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Nesta quarta-feira (21), o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmaram que o Brasil não tem tantas pessoas com fome. Durante entrevista à emissora católica Rede Vida, o presidente relacionou a pobreza ao comodismo. 

Bolsonaro negou que mais de 33 milhões de brasileiros estejam passando fome, como expôs o estudo apresentado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), em julho. "Não é esse número todo", divergiu. 

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Na sua visão, as pessoas são pobres por estarem acomodadas. Outro motivo levantado pelo presidente seria a recusa do Estado em oferecer ensino profissionalizante.

"Agora, tirar as pessoas da linha da pobreza é um trabalho gigantesco. São pessoas que foram ao longo dos anos acostumadas a não se preocupar ou o estado negar uma forma de ela aprender uma profissão", sugeriu. 

Mais cedo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, também criticou o resultado da pesquisa durante um evento da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), em São Paulo. Ele afirmou que "33 milhões de pessoas passando fome é mentira" e ressaltou que o poder de compra foi preservado.  

“É impossível ter 33 milhões de pessoas passando fome. Por mais que tenha havido inflação, não foi três vezes mais. O poder de compra está mais do que preservado por essa nova transferência de renda”, rebateu. "Nós estamos transferindo para os mais pobres, com o Auxílio Brasil, 1,5% do PIB, três vezes mais do que recebiam antes", acrescentou o ministro. 

A insegurança alimentar está presente em mais da metade dos lares brasileiros. É o que aponta o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil – II VIGISAN, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – Rede PENSSAN. As regiões mais críticas são Norte (45,2%) e Nordeste (38,4%).

Segundo o levantamento, 65% dos domicílios impactados são chefiados por pessoas negras ou pardas e 64,1% têm mulheres como referência. Em relação à localização dos domicílios, a pesquisa destaca que mais de 60% dos que estão na área rural são afetados pela fome, ressaltando que agricultores familiares e pequenos produtores rurais são os mais debilitados.

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Atualmente, devido à queda na produção e ao alinhamento ao dólar, o país vive um período com a inflação em alta, o que é prejudicial à economia local. De acordo com o professor João Cláudio Arroyo, mestre em Economia, a dolarização do que é produzido no Brasil é algo contraditório, visto que os principais custos de produção são pagos em real.

“Existe uma inflação que é para melhorar a margem de lucro dos grandes acionistas internacionais, essa é uma opção política que o governo brasileiro adotou e que está depauperando (empobrecendo) a sociedade como um todo, mas, em particular, a classe média, que é quem vai ter maiores custos com esses insumos”, diz Arroyo.

O professor também destaca que mesmo com o aumento no preço dos produtos, os salários continuam os mesmos, resultando na diminuição das compras e, consequentemente, do faturamento dos empresários.

Como em um efeito dominó, essa situação ocasiona uma queda na contratação, o que contrasta com a baixa na taxa de desemprego que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, fechou em 10,5% no trimestre encerrado em abril.

“O desemprego é uma resposta ao número de pessoas que procura. Quando as pessoas se decepcionam e já nem procuram mais emprego, o desemprego cai. Não significa que gerou empregos. A maioria das pessoas não sabe disso, porque a gente tem que associar esses 10% de emprego aos 33 milhões de pessoas que passam fome no Brasil hoje aos mais de 15 milhões que estão com insegurança alimentar”, afirma.

Francisco Neto, historiador e professor, ressalta que o cenário atual revela a trajetória histórica que o Brasil vem percorrendo desde a chegada dos portugueses e as transformações ocorridas no território, como o período de escravidão. Sendo assim, o maior índice de insegurança alimentar nos lares onde os principais provedores são mulheres e pessoas negras ou pardas é um reflexo da ausência de políticas públicas pensadas e projetadas a elas.

“Se a gente levar em consideração, por exemplo, em 1970, quando muitos dados estatísticos do IBGE não apresentaram questões relacionadas a população negra no Brasil, isso vai refletir diretamente em muitos grupos sociais que são marginalizados historicamente”, pondera o historiador.

Insegurança alimentar: o que é e quais seus níveis?

A insegurança alimentar caracteriza-se pela falta de acesso físico, social e econômico irrestrito nas quantidades certas a alimentos de boa qualidade e é dividida em 3 níveis diferentes.

Leve: alimentação futura indefinida ou com qualidade duvidosa.

Moderada: redução na quantidade dos alimentos.

Grave: escassez de alimentos e fome.

O estudo da Rede PENSSAN mostra que 28% dos brasileiros vivem com insegurança alimentar leve, enquanto 15,2% e 15,5% estão nos níveis moderado e grave, respectivamente, totalizando 125,2 milhões de pessoas.

A necessidade de energia diária que o corpo humano possui é suprida por meio dos alimentos, que depositam no organismo carboidratos, proteínas, lipídios, minerais e vitaminas essenciais. Quando a alimentação é realizada da maneira incorreta, há um déficit nutricional que sucede em doenças como anemia e raquitismo.

A nutricionista e preceptora da Clínica Escola de Nutrição da Universidade da Amazônia – UNAMA, Marília Reis, considera que o investimento em políticas públicas e em programas sociais capazes de auxiliar pessoas com insegurança alimentar é o mais importante no momento. A nutricionista ressalta que as crianças são as mais afetadas com a situação.

“A criança precisa, devido ao seu desenvolvimento, principalmente a partir dos seus seis meses, que é quando começa a introdução alimentar, dessas fontes. Precisa consumir diariamente. As crianças estão inseridas nesse contexto, infelizmente, porque a família, muitas vezes, não tem o que comprar, não tem condições financeiras de arcar com algum suporte nutricional”, declara.

Por Amanda Martins, Lívia Ximenes e Clóvis de Senna

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