O portal LeiaJá vem acompanhando de perto o caso do ataque de tubarão que resultou na morte da estudante Bruna da Silva Gobbi, 18 anos, na tarde dessa segunda-feira (22). Nesta terça-feira (23), realizamos uma entrevista com a presidente do Comitê Estadual de Monitoramento de Inciedentes com Tubarão (CEMIT), a professora Dra. Rosângela Lessa, que analisou o caso e também respondeu a outras questões relacionadas aos ataques, que vem acontecendo desde 1992, sendo este o 59º caso. Confira abaixo:
O que a senhora acredita que aconteceu no caso?
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Na verdade houve uma confluência de fatores negativos. Uma delas sem dúvida foi a imprudência da jovem, que é inerente à sua idade. Ela não ouviu o conselho dos bombeiros. Entendemos que a pessoa vem de fora para conhecer o Recife e fica sem querer sair da água morna, mas foi uma imprudência. Elas foram alertadas.
Além disso, temos a época de chuvas. O material trazido pelos rios deixa a água turva, que é o habitat preferido dos cabeças chatas. Há também a maré alta da lua cheia, que inclusive está explicado nas placas afixadas na orla. Naquela hora a maré estava com 1,70m e o retorno da corrente é muito forte e as arrastou e provocou inclusive o afogamento.
Este ataque muda os planos do CEMIT para os próximos anos?
É evidente que teremos uma reunião depois deste episódio extremamente indesejado, tanto para os familiares dela, que perderam a filha, quanto para a cidade do Recife, que passa a ser ainda mais estigmatizada.
Já recebemos algumas sugestões como a proibição de banho em determinados horários e dias e o aumento da divulgação dos riscos e hotéis e aeroportos, com panfletagem.
Que tipo de estudos vem sendo feito atualmente e quais as soluções pensadas pelo órgão e pelo governo a respeito dos ataques?
Desde o início das atividades que o CEMIT foca suas ações na educação ambiental, que busca orientar as pessoas sobre os riscos. Além disso capturamos tubarões que estão mais próximos da beira-mar e os levamos para o alto mar. Em 20 anos, foram 291 animais transferidos, o que é um número que é proporcional à população de tubarões da nossa orla, considerada pequena.
E as medidas que podem evitar isso, como as redes?
Estas foram soluções propostas por grupos informais e que não tem nenhum embasamento científico. Estas pessoas defendem que deveria haver uma rede do Carmo, em Olinda, até a Praia do Paiva, o que é tecnicamente impossível. Além disso, causaria um grande desequilíbrio ambiental, pois mataria outros animais como tartarugas e peixes-boi. Os representantes de projetos que monitoram estes animais inclusive participam das reuniões do CEMIT e mostram preocupação com o simples fato de se pensar nestas redes.
Que providências foram tomadas em outras localidades que tem este mesmo problema?
Nos Estados Unidos, onde são registrados 50 ataques por ano – aqui foram 59 ataques em 21 anos – jamais foi cogitada o uso destas redes. Eles simplesmente baseiam suas ações em educação. Avisam e cada pessoa assume o próprio risco. É preciso acreditar que as pessoas podem ser educadas.
As redes foram colocadas na África do Sul e hoje querem retirar e não podem. Criou-se um desequilíbrio ambiental, mas a população é totalmente dependente e não é possível reverter isto. Há inclusive um site desta campanha de retirada.
Depois de tantos anos de estudo é possível dizer finalmente qual foi o real motivo dos ataques terem começado no Recife?
Há uma confluência de fatores, entre elas o porto e o tráfego marítimo.
* A professora Dra Rosângela Lessa é Presidente do Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (CEMIT) e professora do Departamento de Pesca e Aquicultura da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Responsável pelo Laboratório de Dinâmica de Populações Marinhas (DIMAR), atuando em Dinâmica de Populações e Avaliação de Estoques de Peixes Elasmobrânquios (Tubarões e raias) e Teleósteos. Possui graduação em Oceanologia, pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande (RS), doutorado em Oceanographie Biologique e Doctorat d'État na Université de Bretagne Occidentale , Brest (França), pós doutorado no RRAG, Imperial College do Reino Unido(UK) em 1988.