Tópicos | Coletor menstrual

Desde a puberdade até a menopausa, a mulher usa, em média, mais de 10 mil absorventes - seja ele externo ou externo. São cerca de 150 kg de lixo durante a vida fértil. Colocando na ponta do lápis, o gasto anual com o produto é de pelo menos R$ 100. Para se degradar na natureza, o absorvente externo leva 100 anos, enquanto o interno leva até um ano. Indo além das questões financeiras e ecológicas, existe, também, o problema do desconforto durante o período menstrual. 

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Opções ao incômodo absorvente têm surgido desde os anos 1990, mas, no Brasil, vêm ganhando força há alguns anos. O coletor menstrual e, mais recentemente, a calcinha absorvente, têm sido algumas das alternativas encontradas pelas mulheres que consideram o produto caro ou desconfortável, e também se preocupam com a questão da sustentabilidade. Como é o caso da desenvolvedora de software Letícia Woelfer, 21 anos.

"Eu sempre detestei absorvente, mas quando soube da existência do coletor menstrual, me interessei também por conta da questão ambiental, porque nós mulheres acabamos produzindo muito lixo com os absorventes durante toda a vida. Resolvi usar porque imaginei que traria benefícios não só a mim, como também para o meio ambiente", explica Letícia que faz uso do coletor menstrual da marca Inciclo há mais de dois anos. O produto é inserido na vagina e coleta o fluxo menstrual. Ele pode ser usado por até 12 horas e não é necessário retirar para urinar ou evacuar.

Com o mesmo propósito, a gastrônoma Juli Moreira, 34 anos, resolveu experimentar a calcinha absorvente há dois anos. Comprou de uma marca internacional pois, na época, o produto ainda não era vendido no Brasil. “Usava um pacote de absorvente todo mês. Agora não produzo mais esse lixo”, conta. Para ela, os benefícios vão ainda além. “Absorvente sempre foi uma coisa incômoda para mim. Na época que usava, acordava toda vez que meu fluxo descia no meio da noite, achando que podia ter vazado. Hoje não me preocupo mais com isso. E posso ir para aula de dança ou para a academia também sem desconforto ou medo. Fora o ganho financeiro. O investimento das calcinhas mais que compensou o gasto com absorvente”, revela Juli.

As calcinhas têm tecido antimicrobiano que absorve o fluxo e bloqueia os odores. Os valores variam entre R$ 75 e R$ 95. A peça pode ser usada por até 12 horas e dura, em média, 2 anos. Há modelos da calcinha para fluxo leve, moderado e intenso. Aperfumista Viviane Silva, 35 anos conheceu o produto há seis meses e resolveu investir. "Eu costumava gastar muito com absorventes mensalmente. Em pouco tempo eu acabei pagando as minhas [calcinhas] com a economia que fiz em não precisar comprar o absorvente comum. O conforto é enorme, não causa assadura, reduziu os corrimentos. Só vejo benefícios", conta.

Preocupada com a relação das mulheres com a menstruação e com a quantidade de lixo gerada durante o período menstrual, a terapeuta holística Dani Lins criou o bioabsorvente. Feito de pano, o produto é artesanal, reutilizável e sem químicas. Com valores entre R$ 10 e R$ 25, os bioabsorventes podem ser usados de 2 a 4 horas - a depender do fluxo de cada mulher. “Apesar de ser algo antigo - nossas avós usavam, as nossas mães usavam os paninhos -, a nossa geração ficou muito distante disso quando apareceu o absorvente de plástico. Num primeiro momento, as mulheres não perceberam o quanto esse tipo de absorvente prejudica a nossa saúde e a natureza”, explica. Segundo Dani, os bioabsorventes têm recebido uma grande aceitação. “É algo que é antigo, mas que é novo para nossa geração. Quando a mulher passa a usar um bioabsorvente, ela percebe que não há mau cheiro no sangue, ela passa a ter uma relação com o sangue dela de uma forma diferente. Está tendo uma receptividade muito boa das mulheres, tem muitas aderindo e se abrindo para isso”, conta.

Apesar das inúmeras opções ao absorvente comum e dos benefícios apontados, muitas mulheres ainda se sentem inseguras para substituí-los. O LeiaJa.com conversou com a ginecologista do Hospital da Mulher do Recife, Karina Cidrim, para esclarecer as principais dúvidas.

Usar o coletor menstrual/calcinha de pano é uma boa opção?

Sim. Não só para a mulher, como para o meio ambiente também. São usadas quantidades enormes de produtos na confecções dos absorventes e eles levam anos para se degradar. Além disso, é uma opção, também, para algumas mulheres têm alergias a absorventes descartáveis - isso chega a ser até um motivo para algumas mulheres chegarem ao consultório pedindo para suspender a menstruação.

O que é importante observar no uso do coletor?

No caso dos coletores, é importante que a mulher já tenha tido relações sexuais. É importante porque é um copo que se coloca na vagina. Então, ao contrário do absorvente interno - que dependendo do tipo de hímen pode ser usado por virgens-, o coletor precisa que a mulher tenha um bom conhecimento da sua anatomia, e que a vagina já esteja, digamos, "confortável" para relaxar o suficiente. O bom relacionamento da mulher com a vagina também é um fato que vemos ser impeditivo no uso. Mais de 70% das mulheres não conhecem a sua anatomia, então não sabem exatamente onde o coletor fica, como ele age e acabam não se dispondo a utilizar.

