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Uma pesquisa lançada em março desse ano pela Enegrecer a Política, mostrou o comportamento do eleitorado recifense nas disputas municipais de 2022. Entre as capitais que participaram do levantamento, Recife foi identificada como a capital com o maior número de eleitores que declararam já ter votado em candidaturas negras.

O Enegrecer a Política tem como principal foco de atuação, promover a discussão sobre a baixa representatividade negra nas esferas públicas, espaços de poder e decisão, além de estimular a criação de estratégias que visam fortalecer essa presença.

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Diante esses dados, o LeiaJá entrevistou Renato Aquiles, um jovem morador do bairro do Vasco da Gama, na Zona Norte do Recife. O estudante de arquitetura faz questão de confessar sua preferência em votar nos candidatos negros do município e do estado, além disso, afirma que ''a maior parte da população se identificar como negra, então existe a necessidade de que os postos políticos sejam ocupados por pessoas desse perfil''.  

''Pernambuco tem um viés de luta e história negra, que é muito ativo. E isso me instiga bastante de querer participar e votar nessas pessoas, porque eu acredito muito no que elas estão fazendo. Eu acompanho algumas delas há muito tempo. Algumas acompanho pelo Instagram, e através das notícias. Consigo entender melhor o que elas fazem. Me sinto muito próximo delas dessa forma, através de suas atuações nas redes sociais e nos jornais. E consigo confiar mais nessas pessoas pois elas saíram da mesma realidade que a minha. Ela tem uma ótica da sociedade, que é parecida com a minha’’, disse.

Entre os políticos citados por Renato, estão os nomes da deputada estadual Dani Portela (PSOL-PE) e do professor de história, Jones manoel (PCB-PE). ''Pernambuco é um estado que nas últimas eleições leque de opções de candidaturas negras'', afirmou.

Deputada estadual Dani Portela (PSOL) - Foto: Roberto Soares/ALEPE

Porém, segundo a pesquisa, o desconhecimento das candidaturas negras ainda é o principal motivo para a população não votar nestas candidaturas. Na capital pernambucana, 16% da amostra declara que desconhecia as candidaturas; 2% não acredita na política; 2% afirmaram que é a primeira eleição que participa; 1% não vota por cor e 1% não gosta de pessoas negras. De acordo com o dossiê, a falta de conhecimento pelos eleitores sobre as candidaturas negras é consequência da falta de investimento na disputa eleitoral com as demais. De acordo com a Educafro, em 2022, os partidos repassaram menos recursos a candidatas negras, estas receberam 41,8% das verbas mesmo estando em maior número, enquanto as não negras receberam 58,2%.

Entre as motivações para votar em pessoas negras na cidade, 48% do público apontou que se baseia na pauta política dos candidatos e candidatas, 27% priorizam a trajetória dos representantes políticos e 26% analisam a agenda de campanha.

Para a cientista política Letycia Raila, mesmo o Brasil tendo mais da metade da sua população declarada como negra, ainda existem barreiras estruturais que dificultam que essas pessoas cheguem a cadeiras maiores. ‘’Fazer campanha é muito caro. Você precisa ter um círculo que te favorece. Isso não só financeiramente falando, mas em termos de influência também. E para que você consiga ter um Apoio, né? Então, às vezes, pela característica estrutural do Brasil, a população negra nem sempre está em sua maioria nesses círculos. Então, infelizmente a gente tem grande parte da população negra vivendo abaixo da linha da pobreza, sem acesso à educação de qualidade e sem acesso a uma segunda língua, por exemplo. E a política ela acaba sendo bastante personalista em alguns momentos. Então essa própria barreira estrutural impede que pessoas negras cheguem a cargos do executivo’’, afirma.

Câmara dos vereadores do Recife - Foto: Beto Figueiroa/Ivan Moraes/Flickr

A estudiosa também falou dos preconceitos enfrentados por candidatos negros na disputa eleitoral. ''A gente vive numa sociedade racista que impede que as pessoas confiem 100%. Você como candidato negro precisa demonstrar às vezes o dobro, o triplo, o quádruplo da sua competência para que as pessoas validem o seu trabalho''.

Mesmo com um cenário político de bastante dificuldades, Letycia Raila enxerga alguns avanços nos direitos de candidatos negros no país. A cientista política destaca a função das cotas raciais nas eleições, que diminuem as desigualdades na representação de raça na política institucional. As eleições de 2022 foi a primeira a garantir esse direito para políticos negros.

