Uma pesquisa lançada em março desse ano pela Enegrecer a Política, mostrou o comportamento do eleitorado recifense nas disputas municipais de 2022. Entre as capitais que participaram do levantamento, Recife foi identificada como a capital com o maior número de eleitores que declararam já ter votado em candidaturas negras.
O Enegrecer a Política tem como principal foco de atuação, promover a discussão sobre a baixa representatividade negra nas esferas públicas, espaços de poder e decisão, além de estimular a criação de estratégias que visam fortalecer essa presença.
##RECOMENDA##Diante esses dados, o LeiaJá entrevistou Renato Aquiles, um jovem morador do bairro do Vasco da Gama, na Zona Norte do Recife. O estudante de arquitetura faz questão de confessar sua preferência em votar nos candidatos negros do município e do estado, além disso, afirma que ''a maior parte da população se identificar como negra, então existe a necessidade de que os postos políticos sejam ocupados por pessoas desse perfil''.
''Pernambuco tem um viés de luta e história negra, que é muito ativo. E isso me instiga bastante de querer participar e votar nessas pessoas, porque eu acredito muito no que elas estão fazendo. Eu acompanho algumas delas há muito tempo. Algumas acompanho pelo Instagram, e através das notícias. Consigo entender melhor o que elas fazem. Me sinto muito próximo delas dessa forma, através de suas atuações nas redes sociais e nos jornais. E consigo confiar mais nessas pessoas pois elas saíram da mesma realidade que a minha. Ela tem uma ótica da sociedade, que é parecida com a minha’’, disse.
Entre os políticos citados por Renato, estão os nomes da deputada estadual Dani Portela (PSOL-PE) e do professor de história, Jones manoel (PCB-PE). ''Pernambuco é um estado que nas últimas eleições leque de opções de candidaturas negras'', afirmou.
Deputada estadual Dani Portela (PSOL) - Foto: Roberto Soares/ALEPE
Porém, segundo a pesquisa, o desconhecimento das candidaturas negras ainda é o principal motivo para a população não votar nestas candidaturas. Na capital pernambucana, 16% da amostra declara que desconhecia as candidaturas; 2% não acredita na política; 2% afirmaram que é a primeira eleição que participa; 1% não vota por cor e 1% não gosta de pessoas negras. De acordo com o dossiê, a falta de conhecimento pelos eleitores sobre as candidaturas negras é consequência da falta de investimento na disputa eleitoral com as demais. De acordo com a Educafro, em 2022, os partidos repassaram menos recursos a candidatas negras, estas receberam 41,8% das verbas mesmo estando em maior número, enquanto as não negras receberam 58,2%.
Entre as motivações para votar em pessoas negras na cidade, 48% do público apontou que se baseia na pauta política dos candidatos e candidatas, 27% priorizam a trajetória dos representantes políticos e 26% analisam a agenda de campanha.
Para a cientista política Letycia Raila, mesmo o Brasil tendo mais da metade da sua população declarada como negra, ainda existem barreiras estruturais que dificultam que essas pessoas cheguem a cadeiras maiores. ‘’Fazer campanha é muito caro. Você precisa ter um círculo que te favorece. Isso não só financeiramente falando, mas em termos de influência também. E para que você consiga ter um Apoio, né? Então, às vezes, pela característica estrutural do Brasil, a população negra nem sempre está em sua maioria nesses círculos. Então, infelizmente a gente tem grande parte da população negra vivendo abaixo da linha da pobreza, sem acesso à educação de qualidade e sem acesso a uma segunda língua, por exemplo. E a política ela acaba sendo bastante personalista em alguns momentos. Então essa própria barreira estrutural impede que pessoas negras cheguem a cargos do executivo’’, afirma.
Câmara dos vereadores do Recife - Foto: Beto Figueiroa/Ivan Moraes/Flickr
A estudiosa também falou dos preconceitos enfrentados por candidatos negros na disputa eleitoral. ''A gente vive numa sociedade racista que impede que as pessoas confiem 100%. Você como candidato negro precisa demonstrar às vezes o dobro, o triplo, o quádruplo da sua competência para que as pessoas validem o seu trabalho''.
Mesmo com um cenário político de bastante dificuldades, Letycia Raila enxerga alguns avanços nos direitos de candidatos negros no país. A cientista política destaca a função das cotas raciais nas eleições, que diminuem as desigualdades na representação de raça na política institucional. As eleições de 2022 foi a primeira a garantir esse direito para políticos negros.