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Como já diz a sabedoria popular, a única certeza que temos nesta existência é de que um dia vamos morrer. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, cerca de 3.500 pessoas morrem diariamente no Brasil e, ainda de acordo com o órgão, dentro de 28 anos o país terá mais mortes do que nascimentos anualmente. Esses números garantem a manutenção de um segmento que desconhece o significado da palavra crise - o funerário -, que fatura até R$ 7 bilhões por ano, segundo o Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep).

Com clientela permanente - e numerosa - este mercado precisa estar atento às demandas e necessidades de quem atende. Os modelos de funerária com caixões, ou melhor, urnas, simplórias, e cemitérios 'gelados' e cavernosos estão ultrapassados. A tendência atual do segmento é humanizar ao máximo o processo de luto dos que ficam, prestando um serviço cada vez mais personalizado, leve e, em alguns casos, bastante luxuoso.

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Para dar conta das novidades, o mercado funerário conta com uma grande quantidade de feiras e exposições dentro e fora do Brasil, relacionadas a esse universo. Nelas, empresários e profissionais do ramo se atualizam acerca dos novos modelos, estilos e formatos existentes para velórios e sepultamentos e os importam a partir da compatibilidade com a cultura de cada país. Nesses eventos, é possível encontrar opções das mais variadas e inusitadas, como urnas com glitter, produzidas pela empresa inglesa The Glitter Cofin Company; e as cerimônias que velam o morto como se ainda estivessem vivos, como os realizados pela Funerária Marín, de Porto Rico. 

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No Brasil, a tendência que está dominando o mercado é a do 'menos é mais'. As empresas estão buscando maior leveza para velórios e sepultamentos, sem contar na busca pela personalização dos serviços. Os cemitérios, sobretudo os particulares, também estão buscando tornar-se locais mais agradáveis oferecendo paisagens de muito verde em um ambiente de bastante tranquilidade.

Esse é o conceito de 'cemitério parque', empregado no Morada da Paz, cemitério do Grupo Vila, localizado em Paulista, Região Metropolitana do Recife. O lugar conta com 150.000 m², nos quais estão espalhados jardins, árvores e fontes que compõem o que eles chamam de “Campo Santo”, o local onde são sepultados os corpos. Os jazigos são sinalizados com pedras de mármore para que tenham maior leveza e elegância. Além disso, o espaço é pet friendly e é possível visitar os seus acompanhado pelo animalzinho de estimação. 

Paulyana Beltrão é supervisora administrativa do cemitério e há 11 anos trabalha no segmento. Ela começou como cerimonialista fúnebre e já acompanhou muitas mudanças no que diz respeito a velar e sepultar. "Eu comecei em 2008, quando eu botava no Google: 'cerimonialista fúnebre', não aparecia nada, era uma coisa nova. Fui a primeira no Grupo Vila, era tudo novo, a gente foi construindo (o trabalho)  de acordo com as necessidades das famílias". 

Ela explica que de lá para cá, a função do cerimonial se tornou quase indispensável e são esses profissionais que cuidam de todos os detalhes na hora de organizar e realizar as cerimônias de despedida. A personalização do serviço, formatando os velórios de acordo com o que cada cliente deseja, é o que pede o mercado atual. "A gente sabe que em uma cerimônia fúnebre preparada de acordo com o que a família pediu, a gente vai ser um facilitador do processo de luto. O feedback dessas famílias é algo maravilhoso", diz Paulyana. 

Paulyana trabalha no mercado funerário há 11 anos. Foto: Júlio Gomes/LeiaJá Imagens

A humanização na despedida dos entes queridos é buscada nos menores detalhes e ao longo de todo o processo. Para isso, são criados ambientes com tons neutros, mobília confortável e espaço de convivência para os visitantes, onde pode ser servido um coffee break. No Morada da Paz, uma sala específica, com banheiros privativos, área de integração e de estar, além de espaço mais reservado para a colocação da urna, foi criada pensando em oferecer maior privacidade e comodidade aos clientes. Segundo Paulyana, essa tendência é recente e foi trazida da Europa. "Querendo ou não, é um encontro social, é um momento de se amparar, mas também há muito papo colocado em dia, as pessoas se reencontram e conversam", explica. A sala não tem qualquer paramentação religiosa mas isso pode ser revertido caso seja do desejo da família.

No Grupo Baptista, localizado no bairro de Santo Amaro, região central do Recife, as salas de velório seguem modelo parecido. Pintadas em cores claras, com sofás confortáveis e climatização, elas também contam com telões que podem exibir mensagens espirituais ou fotos do falecido, tudo acompanhado por música neutra ou religiosa. “A gente procura montar sempre um ambiente leve para que as pessoas fiquem mais tranquilas e confortáveis, é a tendência do mercado. O menos nessa hora ele se torna mais”, explica Herton Viana, proprietário da empresa. 

O grupo é remanescente da Casa Baptista, funerária com mais de 100 anos que funcionou na capital e acabou se desmembrando. Herton tem mais de duas décadas atuando no segmento funerário: "Quando eu cheguei, há uns 22 anos, a gente ainda fazia aquelas urnas roxa, preta, branca - eram no máximo quatro cores. Não tinha a variedade que a gente tem hoje", diz em referência à diversidade do mercado atual. 