 

 

A Educafro deve lançar, nesta segunda-feira (12), um site para monitorar a disponibilidade de candidaturas negras pelo Brasil e a quantidade de verba recebida por elas. A entidade, que foi responsável pela elaboração do texto da consulta ao TSE sobre a utilização do critério racial na divisão de recursos eleitorais, busca agora condensar informações sobre o tema de maneira acessível, para que seja possível fiscalizar a aplicação da regra.

"Vamos lançar a primeira versão (do site) no dia de Nossa Senhora Aparecida, mãe negra do Brasil", afirma o diretor executivo da associação, Frei David Santos. As informações serão publicadas em etapas, e posteriormente também será lançado um aplicativo.

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Na primeira etapa, o site organizado pela Educafro permitirá que o eleitor selecione seu município e consulte o perfil de todos os candidatos negros às eleições de 2020, encontrando informações como o cargo pleiteado, o partido, a coligação (se houver) e o número da candidatura.

Já num segundo momento, a Educafro pretende publicar gráficos com a quantidade de verba do Fundo Eleitoral destinada a candidaturas negras por legenda. As informações terão como fonte os dados oficiais do TSE.

Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os partidos deverão adotar proporcionalidade de recursos entre candidaturas negras e brancas no pleito de novembro. A medida já havia sido determinada pelo TSE, em resposta a uma consulta apresentada pela deputada Benedita da Silva (PT) e elaborada pelo advogado Irapuã Santana, da Educafro. Mas, a princípio, o critério valeria apenas a partir de 2022. Agora, decisão do STF garantiu a aplicação imediata do critério racial para a divisão de recursos.

A antecipação da regra para as eleições de 2020 foi alvo de críticas de dirigentes partidários. Somando isso ao fato de que esta será a primeira vez que o critério será colocado em prática, pesquisadores e ativistas apontam para o risco de burla da divisão proporcional dos recursos. "Os partido estão acostumados a concentrar (poder), então vamos ter todos os escândalos da concentração e do racismo estrutural vindo à tona nessas eleições", afirma Frei David.

Segundo ele, para amparar candidatos negros nos casos em que a regra eventualmente não seja cumprida, o site que será lançado pela Educafro contará também com um modelo de petição para que cada candidato possa "denunciar a má distribuição de verbas direto na justiça". Por meio de publicações e seminários virtuais, a entidade também pretende orientar candidatos e eleitores sobre a distribuição e as regras de proporcionalidade de recursos, assim como debater eventuais irregularidades cometidas por partidos.

"Nós entendemos que, se a comunidade afro-brasileira fizer um trabalho bem feito, e iremos fornecer ferramentas para isso, essa eleição, chamada por nós de 'eleição da aprendizagem e da reconquista da cidadania', será um tremendo laboratório para a comunidade negra e para o Brasil", afirma David.

Para o advogado Irapuã Santana, a possibilidade de a sociedade civil observar se os partidos estão cumprindo as decisões da Justiça também "gera um aumento de qualidade democrática muito grande". "Mais participação popular é sempre benéfico para o país", diz ele.

A Educafro tem reuniões agendadas com ministros do TSE para depois das eleições, para que façam um balanço da implementação das novas regras nas eleições de 2020.

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria em julgamento para estabelecer que o critério racial na divisão de recursos do Fundo Eleitoral - e do tempo de propaganda no rádio e na televisão de cada partido - deve valer já nas eleições de 2020, marcadas para o mês que vem.

Em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia decidido criar uma reserva de recursos para candidatos negros, mas definira que ela só valeria a partir das eleições de 2022. Mas uma liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, antecipou a adoção das novas regras para este ano. Até o momento, a decisão foi validada por seis ministros e contou com apenas um voto contrário, proferido pelo ministro Marco Aurélio Mello.

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O julgamento foi realizado no plenário virtual do STF, ferramenta digital que permite que os magistrados analisem processos sem se reunirem pessoalmente ou por videoconferência - longe dos olhos da opinião pública e das transmissões ao vivo da TV Justiça. O julgamento se encerra nesta sexta, 2.

No centro da controvérsia, estão os R$ 2 bilhões do Fundo Eleitoral reservados para o financiamento da campanha de vereadores e prefeitos de todo o País.

