Os astrônomos dispõem pela primeira vez de uma imagem detalhada de um núcleo galáctico ativo, a estrutura de poeira e gás que envolve um buraco negro supermassivo e que é um dos objetos mais brilhantes do Universo.
O brilho deste núcleo ofusca o da galáxia NGC1068 - também chamada M77 - no centro da qual se esconde. Dois séculos depois de sua descoberta, os astrônomos liderados por Violeta Gamez-Rosa, da Universidade Holandesa de Leiden, desvendaram seu centro com riqueza de detalhes, em um estudo publicado nesta quarta-feira (16) na revista Nature.
Localizada a 47 milhões de anos-luz de distância, na constelação da Baleia, M77 é uma típica galáxia que abriga um núcleo ativo: um buraco negro supermaciço, de vários milhões de massas solares, cercado por um disco espesso de poeira e gás, e cuja absorção de matéria produz uma energia gigantesca.
Este núcleo existe para toda uma série de objetos extraordinariamente luminosos: quasares, blazares, galáxias do tipo Seyfert. Sua luminosidade alcança vários milhares de vezes a de uma galáxia inteira, de uma área tão "pequena" quanto o equivalente ao nosso sistema solar, observa um artigo da Nature que acompanha o estudo.
"Esta é a primeira vez que obtemos a imagem de coisa semelhante, que realmente vemos o coração de tal galáxia", explica à AFP o astrônomo do Observatório da Côte d'Azur, Bruno Lopez, diretor científico do MATISSE, o instrumento de análise do espectro luminoso que tornou esta imagem possível.
Instalado no Interferômetro do Very Large Telescope (VLTI) do Observatório Europeu Austral (ESO), localizado em uma montanha no Chile, o MATISSE observa o Universo no infravermelho médio.
"Jato de plasma"
Com este alcance de ondas e a precisão do instrumento, os astrônomos podem agora ver "como a matéria se organiza em torno do núcleo ativo, como alimenta o buraco negro, mas também como se organiza de acordo com a energia liberada, com os ventos, para formar estrelas", continua Bruno Lopez.
Graças a esta imagem e aos dados que a acompanham, a equipe internacional de astrônomos "deu um grande passo na compreensão do funcionamento dos núcleos galácticos ativos", diz Violeta Gamez-Rosa, citada num comunicado de imprensa do ESO.
A descoberta também ajudará "a entender melhor a história da Via Láctea, cujo buraco negro supermaciço abrigado em seu centro pode ter estado ativo no passado", segundo ela.
O buraco negro de M77, invisível por definição, é cercado por dois discos de gás e poeira, que sua força gravitacional aglomera enquanto o absorve, em um disco de luz.
Do centro do núcleo brota em cada polo um jato de plasma - partículas ionizadas -, dando ao conjunto a aparência de um pião. E também nuvens de poeira e gás "que parecem fontes de matéria, rejeitadas nos lóbulos da galáxia", explica Lopez.
Com MATISSE, os astrônomos agora aumentarão suas observações de outros núcleos galácticos ativos e estudarão nuvens de poeira.
Já detectaram nos de M77 grandes proporções de silicatos, semelhantes aos que compõem principalmente a crosta terrestre, e vestígios de hidrocarbonetos. Este carbono é de grande interesse ainda mais porque é o quarto maior constituinte do Universo.