Existe algum tipo de restrição para o uso do coletor?

Do ponto de vista do material utilizado, ele é hipoalergênico e não existe relato de reações alérgicas graves. Mas existem várias marcas e tamanhos e isso também é importante e deve ser observado. Algumas mulheres principalmente que ainda não tiveram filhos, ou acabaram de iniciar a atividade sexual podem não se sentir confortável com aquele tamanho ou material - o segredo é testar. Outra contraindicação é no pós parto imediato -seja ele normal ou cesareana- pela modificação da flora vaginal e pequenas lesões na vagina. Se houver ainda infecções vigentes, em tratamento com creme vaginal, também deve ser evitado o uso.

E para as calcinhas absorventes e os absorventes de pano?

O principio é o mesmo do coletor. Elas são ótimas pro meio ambiente, confortáveis e menos alergênicas, mas o grande problema é a higienização. É preciso lavar bem os produtos, higienizar. Muitas mulheres querem usar mas não querem ter contato com o sangue, não querem lavar, e isso não pode acontecer. Respeitando as orientações de uso e higienização, pode ser uma boa opção.

O coletor pode ser usado por mulheres que têm DIU?

Com cautela, pode ser utilizado sim. Teoricamente, o vácuo não é suficiente para retirar o diu de lugar, então não existe uma contraindicação formal ao uso concomitante. Mas deve-se sempre ter cuidado com a cordinha do diu para que ela fique dentro do copinho, que não fique presa nas paredes vagina e que elas não sejam puxadas na hora de colocar. Mas é sempre recomendado conversar com o ginecologista, ser examinada e orientada porque cada corpo é um corpo, uma anatomia, e o médico que acompanha aquela mulher deverá orientar bem esses usos.

Visto muitas vezes como indesejável e sujo, o período menstrual sempre foi considerado um tabu entre as mulheres. Apesar disso, nos últimos anos, um "copinho" feito com silicone medicinal, produzido para coletar o sangue da menstruação, tem ganhado cada vez mais espaço entre as brasileiras.

Embora tenha sido criado na década de 1930, o coletor menstrual só  ganhou popularidade no Brasil a partir de 2010. O produto é uma alternativa diferente  dos absorventes e armazena o sangue menstrual por um período de até 12 horas e tem duração de até dez anos. A recomendação é de retirá-lo, esvaziá-lo e lavá-lo com algum produto de limpeza antes de reinserir. Durante a menstruação, entre um ciclo e outro,  a mulher deve fervê-lo em uma panela.

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Apesar de ainda pouco conhecido, só no ano de 2015, uma das fabricantes do produto no Brasil, a Inciclo, por exemplo, afirmou que o coletor registrou um crescimento de 938% nas vendas nacionais. De acordo com os fabricantes, "os copinhos" são hipoalergênicos e com isso apresentam baixa possibilidade de acometer reações alérgicas às mulheres. Cada coletor custa em torno de R$ 79 e como tem duração longa, é considerado mais sustentável por diminuir a produção de lixo contínuo no meio ambiente.

Ao contrário do absorvente interno, que é inserido ao fundo da vagina, o coletor fica na entrada e é vendido em vários formatos e tamanhos. O custo-benefício também é um fator que atrai muitas mulheres. 

Dados da empresa Fleurity, marca que revende o produto, registram um faturamento mensal de até R$ 700 mil. Apenas em 2016, a estimativa da empresa é faturar R$ 2 milhões mensais. De acordo com a Fleurity, o coletor é uma alternativa mais econômica, ecológica, confortável e com baixo risco de vazamento. Para a paulista Juliana Sousa, 31 anos, usuária do produto há seis anos, a preocupação com o seu conforto e com o meio ambiente foram decisivas. "Eu me interessei muito pela ideia de não usar mais absorvente,  já não usava o externo, mas o interno me incomodava. A questão ambiental também me fez refletir sobre  quanto lixo eu ainda produziria na minha vida menstrual e quanto dinheiro eu gastaria", contou.

Para mulheres, coletor é libertação

Visto por algumas mulheres como "revolucionário" e "libertador", o coletor menstrual também ganha espaço nas redes sociais. Para Monique Zaioncz, 21 anos, a descoberta foi muito positiva. "Conheci o coletor através do Facebook e decidi usá-lo porque ao pesquisar mais sobre como era e como se usava, achei que parecia ser bem mais confortável que os absorventes descartáveis e mais higiênico. Eu tinha assaduras por causa dos absorventes", explica.

Embora o produto tenha vindo à tona nos últimos anos, Monique lamenta os estigmas culturais. "Várias marcas de coletores têm páginas no Facebook e muitas mulheres comentam que acham nojento e anti-higiênico e isso é reflexo de uma educação repressora", pontua. 