A lei eleitoral não obriga os partidos a lançar um número mínimo de candidatos negros, e os partidos tradicionalmente privilegiam candidatos homens e brancos na repartição do dinheiro. Segundo o estudo "Desigualdades Sociais por Cor ou Raça", do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no ano passado, enquanto 9,7% das candidaturas de pessoas brancas a deputado federal tiveram receita igual ou superior a R$ 1 milhão, entre pretos ou pardos, 2,7% receberam pelo menos esse valor.

Em seu voto, Lewandowski disse que a antecipação das regras contribui para a construção de uma "sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, livre de quaisquer formas de discriminação".

O relator foi acompanhado pelos ministros do Supremo que acumulam a função de ministros do TSE, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. Além deles, votaram a favor a ministra Cármen Lúcia e Rosa Weber.

"Não tenho dúvidas de que a sub-representação das pessoas negras nos poderes eleitos, ao mesmo tempo que é derivada do racismo estrutural existente no Brasil, acaba sendo um dos principais instrumentos de perpetuação da gravíssima desigualdade social entre brancos e negros", escreveu Alexandre de Moraes, ao fundamentar seu voto.

Em voto divergente, o ministro Marco Aurélio Mello disse que deliberações como essas devem ser feitas pelo Congresso, e não pelo Supremo. Segundo ele, a criação de ações afirmativas são "opção político-legislativa".

"O tratamento conferido à defesa dos direitos da população negra e das questões de raça deve considerar o arcabouço normativo. Ausente disciplina, não se justifica a atuação como legislador positivo, no sentido de prescrever medidas direcionadas a promover candidaturas de pessoas negras", disse. "A sociedade almeja e exige a correção de rumos, mas esta há de ocorrer ausente açodamento."

Questionamentos

Após a decisão de Lewandowski, partidos políticos alegaram que não sabem como aplicar a nova regra. Pressionado, Lewandowski divulgou na última quinta-feira as regras de como deve ser aplicada - já nas eleições deste ano - a reserva de recursos para candidatos negros.

O ministro estabeleceu que, para calcular os recursos destinados a negros, cada partido deverá primeiramente separar candidaturas masculinas e femininas, independentemente da raça - a legislação impõe uma cota de 30% para mulheres. Depois, cada legenda deverá calcular o porcentual de candidatas negras em relação ao total das candidaturas femininas do partido, bem como o porcentual de candidaturas de negros em relação ao total dos candidatos.

A divisão dos recursos deverá obedecer a proporção de homens negros no universo de candidatos, e a quantidade de mulheres negras no universo de candidaturas femininas da legenda. Cabe a cada candidato declarar sua raça à Justiça Eleitoral.

A decisão foi tomada após o ministro receber ofício de Barroso, com questionamentos dos partidos sobre a aplicação das novas regras neste ano. Em reunião por videoconferência na quarta-feira, siglas de diferentes matizes ideológicos criticaram a aplicação da regra já nestas eleições, apontaram para os riscos de candidaturas laranjas, além de acusar o Judiciário de invadir as competências do Congresso.

Embora sejam mais da metade dos habitantes do País, os negros permanecem sub-representados no Legislativo - são 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos estaduais eleitos em 2018, segundo o IBGE.

Organizados em uma coalizão, núcleos afro de seis partidos enviaram uma carta ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta sexta-feira (25), pedindo que o tribunal acolha a liminar do ministro Ricardo Lewandowski que estabeleceu que a divisão proporcional de recursos entre candidaturas negras e brancas seja aplicada já nas eleições de 2020. Os núcleos também sugerem mecanismos de combate a eventuais fraudes que possam surgir após a implementação desse instrumento.

Em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia decidido que a reserva de recursos para candidatos negros só valeria a partir das eleições de 2022, mas a decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, antecipou a adoção das novas regras para este ano. A decisão do ministro passou a ser discutida no plenário virtual do STF nesta sexta, e três integrantes da Corte já votaram a favor de antecipar a medida para as eleições de novembro.

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"Saudamos o entendimento proposto pelo Excelentíssimo Sr. Ministro Ricardo Lewandowski por meio da ADPF 738, que define proporcionalidade de recursos nas eleições de 2020. Por meio deste (documento), pedimos que a mesma seja acolhida por seus pares", afirmam os núcleos afro no documento enviado aos ministros nesta sexta.

