Tópicos | Justiça por Miguel

A data em que completa três da morte do menino Miguel Otávio, foi marcada por um protesto nas ruas da capital pernambucana. O ato realizado na tarde desta sexta-feira (2), contou com a participação da família do garoto, movimentos sociais e lideranças políticas locais, que pedem urgência na conclusão do processo judicial.

Em junho de 2020, Miguel caiu do nono andar de um edifício de luxo, chamado Píer Maurício de Nassau, no bairro de São José, região central do Recife, após ser abandonado em um elevador de serviços por Sarí Corte Real, a ex-patroa de Mirtes Renata Santana, mãe do garoto.

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''Hoje estamos aqui marcando os três anos sem o meu filho, e hoje também se completa 1 ano e 2 meses em que a condenação saiu e Sarí recorre em liberdade. Ela está vivendo a vida dela como se nada tivesse acontecido, então a gente não pode parar enquanto ela não estiver atrás das grades. Ela cometeu um crime contra uma criança e tem que ser presa'', afirmou Mirtes.

Créditos: Júlio Gomes/LeiaJá

A avó do menino, Marta Alves, pontua que a negligência de Sarí contra Miguel, deve ser enxergada como um caso de racismo. ''Foi racismo e maldade, pois quando ela apertou o botão do elevador, ela colocou Miguel para a cobertura do edifício. Ela poderia ter apertado para o térreo, onde a mãe dele estava. Ela cometeu um crime e tem que pagar. Até mesmo pessoas que cometem crimes de menor potencial, são presas, então por que ela não é presa? Só por ser branca?'', questiona.

Marta revezava com a filha, Mirtes, no trabalho como empregada doméstica na casa de Sarí, mulher do ex-prefeito do município de Tamandaré, Sérgio Hacker (PSB-PE). No momento da tragédia, a mãe do garoto estava passeando com o cachorro da família na parte térrea do prédio.

O comunicador e integrante da Articulação Negra de Pernambuco, Igor Travassos, diz que o caso é um exemplo do ''reflexo de uma sociedade que não enxerga crianças negras como merecedoras de carinho e de cuidado''.

''Se fosse ali o filho ou a filha da amiga de Sarí, ela não teria aquele mesmo comportamento de simplesmente deixar uma criança no elevador a própria sorte. A gente está falando de uma criança de cinco anos de idade, uma criança negra, que foi colocada ali'', disse Igor.

No ato foi possível observar outras pessoas falando sobre questões raciais que circundam o caso. A assistente social Jarda Araújo, disse que o caso Miguel é um exemplo preocupante entre tantos outros que acontecem no Brasil. ''Esse ato mostra que o Recife é aliado a luta das empregadas domésticas e de mulheres negras como a mãe e a avó de Miguel. O que aconteceu com Mirtes, talvez esteja acontecendo com outras mulheres. Não podemos fechar os olhos para essa realidade'', pontuou.

Em entrevista, a advogada Maria Clara D’Ávila, assistente de acusação, lamentou a narrativa adotada pela defesa de Sarí, que tentou culpar o próprio Miguel pela sua morte, alegando que a sua mãe não soube educá-lo.

''A construção do argumento da defesa era no sentindo de desatribuir totalmente a responsabilidade de Sarí sobre os cuidados que ele exercia com Miguel no momento dos fatos, e atribuir essa própria responsabilidade ao Miguel e a própria família de Mirtes e Marta. É uma argumentação racista que busca adultizar uma criança e, tirar a reponsabilidade de Sarí''.

Lideranças políticas comentaram sobre o caso

A deputada estadual Dani Portela (PSOL-PE), que esteve no ato, relembrou que a morte de Miguel foi durante um período crítico da pandemia do Covid-19, no qual a população era incentivada a ficar em casa para se proteger, porém ''Mirtes, assim como outras mulheres, não pode ter esse direito''.

''Nem mesmo quando Mirtes foi contaminada pelos patrões por covid ela foi dispensada do trabalho. Como as escolas e creches tinham fechado, Mirtes não tinha uma alternativa senão trazer Miguel para o trabalho. E, quando Mirtes entregou o cuidado de sua criança para Sarí, ela não esperava que a patroa não cuidaria dele'', disse a parlamentar.

O vereador da cidade de Olinda, Vinícius Castello (PT-PE), falou da importância da luta da família por pedido de justiça. ''O protagonismo de Mirtes como mulher negra, vem enfrentando toda uma estrutura política e sistemática que privilegia pessoas que sempre tiveram privilégios, por serem ricas e brancas''.

Créditos: Júlio Gomes/LeiaJá

No ano passado, um projeto apresentado pelo vereador na Câmara Municipal de Olinda, instituiu o Dia Menino Miguel. A casa legislativa foi a primeira do país a realizar a homenagem.

A ex-deputada estadual pelo estado, Jô Cavalcanti (PSOL-PE), disse durante o ato que a manifestação mostra ao Brasil o quanto Pernambuco deseja respostas sobre o caso. ''Esse ato de hoje cobra respostas. O movimento de hoje cobra respostas da justiça, algo que a família de Miguel vem tanto querendo.''

Outra liderança que também esteve presente no protesto foi a secretária de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, Lucinha Mota. Ela é reconhecida por sua luta por justiça após o assassinato da filha Beatriz em 2015, que tinha sete anos de idade, no colégio em que estudava no município de Petrolina, sertão do estado.

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