Divulgado no início desta semana, um levantamento realizado pelo Repórteres Sem Fronteiras (RSF) em conjunto com o Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS-Rio) registrou meio milhão de tuítes contendo ataques à imprensa entre os meses de março e junho deste ano. De acordo com o documento, cerca de 20% do total foram publicados em contas com alta probabilidade de comportamento automatizado, ou seja, robôs.
O estudo também observou um maior engajamento ligado a grupos de usuários que apoiam as ações do governo federal nas redes. Jornalistas do gênero feminino, juntamente com grupos de comunicação considerados críticos da gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), são os alvos preferenciais dos ataques.
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O território de hostilidades foi mapeado através do monitoramento das hashtags mais frequentes na rede social, que foram: #imprensalixo, #extremaimprensa, #globolixo, #cnnlixo e #estadaofake. Ademais, episódios de assédio contra perfis de alguns jornalistas, a exemplo de Maju Coutinho (Rede Globo), Daniela Lima e Pedro Duran (CNN Brasil), Mariliz Pereira Jorge, colunista da Folha de São Paulo, e Rodrigo Menegat (DW News) também foram notificados.
Na prática, a quantidade de tuítes mencionando jornalistas do gênero feminino foi até 13 vezes maior que aqueles fazendo referência aos homens da mesma área. Em 10% das publicações estavam presentes termos ofensivos e palavrões como safada (o), vagabunda (o), puta (o), ridícula, idiota, arrombada (o) e imbecil. Vale ressaltar ainda que a incidência dos xingamentos foi 50% maior entre as profissionais mulheres.
Robôs que disseminam ódio
Ainda segundo a pesquisa da RSF, a utilização de contas automatizadas indica a existência de mobilizações orquestradas, ou seja, programadas, com o objetivo de ampliar artificialmente os ataques ao jornalismo. A identificação dos interlocutores também sugestiona o financiamento dos ataques e capacidade técnica mobilizada para promover um ambiente de descrédito à imprensa nas redes sociais.
“A utilização de robôs multiplica o alcance nas redes em torno de determinados assuntos, criando uma percepção falsa de uma adesão maior do que a real sobre determinadas posições ao estimular artificialmente um efeito de manada”, explica a publicação.
A investigação, inclusive, abre espaço para que seja possível entender o posicionamento ideológico dos usuários mais populares. Ao contabilizar as 150 hashtags mais compartilhadas pelos perfis que interagiram com as cinco hashtags contra a imprensa citadas anteriormente, os temas que mais aparecem são o apoio ao voto impresso, críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à CPI da Pandemia.
Na lista dos perfis monitorados, chamam a atenção as contas oficiais do próprio presidente Jair Bolsonaro (sem partido), do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) e do deputado estadual de Minas Gerais Bruno Engler (PRTB).
Histórico de agressões que começa no Executivo
Ainda no ano passado, a RSF havia monitorado o discurso da família Bolsonaro, de ministros, do vice-presidente Hamilton Mourão e da própria Secretaria Especial de Comunicação Social da presidência. Juntos, eles fizeram 580 ataques, sendo 85% deles de autoria exclusiva do chefe do Executivo e seus três filhos com cargos eletivos.
Já em 2021, só no primeiro semestre, a organização documentou 331 ataques, partindo da mesma metodologia, considerando sobretudo agressões morais, xingamentos e exposição de jornalistas e veículos de comunicação de maneira vexatória em declarações públicas, entrevistas e postagens em redes sociais.
O Brasil ocupa a 111° colocação no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa 2021 elaborado pela Repórteres sem Fronteiras, tendo entrado para a zona vermelha do Índice pela primeira vez. Em 2 de julho deste ano, a RSF incluiu o presidente Bolsonaro em sua lista global de predadores da liberdade de imprensa.