O texto também aponta algumas preocupações. Uma delas é a de que, enquanto não houver um mínimo de candidaturas negras a serem lançadas por cada partido, a obrigatoriedade de dividir recursos de maneira proporcional às candidaturas brancas e negras acabe por levar as legendas a optarem por não lançar negros no pleito.

"Entendemos que a proporcionalidade de recursos pode ser fator impeditivo na constituição de nominatas justas, sabendo da política como ela é, entendemos que alguns partidos podem vetar candidaturas negras em função da divisão do recurso", diz o documento, que segue: "propomos, portanto, um percentual mínimo de candidaturas negras em cada partido, essas a serem definidas por óbvio em suas nominatas." A carta ainda pede que as fundações partidárias atuem para formar politicamente esses candidatos.

Para evitar fraudes, os núcleos sugerem a checagem da declaração de candidatos que já tenham se lançado em eleições anteriores. O TSE passou a registrar, a partir de 2014, a declaração de cor de todos aqueles que se registram como candidatos.

"Pensamos que outro meio de coibir atos fraudulentos é a checagem da declaração de campanhas anteriores daqueles que já disputaram cargos eletivos, tendo estes que manter a declaração das campanhas passadas", diz o documento enviado pelos núcleos afro aos ministros da Corte.

Para evitar falsas declarações de cor, o texto cita ainda mecanismos adotados em algumas universidades e concursos públicos, e propõe a instalação de comissões de heteroidentificação para avaliar o fenótipo dos candidatos. Ou seja, essa verificação levaria em conta as características físicas do indivíduo, e não sua ascendência.

"Confiantes e ladeados pelo órgão máximo da justiça brasileira, bem como do Tribunal Superior Eleitoral, estaremos atentos às fraudes. Não deixaremos que usem nossa pauta, nossas vidas e nossas lutas com a finalidade de burlar ou se aproveitar do novo instrumento jurídico em tela", dizem os núcleos.

"Queremos, portanto, junto com as aludidas cortes, partidos políticos, Congresso Nacional e sociedade, discutir melhorias na forma de executar este avanço para a democracia, para a representatividade do povo brasileiro e por óbvio ululante para a sociedade brasileira", finaliza o texto, que é assinado pelos movimentos negros e setoriais dos partidos Cidadania, PSDB, PDT, PSB, DEM e MDB.

Em reunião por videoconferência com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, partidos de diferentes matizes ideológicos criticaram a aplicação já nestas eleições de uma reserva de recursos para candidatos negros. A antecipação da medida foi determinada em uma decisão individual do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que será examinada em julgamento marcado para começar no dia 25 no plenário virtual da Corte.

Durante a reunião de duas horas e meia com Barroso, dirigentes partidários apontaram para os riscos de candidaturas "laranjas" nestas eleições, acusaram o Poder Judiciário de invadir as competências do Congresso de legislar sobre o tema e cobraram uma regulamentação para esclarecer como a nova regra deve ser aplicada em cada sigla.

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A decisão de Lewandowski obrigou os partidos a dividir - já nestas eleições - de forma proporcional, entre candidatos negros e brancos, o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de rádio e TV na propaganda gratuita da campanha deste ano. A tendência é que o STF mantenha a decisão, mas, até agora, os partidos não sabem como aplicar a nova regra.

Em agosto, o TSE havia decidido que a reserva de recursos para candidatos negros só valeria a partir das eleições de 2022, mas uma liminar de Lewandowski antecipou a adoção das novas regras para a campanha municipal deste ano. Na prática, a lei eleitoral não obriga os partidos a lançar número mínimo de candidatos negros. A medida determinada por Lewandowski, em caráter liminar, determina a repartição dos recursos e do tempo da propaganda de forma proporcional entre concorrentes brancos e negros de cada partido.

"O que nos angustia a todos é o tema da cota racial. Estamos no chão de fábrica, ali perto da realidade onde as coisas acontecem, nos angustia a todos, não queremos deixar de cumprir uma decisão judicial, mas nos aflige se o Supremo, no tempo mais rápido possível, não nos der essa baliza de como vai funcionar nesta eleição", disse o presidente do Republicanos, o deputado Marcos Pereira (SP).

"O ideal seria manter a decisão como foi feita pelo TSE, para a eleição de 2022, aí teríamos tempo para organizar isso. Não sendo possível, que quanto antes o TSE nos dê uma baliza de como deveremos fazer, para que não cometamos erros e sermos até mesmo acusados pela imprensa de forma injusta de termos criados candidaturas 'laranjas'", clamou Pereira.

