Quase seis meses depois de entrega do relatório final da Comissão Nacional da Verdade que investigou as violações de direitos humanos durante o período da ditadura militar, o livro-reportagem Cova 312, da jornalista Daniela Arbex, comprova uma suspeita que se arrasta desde 1967. A obra, que será lançada no dia 18, em São Paulo, relata que o militante Milton Soares de Castro, integrante da Guerrilha de Caparaó, onde se instalou o primeiro (e frustrado) grupo de guerrilha pós-golpe militar de 1964, não cometeu suicídio, como indicava a versão oficial de sua morte.
Após mais de dez anos de investigação, a autora teve acesso ao inquérito do caso no Superior Tribunal Militar (STM) e, a partir dele, desconstruiu a farsa criada para encobrir o crime. O roteiro é muito parecido com os casos de Iara Iavelberg e Vladimir Herzog, ambos assassinados pelo regime em sessões de tortura, mas classificados pelos agentes da repressão como "suicidas".
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Os indícios de homicídio de Milton Soares eram tão fortes que, em 2007, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, ligada à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, publicou no livro Direito à Memória e à Verdade a versão de assassinato com base na primeira investigação conduzida por Daniela. Mas eram apenas indícios.
Foi a própria autora que, em 2002, descobriu os restos mortais de Milton Soares em um local que parecia óbvio, mas nunca foi procurado: o cemitério municipal de Juiz de Fora (MG), cidade onde estava localizado presídio de Linhares, local onde o militante estava preso.
"Em 28 de abril de 1967, o Exército avisou a família que Milton tinha se matado, mas nunca entregou o corpo. Enquanto negociavam a entrega dos restos mortais, ele já estava enterrado numa cova rasa destinados a indigentes em Juiz de Fora. Os familiares passaram anos insistindo", diz Daniela.
A manobra, porém, deixou um rastro: os documentos do militante nos registros do cemitério eram verdadeiros. Em 2002, a Comissão de Mortos e Desaparecidos tentou exumar o corpo, mas a família do guerrilheiro não permitiu, o que dificultou a investigação.
Com o inquérito do STM em mãos, Daniela teve acesso às fotos do corpo, perícias da cela onde ocorreu o crime e buscou os peritos que a fizeram a necropsia. Um dos que assinam o laudo, Luzmar Valentim Gouveia, recebeu Arbex e, diante do documento, descartou o suicídio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.