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O especial "Estudante, você também é herói", produzido pelo LeiaJá, traz, agora, a rotina de uma universitária. Ana Beatriz, de 23 anos, enfrentou desafios pessoais e encara os duros obstáculos ocasionados pelo novo coronavírus. Perseverante, a jovem aposta sonhos no pedagogia como ferramenta de desenvolvimento educacional. Foto: Cortesia.

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“É o meu sonho e, apesar disso tudo, eu vou enfrentar e eu vou conseguir realizá-lo”. O pensamento otimista da estudante de pedagogia Ana Beatriz da Silva de Miranda, 23, é uma injeção de perseverança que por pouco perdeu seu brilho. É trancada em um quarto, em cima de uma cama, longe por alguns instantes da filha Raabe da Silva Miranda, de apenas dois anos, e convivendo com o som dos carros e pessoas na rua, que a graduanda participa das aulas remotas da instituição de ensino em que realiza o curso.

Da jornada estudantil à pandemia da Covid-19

Ana Beatriz, como prefere ser chamada, nasceu e passou a maior parte da infância em Andaraí, bairro localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro. Aos dez anos, chegou ao estado de Pernambuco em companhia de sua mãe, Deodete Maria da Silva, 66 anos, e do pai, João Minervino da Silva, 69 anos, ambos nascidos e criados na cidade de Pombos, terra conhecida pelas plantações de abacaxi, no interior pernambucano.

Em Pernambuco, Ana morou no bairro da Cohab, localizado no município do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, onde fez os ensinos fundamental e médio. Em 2016, começou a caminhada na graduação no curso de pedagogia. A jovem acordava às 5 horas para sair de casa às 5h45. Nesse meio tempo, tomava banho, arrumava a bolsa com os materiais de estudo, preparava e tomava o café da manhã, quando conseguia.

Ao sair de casa, fazia um percurso que durava mais ou menos dez minutos andando até o terminal do ponto de ônibus, que a levava para o Terminal Integrado (T.I.) de Cajueiro Seco e, de lá, pegava a segunda condução do dia para chegar ao centro da cidade do Recife.De segunda-feira a sexta-feira, a jovem repetia o mesmo trajeto, que levava cerca de duas horas. Todo o esforço era feito para chegar à UNINABUCO - Centro Universitário Joaquim Nabuco, localizado na Avenida Guararapes, no Recife.

“Do Terminal Integrado de Cajueiro Seco, eu tinha duas opções. Pegava outro ônibus ou o metrô para o centro do Recife. A aula começava às 8h20. Eu conseguia chegar 10 minutos antes”, detalha Ana Beatriz em entrevista ao LeiaJá. “Quando saía de lá [da faculdade], fazia o mesmo trajeto para retornar, chegava em casa por volta das 13h30”, completa.

No primeiro semestre de 2016, a taxa de desocupação no Brasil era de 11,2%, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nesse mesmo ano, durante o primeiro período do curso de pedagogia, a estudante fazia parte desse percentual. Sem estágio ou emprego fixo, Ana Beatriz só podia contar com a ajuda da sua mãe Deodete, para pagar a mensalidade do curso.

Neste ano de 2020, a Pnad Contínua registrou que a taxa de desocupação no Brasil ficou em 13,3% no trimestre encerrado em junho. Ana Beatriz ainda faz parte dessa parcela de brasileiros.

Acesso ao ensino superior

“Quando eu estava concluindo o ensino médio, eu queria cursar letras, mas quando terminei e fiz a prova do Enem - Exame Nacional do Ensino Médio - pensei que era minha única oportunidade. E por causa do nervosismo, acabei não conseguindo uma boa nota para ingressar na universidade com uma bolsa de estudos”, relata a estudante.

“Eu também não queria esperar mais! Eu queria iniciar minha graduação em 2016. Então assim, a pedagogia era minha segunda opção, mas não imaginada que sempre foi a primeira opção no meu coração. Eu não me arrependo dessa escolha”, diz, afetuosamente.

No segundo semestre do mesmo ano, a graduanda começou a estagiar em uma creche, localizada no bairro da Várzea, Zona Oeste do Recife. Foi assim no segundo e depois no terceiro período.

Ao concluir o quarto período da graduação, uma notícia surpreendeu Ana e seu Marido, Anderson Miranda, de 26 anos. “Eu descobri que estava grávida”, revela. “Então, por estar desempregada, precisei pausar o curso. Fiquei dois anos sem estudar e sem trabalhar, sendo o primeiro ano da gestação e o segundo ano passei cuidando da minha filha”, explica Ana Beatriz.

No final de 2019, a filha do casal, Raabe, já estava com um ano. “Com o apoio do meu marido, consegui voltar aos meus estudos. Fiz a rematrícula no quinto período e já consegui concluí-lo. Já estou matriculada no sexto período e pretendo não interromper mais meu curso", comenta.

