A curadoria é do rapper Zé Brown. Nesta primeira edição, próximo domingo (29), os repentistas Pinto e Maturi se apresentam com o Grupo Arrete, composto pelas MCs Ya Juste, Weedja Lins e Nina Rodrigues. Os repentistas trabalham juntos há 10 anos na arte das rimas. Já o Grupo Arrete, criado em 2013, junta elementos da cultura hip hop com outrps estilos musicais. 

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O objetivo do projeto é levar ao Cais do Sertão outros ritmos, juntando o urbano do rap com a música sertaneja numa parceria com Zé Brown que já tem um trabalho consolidado nesta linha. 

Serviço

De Repente ao Rap

Domingo (29) | 16h

Museu Cais do Sertão (Avenida Alfredo Lisboa, s/n - Bairro do Recife)

R$ 8 e R$ 4

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