O maior volume de investimentos paralisados no Brasil por conta do custo do gás está nos setores de química e petroquímica. Em 2010, a Abiquim, entidade representante da indústria química, estimou em estudo que a demanda anual por produtos químicos cresceria de US$ 145 bilhões, naquele ano, para US$ 260 bilhões, em 2020. Isso justificaria US$ 167 bilhões em investimentos, caso a demanda fosse atendida por produção nacional.
Três anos depois, já é possível dizer que a previsão não está se concretizando. Os investimentos na indústria química atualmente estão entre US$ 4 bilhões e US$ 5 bilhões ao ano, muito aquém dos US$ 16 bilhões a US$ 17 bilhões anuais projetados para atender a demanda no estudo de 2010. "Caso a indústria nacional não consiga atender à demanda, o que deve ocorrer é a explosão da importação", disse a diretora de Economia e Estatística da Abiquim, Fátima Giovanna Coviello Ferreira.
##RECOMENDA##Segundo ela, "infelizmente", a perspectiva de preços baixos em gás nos Estados Unidos começa a atrapalhar investimentos, num processo que já vinha ocorrendo por causa da falta de competitividade do Brasil. No ano passado, o setor registrou déficit comercial de US$ 28 bilhões, de acordo com dados da Abiquim. Em 2005, foi de US$ 7,9 bilhões.
A Braskem adiou para 2014 a decisão de entrar ou não no complexo petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) em associação com a Petrobrás, um investimento não divulgado, mas que certamente exigirá alguns bilhões de dólares. A presidente da Petrobrás, Graça Foster, já afirmou que está preocupada com os efeitos da competição com o gás americano no setor petroquímico.
Enquanto isso, a Braskem anunciou em dezembro do ano passado um investimento de US$ 3,2 bilhões em uma fábrica de etileno no México a ser inaugurada em 2015. O projeto receberá empréstimos de US$ 623 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e tem a expectativa de criar 9 mil empregos locais. A página da companhia anuncia o empreendimento como o mais moderno das Américas.
Fontes da área petroquímica da Petrobrás não acreditam que a Braskem entre no Comperj sem ajuda do governo, inclusive para baixar o preço do gás. Atualmente, a rentabilidade do negócio medida pelo método do valor presente líquido (VPL) está negativa. Portanto, do jeito que está, a Braskem dificilmente participará do Comperj.
A Dow e a Mitsui informaram que vão postergar a segunda fase de sua joint-venture na Santa Vitória Açúcar e Álcool S.A., uma unidade de produção planejada para a fabricação de biopolímeros a partir da cana-de-açúcar, na cidade de Santa Vitória, em Minas Gerais. Segundo uma fonte do setor, o investimento seria de US$ 1 bilhão. A Dow decidiu investir no desenvolvimento de gás de xisto em diferentes regiões, por entender ser "uma oportunidade muito atrativa de negócio".
"A decisão de adiar a segunda fase da joint-venture é movida principalmente por um aumento dos custos de projeto, construção e operação das instalações, assim como pelas incertezas em torno da legislação de propriedade de terra no Brasil", disse a empresa, em nota.A Unigel, que atua em fertilizantes, plásticos e embalagens, teria parado a unidade de São José dos Campos (SP), concentrando a produção na fábrica do Guarujá.
Produtos
A Abiquim está elaborando estudo sobre em quais produtos químicos a importação pode ter maior impacto sobre a indústria nacional. O tamanho da ameaça do aumento de competitividade da indústria dos Estados Unidos já pode ser verificada na fabricação de eteno. Segundo Fátima, nos próximos três anos estima-se uma ampliação da capacidade instalada norte-americana em 11 milhões de toneladas por ano - atualmente, está em cerca de 27 milhões de toneladas/ano. Hoje, a capacidade de produção de eteno no Brasil é de 4 milhões de toneladas/ano.
Ainda assim, a Abiquim trabalha com uma perspectiva muito mais sombria. Com os EUA independentes energeticamente, pode haver uma retomada da indústria de transformação norte-americana por causa do gás mais barato, o que alteraria completamente a organização das cadeias globais de produção. "Nosso medo maior é o Brasil importar produto acabado", disse Fátima. Nesse caso, a indústria química brasileira perderia a demanda.