No Brasil, há 2.537 instituições de ensino superior, segundo o Censo da Educação Superior de 2018, o mais recente, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Rede de apoio e desafios

Ana Beatriz conta com familiares a amigas e amigos nessa jornada até sua formação em pedagogia. Em entrevista ao LeiaJá, Anderson, o marido da estudante, enfatiza que o empenho de sua companheira é essencial para que ela alcance seus objetivos e, assim, proporcione algo melhor para si e para a sua família. “Tanto ela quanto eu nos dedicamos aos estudos com essa finalidade. E desde sempre eu incentivei ela a continuar nesse caminho. Quando a gente recebeu a notícia de que ela estava grávida, ela optou por parar [a faculdade], mas se fosse por mim eu não queria”, conta. 

Ana destaca o apoio de seu marido e o amor de sua família. Foto: Cortesia

“Isso me ajudou a não desanimar”, reforça Ana Beatriz, que expressa gratidão ao apoio recebido.

Para que Ana pudesse ir à faculdade, sua filha Raabe, agora com dois anos, era cuidada por sua mãe ou outro membro da família que estivesse disponível. Na casa, além de Ana Breatriz, o companheiro e a filha, moram a mãe e o pai da acadêmica, além da tia chamada Izabel Maria da Silva, 77 anos.

Diante da pandemia causada pelo novo coronavírus, as aulas presenciais foram suspensas e a situação ficou mais apertada para a estudante. No entanto, a futura pedagoga foi contemplada com o benefício do Auxílio Emergencial, do Governo Federal. 

Entre um soninho e outro de Raabe, a mesa onde é servida as refeições das família transforma-se no local de estudo da graduanda. Diante do novo contexto, com restrições de circulação impostas pela pandemia da Covid-19, as aulas passaram do formato presencial para a forma remota.

Apesar de a conexão  com os colegas de classe e professores ser a distância, sentada em uma cama e apoiando as costas na parede, Ana Beatriz permanece atenta às aulas, realiza atividades acadêmicas e fortalece laços afetivos com os amigos. “Isso, com certeza, é fundamental para o processo de ensino-aprendizagem”, opina a jovem.

“Quando essa responsabilidade vem junto com a maternidade, precisamos planejar nossa rotina e assim poder equilibrar todos os sonhos e atividades. Cuidar de uma criança, da casa da família, requer dedicação assim como manter as aulas em dia também. Por isso, um apoio familiar nesse momento auxilia bastante, porque além da ajuda física, temos o suporte emocional, de ajudar o aluno a não desistir, afinal estamos falando de um crescimento pessoal e profissional e que diretamente irá impactar nas condições financeiras do futuro", afirma a psicóloga clínica Márcia Karine.

“O conselho para estudantes que têm a responsabilidade da maternidade, do trabalho home office, das tarefas de casa e dos estudos é: organize seu dia a dia, gerando um rotina. Assim você conseguirá dar conta das obrigações sem desistir do sonho de concluir sua faculdade. Peça ajuda aos seus familiares, eles poderão compor esse quadro de apoio. Ajuda também a diminuir os quadros de ansiedade e o medo do  fracasso”, recomenda a psicóloga em conversa com a reportagem do LeiaJáA profissional também é coordenadora do curso de psicologia UNINASSAU - Centro Universitário Maurício de Nassau

Ana Beatriz nos revela que não sabe “como será esse novo período”. Acredita que “provavelmente vai continuar com aulas remotas” e, mesmo não gostando muito da modalidade, diante as circunstâncias de emergência sanitária do Brasil, até prefere que seja assim.

“O processo de graduação a distância possibilita o planejamento dos horários de estudo de acordo com a rotina da casa. O que seria negativo é gerado pelo aumento da ansiedade que dá vazão ao medo, causado pelo acúmulo de tarefas não cumpridas. Hoje, temos um aumento dos quadros depressivos em virtude também de muitas atividades para serem cumpridas em um só momento”, diz a psicóloga.

Estima-se que mais de 18 milhões de pessoas sofram em decorrência de transtornos de ansiedade ante a pandemia global. Os dados são da Organização Mundial da Saúde (OMS). Contudo, nossa estudante que intitula- se como "heroína de si mesma" segue com os seus planos.

“Quero muito passar em um concurso público e também quero fazer uma pós-graduação em educação infantil, eu gosto muito dessa área”, destaca Ana Beatriz. “Quero trabalhar, de preferência, em uma creche ou em alguma escola municipal mesmo, porque a educação está muito defasada. Eu quero contribuir com tudo o que aprendi, durante esses anos, para uma educação básica de qualidade”, declara a estudante.

Confira, abaixo, as demais matérias do especial “Estudante, você também é herói”. Nossos repórteres mostram as rotinas de alunos, da educação infantil à pós-graduação, durante a pandemia do novo coronavírus:

--> Pequenos 'grandes' estudantes e o ensino remoto

--> Isolamento social e a ansiedade na preparação para o Enem

--> Pós-graduação sofre os efeitos da Covid-19

--> Formatura mais cedo: estudantes trocam aulas por hospitais

--> O que o futuro reserva para os estudantes após a pandemia?

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