Em muitas páginas sobre o assunto no Facebook, mulheres que já fazem uso do produto há mais tempo, se dedicam a repassar informações sobre como utilizar coletor menstrual, onde devem comprar e buscam atrair cada vez mais adeptas. Só a página 'Coletores Brasil - menstrual cups' já possui mais de 70 mil mulheres participantes.

O tabu com o corpo feminino, no entanto, ainda é um impedimento no uso do produto, aponta a operadora de telemarketing, Danielle Menezes, que começou a utilizar o coletor há dois meses. Para ela, desde a infância é ensinado que não devemos falar sobre menstruação em público. "As mulheres não têm o hábito de de conhecer seu corpo desde a adolescência, mas vejo algumas que são mais maleáveis a mudanças e acho que se o coletor fosse mais divulgado e acessível, elas se interessariam mais em experimentar", comentou. 

Com o desejo de tornar o produto mais conhecido entre as mulheres, a professora Petra Ramalho, de 39 anos, passou de ser apenas usuária e agora também revende o coletor na cidade de João Pessoa, na Paraíba. "Eu faço isso porque eu tenho prazer em colaborar para um futuro melhor para o nosso planeta. Não faço muito pelo lucro, mas pela necessidade de fazer mais mulheres da minha cidade conhecerem o produto", explicou.

Petra diz que muitas vezes só recebe o pagamento meses depois da entrega do produto. "Fico feliz em fazer outras mulheres que desejam comprar o coletor e não podem pagar no momento que recebem". Para ela, não apenas os estigmas culturais com relação aos fluidos do corpo feminino impedem a divulgação do produto. "Acho que é mais o desconhecimento quase completo do seu próprio corpo por parte das mulheres", afirma. 

Recentemente, a engenheira mecânica, Gisele Milanezi, 35 anos, optou por utilizar o "copinho" durante a menstruação para fugir dos anteconcepcionais. "Eu não menstruava por uso de contraceptivos hormonais por dez anos e estava pensando em descontinuar por causa de efeitos colaterais.Como sempre tive muito problema no uso de absorventes como alergias e assaduras e desconforto, resolvi dar uma chance ao coletor e isso mudou a minha vida", falou.

Feliz com a decisão libertadora, ela conta que pode utilizar o produto sem necessidade de troca durante o trabalho, sem preocupações com vazamentos e sem o incômodo do absorvente interno. "Ví que não preciso mais interromper de forma hormonal minha menstruação, ela não é mais um incômodo". 

Benefícios

Em uma pesquisa recente, a empresa Intimina, responsável pela produção de produtos de higiene íntima, perguntou a 1.500 mulheres sobre as mudanças após substituir o uso do absorvente comum pelo coletor menstrual. De acordo com os registros, uma em cada quatro mulher disse além de enxergar uma melhora na vida sexual ter  menos secura vaginal. Ainda segundo a pesquisa, um grupo de 62% afirmou sentir a diminuição do cheiro forte da menstruação. O odor é relacionado diretamente com o uso do absorvente porque o sangue entra em contato com o ar, diz a ginecologista e obstetra do Hospital da Mulher do Recife, Leila Katz, que também é usuária do coletor há pelo menos oito anos.

A médica explica que além da comodidade, da economia e de ser ecologicamente sustentável, o coletor menstrual também é mais higiênico. "Se a usuária seguir as regras de uso de forma contínua os benefícios serão inúmeros. O absorvente, que com a umidade pode levar à proliferação de bactérias e a infecções como a candidíase, as vezes pode ser muito prejudicial à saúde da mulher, diferente do coletor, que apesar de não ser algo de muitos estudos científicos, traz menos riscos", afirmou Leila.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o produto ainda não é regido por uma legislação sanitária específica no Brasil. Por meio de nota, a Anvisa informou que está trabalhando numa proposta de inclusão dos coletores menstruais no escopo regulamentar da Agência. "Estamos avaliando as características do produto para definir seu enquadramento e requisitos mínimos. Os critérios, quando publicados, serão válidos tanto para os produtos nacionais quanto para os produtos importados."

Para a ginecologista Leila Katz, a não oficialização de órgãos fiscalizadores prejudica a propagação do uso do coletor. "Isso dificulta muito o acesso das mulheres ao produto, às vezes não sabem onde podem comprar, por exemplo. No exterior, na maioria dos lugares, isso é vendido livremente em farmácia", argumenta a médica. Apesar disso, O InCiclo, um dos fabricantes do produto no Brasil, recebeu liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. De acordo com resoluções internas da Anvisa, o Departamento de Gerência de Tecnologia de Materiais de Uso em Saúde deferiu a liberação por não considerar o InCiclo um produto para saúde.

Além do impasse na legislação brasileira, a ginecologista também diz que muitas mulheres ainda enxergam como barreiras a manipulação do próprio corpo. Ela conta que muitas pacientes já contaram que têm medo de que o "copinho" entre na vagina e se perca lá dentro. "O coletor também é uma forma de autoconhecimento do corpo feminino porque muitas mulheres ainda tem informações equivocadas sobre o assunto. Eu já indiquei pra muitas pacientes e amigas". Para ela, quando a maioria das mulheres conhecer e se habituar com o uso do coletor menstrual, será libertador.  

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