O presidente do Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI), foi na mesma linha. "Como colocar isso em prática? Porque existe uma transferência de recursos que temos de fazer aos Estados, em que se isso não for executado pelos Estados, isso vai acabar acarretando uma punição ao diretório nacional no partido no futuro. E nós não queremos de forma nenhuma deixar de descumprir a determinação do TSE, mas temos preocupação de como colocar isso em prática (em todo o Brasil)", afirmou.

"É uma situação tão em cima das eleições, uma situação dramática de como colocarmos isso em prática. Segundo o TSE, é uma decisão que é autoaplicável. Mas o certo seria, na nossa opinião, é de que precisa de regulamentação do TSE quanto a isso", enfatizou o senador.

O plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar no dia 25 a decisão do ministro Ricardo Lewandowski que obrigou os partidos a dividir de forma proporcional, entre candidatos negros e brancos, o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de rádio e TV na propaganda gratuita da campanha deste ano. A tendência é que o STF mantenha a decisão, mas, até agora, os partidos não sabem como aplicar a nova regra.

O julgamento começará na véspera do prazo final para o registro das candidaturas, que termina dia 26, e tem até uma semana para ser concluído. O cronograma apertado é alvo de queixas por parte de dirigentes dos partidos. O plenário virtual permite que os ministros analisem casos sem reuniões presenciais ou por videoconferência, longe dos olhos da opinião pública.

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Antes de Lewandowski antecipar a vigência da nova determinação, 23 de um total de 33 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já haviam informado à Corte quais seriam os critérios adotados para a partilha do Fundo Eleitoral nestas eleições.

Agora, na lista de dúvidas das legendas está a definição de procedimentos internos para a autodeclaração dos candidatos sobre a raça, já que cabe a cada concorrente informar à Justiça Eleitoral qual é a sua raça no momento em que registra a candidatura. Os partidos não sabem, por exemplo, se eventuais irregularidades nesse quesito podem levar à cassação de candidaturas. Um dos temores do TSE é de que partidos decidam não aceitar candidaturas de negros.

Na prática, a lei eleitoral não obriga os partidos a lançar número mínimo de candidatos negros. A medida assinada por Lewandowski, em caráter liminar, determina apenas a repartição dos recursos e do tempo da propaganda de forma proporcional entre concorrentes brancos e negros. "Acho que o partido que adotar uma prática discriminatória vai ter o ônus político de ser um partido racista. É sempre muito difícil quebrar o status quo, mas eu também não imaginaria não dar um direito que nós consideramos legítimo pelo temor de que os outros vão tentar tirar esse direito", disse o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso.

Em agosto, o TSE havia decidido que a reserva de recursos para candidatos negros só valeria a partir das eleições de 2022, mas a liminar de Lewandowski antecipou a adoção das novas regras para a campanha municipal deste ano. As eleições para prefeito e vereador estão marcadas para novembro. Até agora, do total de R$ 2 bilhões do fundo eleitoral, R$ 688,8 milhões já foram distribuídos para uma lista de 12 partidos (36,3% do total): PSDB, PL, PMB, Solidariedade, PSC, Patriota, PTB, PSD, PTC, Pros, Cidadania e PV. Novo e PRTB abriram mão de receber o fundo para financiar as campanhas.

O objetivo da decisão do TSE, que teve os efeitos antecipados por Lewandowski, é corrigir distorções e evitar que os partidos continuem privilegiando homens e brancos na distribuição de verbas, além de barrar a discriminação de candidatos negros. Para dirigentes, no entanto, Lewandowski mudou as regras com os preparativos eleitorais já em andamento e, com isso, há o risco de políticos negros sofrerem discriminação.

Orientação

"Antes de qualquer decisão, já havíamos iniciado um processo de valorização das candidaturas de negros. Me reuni com o MDB Afro, que ficou de indicar todos os candidatos negros do partido no País. Esperamos orientações da Justiça Eleitoral sobre as eleições de 2020", disse o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP). Para o advogado Irapuã Santana, a Corte tem a chance de extinguir uma "injustiça". "Confio que o plenário irá referendar a decisão do ministro Lewandowski." 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) formou, nessa terça-feira (25), maioria para que o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de propaganda no rádio e TV sejam divididos na mesma proporção de candidatos negros e brancos de cada partido. Uma das questões ainda em aberto é se a decisão do tribunal já será aplicada nestas eleições, se fica para 2022, ou se a Corte vai optar por uma espécie de "regra de transição".

