Além da cobiçada parceria com a Petrobrás, o empresário Eike Batista depende do governo para viabilizar outra peça crucial do projeto do Porto do Açu. São as estradas de ferro que faltam para ligar o Açu ao resto da malha ferroviária do País. Os trechos devem ser licitados no pacote de concessões tocado pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL), prometido para sair até setembro.
Pelas regras do novo modelo ferroviário, Eike não precisará colocar nenhum centavo no projeto - a não ser que deseje. Todo o risco será do governo federal. Vai funcionar assim: uma empresa constrói as ferrovias, o governo compra toda a capacidade de transporte e faz a revenda para empresas interessadas em usar os trilhos. Se não houver demanda, o governo paga a conta.
Esse esquema vale para todas as novas ferrovias brasileiras. Mas, no caso do empreendimento de Eike, o governo tem uma preocupação especial. Em Brasília, o discurso oficial é que o Porto do Açu é "estratégico" no esforço para tirar o transporte de carga marítima do sufoco.
Além disso, nos bastidores, funcionários do governo afirmam que o fracasso de Eike pode afetar a imagem do País com investidores. "Eike precisa de gente que use o porto dele. Para isso a ferrovia tem de chegar até lá", afirma um alto funcionário do governo.
Se tudo der certo, o porto será beneficiado por dois trechos. O mais adiantado, orçado em cerca de R$ 4 bilhões, vai conectar o terminal ao Rio de Janeiro e Vitória, num trajeto de aproximadamente 1.000 quilômetros. O outro, com estudos em fase preliminar, vai ligar o porto ao Centro-Oeste do País.
Na primeira rota, o terminal conseguiria atrair clientes industriais, cargas de minério de ferro e açúcar, além de atender o Comperj, o grande complexo petroquímico em construção pela Petrobrás. O segundo trecho permitiria o escoamento de grãos do Centro-Oeste, que hoje usam os portos congestionados de Santos (SP) e Paranaguá (PR).
Desde o início do projeto, um investimento de R$ 4 bilhões em São João da Barra (litoral Norte do Rio), Eike vem se mexendo para tirar os acessos ferroviários do papel. Ele tentou várias vezes convencer a Vale, que já tem a concessão de alguns trechos ferroviários nas redondezas, a fazer o serviço. Sem sucesso na gestão de Roger Agnelli, voltou à carga com Murilo Ferreira, hoje no comando da mineradora.
Como a Vale tinha obrigações a cumprir com o governo - ainda por conta da privatização da Rede Ferroviária Federal -, o empresário queria que essas pendências fossem liquidadas com as obras da ferrovia que liga o Rio ao porto do Açu. A proposta não foi adiante e o projeto foi parar no pacote ferroviário lançado em agosto pela presidente Dilma Rousseff, orçado em R$ 91 bilhões. Pelo cronograma da EPL, os projetos devem entrar em audiência pública nas próximas semanas.
Como tudo que Eike criou nos últimos anos, o Açu nasceu como um novo modelo de negócio para integrar porto e indústria - algo parecido com o que o governo de Pernambuco está fazendo no Porto de Suape. Pelos planos do empresário, além de capacidade para receber os maiores navios do mundo, o terminal será o ponto de chegada de um mineroduto da Anglo American, terá um estaleiro do próprio Eike (OSX) e um distrito industrial com empresas de vários setores.
Uma das âncoras do projeto seria a siderúrgica da chinesa Wuhan, que acabou desistindo do negócio por causa dos atrasos no projeto. A LLX, a empresa de logística de Eike e responsável pelo porto, afirma ter assinado um novo contrato com a siderúrgica ítalo-argentina Ternium, mas fontes do setor ainda duvidam da concretização do negócio.
A construção dos acessos ferroviários não resolveria todos os problemas de Eike, que vive uma crise de confiança que já derreteu mais de R$ 50 bilhões do valor de suas empresas. Mas poderia melhorar a imagem de seus empreendimentos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.