Essa variedade pode ser encontrada não só nos serviços oferecidos como também nos produtos. As urnas funerárias, os caixões, vão do mais simples ao mais luxuoso, acompanhados pelos valores que podem ir de R$ 1.500 a R$ 17 mil, em diante. Elas vêm em cores e formatos variados, podendo ter escudo de time de futebol, bandeira LGBT, pinturas perolizadas, brilhantes cravados, tamanhos especiais para pessoas obesas  e interior confortável revestido de veludo, rendas e cetim. Sem esquecer do acolchoamento no fundo e o travesseiro. Em algumas indústrias, os modelos são desenvolvidos a partir de conceitos que vão do “glamour” ao “requinte francês” com destino a pessoas que foram “símbolo de liderança”, que “transcenderam” ou ainda as que tiveram uma “trajetória de proteção e união” em vida. 

Herton está há mais de 20 anos no segmento. Foto: Júlio Gomes/LeiaJá Imagens

Para quem opta pela cremação, o mercado também dispõe de grande variedade de modelos. As urnas podem ser biodegradáveis - podendo ser cultivadas em vasos e jardins -, de madeira, de bronze, e até assinadas por renomados artistas plásticos, como as desenhadas pelo pernambucano Ricardo Brennand para o Morada da Paz. Também é possível guardar as cinzas de um ente querido em pequenos pingentes em formatos diversos que podem ser levados em colares ou pulseiras. Essas urnas podem ser mais acessíveis, com preços começando em R$ 500. Já as desenvolvidas por Brennand saem pelo valor de R$ 4.000. 

A cremação também é uma tendência que vem crescendo no país. Nos últimos 20 anos, o número de crematórios aumentou em 1.000 %. Os motivos que levam uma família a cremar o seu falecido são os mais diversos, os custos, um pouco menores que os de um sepultamento tradicional, costumam pesar na hora da escolha. Os donos de pet já contam com o serviço em alguns lugares do Brasil e para os animaizinhos também há pompas e circunstâncias na hora do adeus final. 

No entanto, o Nordeste ainda não prioriza essa opção. Segundo Paulyana Beltrão, no cemitério em que ela trabalha apenas 27% dos serviços são os de cremação. Apesar disso, já há uma preocupação em atender de forma confortável os clientes que escolhem essa maneira de se despedir. No Morada da Paz, a cerimônia de cremação envolve homenagens ao falecido com projeções de vídeos e música, chuva de pétalas  e na hora da entrega das cinzas uma sala especial é usada para que a família possa reviver a emoção da despedida. 

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Funeral personalizado

A personalização de velórios e sepultamentos é tendência absoluta no mercado atualmente. O objetivo dos chamados profissionais do luto - pessoas que trabalham em função dos que já se foram e seus familiares - é transformar cada despedida em um momento especial, realizada exatamente como deseja cada cliente. Para isso, agentes funerários e cerimonialistas precisam estar atentos às necessidades de cada família para transformar o momento do adeus em algo marcante e o menos doloroso possível.

"Antigamente se vendia o caixão, botava o corpo e ia pro cemitério, hoje não, hoje a gente faz uma homenagem a quem está partindo e aos familiares. A mudança do nosso segmento foi bem considerável", diz Herton Viana, que relembra de uma vez em que precisou mandar fabricar em uma indústria do Rio Grande do Sul uma urna roxa para atender ao último pedido de uma cliente.  

Os cerimonialistas ficam responsáveis por todo o processo do funeral, do começo ao fim. Eles preparam discursos, ornamentam salas e capelas e, em alguns casos, até mandam produzir camisas em homenagem ao morto, posts em redes sociais e o que mais a família pedir. Tudo é feito de acordo com os gostos e preferências que o falecido tinha em vida para que o último contato dos familiares seja percebido como uma celebração de sua passagem nesta existência.

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Os profissionais que fazem a necromaquiagem também se esforçam para dar ao momento um outro colorido. Eles fazem escova nos cabelos, reconstroem partes do rosto se preciso e colocam o perfume preferido do morto no corpo. As estratégias, na verdade, são voltadas para os vivos, que a partir delas acabam passando pelo momento de forma mais confortável e acolhedora. 

"Preparar uma cerimônia fúnebre é uma caixinha de surpresa. Quando a  gente pensa que já viu tudo a família vem e pede coisas que a gente nunca pensou", diz Paulyana. Ela conta que, certa vez, a irmã de um artista plástico falecido pediu que fossem misturadas às suas cinzas um pouco de glitter. A purpurina e a cinza seriam colocadas em um quadro feito pelo morto como última homenagem. 

Profissionais do luto

Cerimonialistas e agentes funerários trabalham para atender todos os pedidos dos familiares. Foto: Júlio Gomes/LeiaJá Imagens

Entender o luto com um processo maior e mais profundo é importante para que agentes, cerimonialistas, atendendentes e demais profissionais do ramo possam oferecer um melhor serviço. A partir dessa compreensão, o mercado vem adequando seus produtos e serviços para que despedir-se torne-se uma experiência menos traumática e dolorosa. "Nós somos a extensão de cada família, nós precisamos fazer uma leitura da dor dela para atender suas necessidades", diz Herton. 

Apesar do tabu que ainda existe na sociedade em relação a esses lugares, como cemitério e funerária, e serviços, as pessoas que se dedicam a esse ramo, no entanto, não se detém a isso. Eles se vêem como "servidores" e entendem a importância do seu ofício como sendo ferramentas de apoio aos que estão passando por um momento de sofrimento. "A gente tem a guarda de pessoas muito especiais para os seus, é uma responsabilidade e é muito importante. É entender a dor do outro e fazer o possível para que aquilo se torne mais leve", sintetiza Paulyana.  

 

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