Esse esclarecimento só deve ser feito ao final do julgamento - até a conclusão desta edição ainda faltava votar o ministro Sérgio Banhos. "Não deixa de ser uma frustração postergarmos (para 2022) uma situação que a maioria formada considera injusta", afirmou o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso.

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A discussão foi retomada ontem com o voto dos ministros Og Fernandes e Luís Felipe Salomão, que concordam com a medida. Os dois ministros, no entanto, querem que o entendimento só seja aplicado a partir das eleições de 2022. "A distribuição igualitária dos recursos de campanha e do tempo de propaganda, na exata proporção de candidaturas lançadas, representa decisivo passo para concretizar a garantia constitucional da isonomia em seu aspecto material, de forma a amainar a histórica desigualdade de condições entre negros e brancos vivenciada em nosso País", afirmou Salomão.

Em seu voto, o ministro destacou que 11 partidos já informaram ao TSE os critérios de divisão dos recursos do fundo eleitoral. "No meu modo de ver, a alteração dos critérios no atual estágio tem o potencial de produzir ruídos indesejáveis na distribuição desses valores, causando insegurança jurídica. É preciso de um período de respiro, é um elemento-surpresa para a vida partidária", observou Salomão.

A discussão, iniciada em junho, avalia uma consulta apresentada ao TSE pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ). A parlamentar pediu ao tribunal para estabelecer uma cota de 30% de candidaturas negras em cada partido - numa analogia ao mesmo porcentual reservado às candidaturas femininas. Atualmente, os partidos não são obrigados a lançar um número mínimo de candidatos negros e negras.

A medida foi rejeitada por Barroso, relator do caso, para quem uma iniciativa nesse sentido, com a criação de uma cota de candidatos negros, depende de legislação aprovada pelo Congresso. Barroso, no entanto, acolheu outro pedido da parlamentar, de que o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de rádio e TV sejam divididos na mesma proporção de candidatos negros e brancos em cada sigla.

O único a votar em sentido diferente foi o ministro Tarcísio Vieira, para quem uma iniciativa nesse sentido depende de aprovação de uma lei pelo Congresso. "O tema já está em debate na seara legislativa própria", afirmou Tarcísio. A discussão do TSE para obrigar os partidos a usar o critério racial para divisão de recursos gerou descontentamento e reação no mundo político. Dirigentes de partidos dizem que o Congresso Nacional deve se pronunciar sobre a questão.

Sem financiamento ou apoio partidário, iniciativas de candidatos negros ficam pelo caminho. A enfermeira Rita Manuela se lançou ao cargo de deputado federal pelo Patriota em 2018, mas, embora a sigla tenha dado aval para que seu nome fosse às urnas, a candidatura não foi contemplada na divisão do fundo eleitoral. "Entrei zerada e saí zerada." Do partido, ela recebeu apenas os serviços de assessoria e consultoria contábil, estimados em R$ 400.

Para Rita, o Patriota a colocou na disputa apenas para cumprir o número mínimo de mulheres, mas que, caso ela fosse uma candidata branca, a situação poderia ter sido diferente. "Mulheres negras recebem menos, têm menos participação e menor avaliação de viabilidade (eleitoral)", afirmou ela, que desistiu da eleição. Procurado, o Patriota não se manifestou até a conclusão desta edição.

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A situação de Rita se repete em outros partidos. Candidato a deputado estadual no Rio pelo PDT em 2018, o cientista social Vitor Del Rey disse que desistiu da campanha "antes mesmo de começar" porque não recebeu apoio do seu partido. "Não tínhamos dinheiro para financiar, cheguei num momento em que eu tinha mais dívidas que dinheiro para arrecadar", relatou. Segundo o TSE, ele não recebeu recursos do partido para fazer campanha. "O fato de eu ser negro, somado ao de não ter padrinhos e histórico político, contribuiu para a falta de verba vinda do partido."

O PDT afirmou que a gestão da verba partidária é "uma deliberação interna do diretório regional, priorizando candidatos a presidente, governadores, senadores e deputados federais". Segundo a sigla, os critérios para a distribuição de verba "vão de tempo de filiação a efetiva participação na organização do partido". 

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